Sala VIP

Um homem negro e gay confortável em sua própria pele

Leticia Chaves,
28/06/2021 | 15h06
Foto: Silvia Alcântara

Celebrado no dia 28 de junho, o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+ é um importante marco para a população, que no Brasil, é uma das mais violentadas por serem o que são, e se assumirem fora de um padrão heteronormativo. Leonardo Alan, é um multiartista brasileiro, que reside atualmente na Bélgica e conta ao Dois Terços como se de seu processo de adaptação ao país, os benefícios e desafios de se viver da arte fora do Brasil, além de todas as questões em torno de sua sexualidade e liberdade de ser quem se é. 

Confira a entrevista completa:

Dois Terços:  Você mora atualmente na Bélgica, que é considerado um dos melhores países para pessoas LGBTQIA+ em termos de leis e proteção do estado, mas você também carrega na pele os desafios que existem em todos os lugares por ser um homem negro num planeta que ainda colhe frutos da escravidão. Como é ser um artista preto e gay fora do Brasil? 

Leonardo Alan: Existe uma tolerância maior se você segue padrões do gay viril/machão/não-afeminado. Meu dever como artista é quebrar, claro, essas barreiras dos estereótipos, então exploro diversas possibilidades e faço o que me der na telha. Com isso, já levei até chuva de tomate no palco durante uma apresentação. Estava de maquiagem, salto alto e rebolando a bunda. Não estou sempre de maquiagem, salto alto e rebolando a bunda, na realidade, sou introvertido e desajeitado. Mas, me alimento da importância de incomodar a sociedade com questões que são necessárias de abordar, e acho interessante a dinâmica que se instala nas apresentações quando vejo os olhares das pessoas vendo um homem negro confortável na sua própria pele. 

DT: Quais são os benefícios e os maiores desafios de morar na Bélgica? De que forma o país ajudou na sua inspiração e no aprimoramento da sua arte? 

LA: O maior benefício é o tempo, já que consigo aproveitar mais cada momento porque tenho mais possibilidades de refletir sobre processos pessoais. Evoluí como pessoa e como artista com a imigração. Consigo analisar e entender mais a cultura brasileira estando fora dela. É um processo bem interessante. 

DT: As consequências econômicas da crise de Covid-19 afetaram a cultura de forma mais severa do que se esperava. Como você conseguiu se manter financeiramente neste contexto? 

LA: Acho interessante essa pergunta para quebrar este imaginário de que a vida é fácil quando se mora fora do país. Durante o COVID acabei perdendo o meu emprego. E com isso, fiquei três meses sem pagar o aluguel e sobrevivi com 16 euros na conta por um mês. Comendo bastante batata doce com cenoura no forno por dias. Não é um mar de rosas morar fora, mas a sensação de sobrevivência, independência e de auto-suficiência é algo muito libertador e enriquecedor. 

Hoje me estabilizei através de um auxílio que o governo fornece, e com essa ajuda social programo uma graduação em Cinema que me agrega nas produções artísticas que tenho programado.

DT: Pensando no Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+, qual a importância desse dia para você como parte desta comunidade, que ainda luta por direitos e contra a discriminação?

LA: Esse dia é de extrema importância para não esquecermos do orgulho de vestir a camisa da diversidade. Independente da orientação sexual, entender que diversidade existe, não é algo criado em laboratório, que se aprende na TV e principalmente que não se resolve com reza brava. 

O medo do desconhecido, a ignorância e intolerância parecem estar cada vez mais próximos. Mas, um dia como o de hoje vem para lembrar que aquele seu vizinho diferente, aquele artista afeminado, aquele trans e toda aquela sigla LGBTQIA+, que parece ser complicada pra quem não entende, significam pessoas buscando e lutando por respeito, direitos e igualdade e representatividade. 

DT: Que recado, neste dia 28 de junho, você mandaria para um jovem artista negro LGBTQIA+ que está no começo da sua trajetória profissional?

LA: Bote a cara no sol, e lembre-se que no final do arco-íris tem um pote de ouro.

*Letícia Chaves é estudante de Jornalismo pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Apaixonada por comunicação, desde que iniciou os estudos na área buscou se aperfeiçoar em produções textuais e edição de vídeos. Atualmente trabalha como Assessora de Imprensa e produz conteúdos em texto com viés institucional e jornalístico.”