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Salvador realiza primeira mamoplastia masculinizadora pelo SUS/BA e marca avanço na saúde de pessoas trans

Monique Sousa,
30/04/2025 | 20h04
Rafiki Maia (Foto: Arquivo pessoal)


Em um marco para a saúde pública e para a cidadania da população trans, o Sistema Único de Saúde da Bahia (SUS/BA) realizou a primeira cirurgia de mamoplastia masculinizadora por via administrativa, sem necessidade de judicialização. O procedimento foi realizado em parceria técnica com o Hospital Universitário Professor Edgard Santos (HUPES), em Salvador, dentro do processo transexualizador garantido pela portaria 2803/2013 do Ministério da Saúde.
A cirurgia foi realizada no paciente Rafiki Maia, de 49 anos, no dia 05/04/2025, que celebrou o momento como a realização de um sonho e um marco de dignidade.
“Eu não consigo nem mensurar quando eu tive a notícia, porque foi um misto de sentimentos. Fiquei completamente emocionado, porque pra mim essa realidade era um pouco distante. Plano de saúde muito caro, e pelo SUS eu achava que ia demorar muito, talvez nem acontecesse. Se felicidade plena conseguir resumir o que eu senti, vamos dizer que é isso, mas foi um misto de emoções, pra dizer a verdade, afirma Maia.”
Segundo o Dr. Ailton Santos, Coordenador do Ambulatório Multidisciplinar em Saúde de Travestis e Transexuais da Secretaria da Saúde da Bahia (SESAB), a realização dessa cirurgia marca um avanço significativo na efetivação dos direitos das pessoas trans.
“É um momento histórico para a Bahia e para o SUS, porque demonstra que o direito à saúde integral da população trans está sendo garantido de forma administrativa, sem a necessidade de processos judiciais que muitas vezes atrasam o acesso aos procedimentos”, afirma Santos.

(Foto: Divulgação)


Desde agosto de 2023, o SUS/BA, em parceria com o HUPES, ampliou a oferta de cirurgias de afirmação de gênero. Atualmente, são disponibilizados procedimentos como feminização facial, feminização vocal, histerectomia, mamoplastia masculinizadora, implante de prótese de silicone e redesignação sexual masculina e feminina. Todas essas ações são coordenadas com o apoio do Ambulatório Trans CEDAP, que também atua em articulação com o Ambulatório Municipal Especializado LGBT de Salvador.
O Ambulatório Trans CEDAP realiza não apenas a triagem e acompanhamento dos pacientes, mas também os encaminhamentos para acompanhamento psicológico e transporte (Tratamento Fora de Domicílio – TFD) para aqueles que vivem no interior da Bahia, garantindo a ampliação do acesso.
Apesar dos avanços, Dr. Ailton Santos aponta que ainda existem desafios importantes a serem superados para a plena efetivação da política de saúde trans no estado.
“Ainda enfrentamos limitações na oferta de consultas psicológicas necessárias para o acompanhamento obrigatório de dois anos, dificuldades na dispensação regular de hormônios e bloqueadores hormonais, além do acesso a exames clínicos, principalmente de imagem, essenciais para a avaliação e liberação dos procedimentos cirúrgicos”, explicou o Dr.
O coordenador também destacou a necessidade urgente de garantir a continuidade da oferta de consultas, exames e hormonioterapia, bem como de investir na formação permanente de profissionais de saúde para o atendimento humanizado e qualificado das pessoas trans.
“Avançamos muito com a realização da primeira cirurgia por via administrativa, mas é fundamental que o SUS priorize a estruturação contínua dos ambulatórios trans, garantindo acesso ininterrupto e respeitoso a todos os serviços. Só assim conseguiremos assegurar o direito à saúde integral para a população trans, com dignidade e cidadania”, concluiu Santos.
Rafiki ainda compartilhou uma experiência anterior no sistema de saúde que foi decisiva para sua conscientização sobre direitos:
“Quando eu não tinha feito a mudança de documentos, eu não sabia que tinha o direito de ser chamado pelo nome social. Uma vez, internado, uma enfermeira percebeu meu constrangimento e perguntou como eu queria ser chamado. Depois disso, ela deu a ordem para toda a equipe médica me chamar pelo nome social. Aquilo fez uma diferença enorme na minha vida e me fez buscar mais informações sobre meus direitos. Com certeza, essa cirurgia é mais uma grande vitória”, conclui Maia.
Com a realização da primeira cirurgia de mamoplastia masculinizadora por via administrativa, a Bahia consolida sua posição de protagonismo nacional na defesa da saúde integral da população trans. O estado demonstra, na prática, o compromisso com a garantia de direitos fundamentais, a promoção da equidade no acesso à saúde e o respeito às identidades de gênero.
Essa conquista não apenas representa um avanço nos serviços oferecidos pelo SUS, mas também reforça o esforço contínuo para a construção de uma sociedade mais justa, inclusiva e atenta às demandas históricas da população LGBTQIAPN+. A iniciativa baiana se consolida como referência para outras regiões do país na implementação de políticas públicas baseadas na dignidade, no cuidado e na cidadania.