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Time amador abre portas do futsal para homens trans

Genilson Coutinho,
17/05/2022 | 00h05
T Mosqueteiros é um time de futsal para homens trans — Foto: Marcos Guerra

A bola no pé é um manifesto pelo direito de ser no T Mosqueteiros. O time amador de São Paulo é um refúgio no futsal exclusivo para homens trans – pessoas designadas como mulheres no nascimento, mas que se identificam com o gênero masculino. Um espaço em que se sentem acolhidos no esporte e longe de qualquer tipo de preconceito.

– Acho que não só o T Mosqueteiros como todos os times trans masculinos hoje, eles resistem, eles mostram a nossa realidade, os nossos corpos, as nossas diferenças, as nossas dificuldades, mas também a gente mostra que é possível – disse Tatto Oliveira, um dos fundadores do T Mosqueteiros.

– A gente se sente à vontade aqui. A gente não julga o outro. A gente aceita o outro do jeito que é. A gente tem as mesmas dificuldades – completou Matheus Oliver, técnico e capitão do T Mosqueteiros.

Histórias que se encontram e caminham juntas. Os domingos costumam ser assim desde 2019, quando o time deu seus primeiros passos. Eles se reúnem em uma quadra em uma sobreloja no centro de São Paulo, um local privado em que se sentem seguros, onde a violência não tem vez.

– Às vezes me sentia muito excluído, rejeitado, essas coisas que acontecem na vida. Aí a gente tem que procurar os nossos espaços, né!? Nossa galera – disse Nohan Ferreira dos Santos, mais jovem jogador do T. Mosqueteiros, com 18 anos.

– Falando de mim, no início foi bem difícil para mim me assumir como homem trans, demorei uns dois, três anos. E depois para me assumir para minha família… – disse Matheus.

Nohan e Matheus fazem parte de um grupo de 42 homens trans de diferentes idades e profissões e contextos sociais, que nutriam o mesmo sentimento do Tatto.

– Eu jogava na infância, mas pelo preconceito, pela dificuldade de você se aceitar, se entender, eu fui aos poucos evadindo do esporte – contou Tatto.

Anos depois ele teve um reencontro com a bola e montou o T Mosqueteiros, um time de futsal, um espaço onde cada um deles poderia se sentir à vontade para jogar futebol e se divertir.

– Isso aqui é transformador. Às vezes eu estou em um dia mal, aí chego aqui, a gente se encontra, conversa, joga, não é mesmo!? Mudou muito minha vida, minha rotina – contou Nohan.

– Bem lá atrás, os homens trans não eram vistos como homens. Os profissionais foram se atualizando e entendendo que ser uma pessoa trans não é uma doença. Saiu o CID de doença (Classificação Internacional de Doença). Os profissionais foram se aprimorando em questão de cirurgia, em questão do psicológico, em questão de hormônio… Então hoje no time a gente passa isso para os meninos mais novos. Não é só um time e vou lá jogar. A gente vai apoiando essas pessoas – conta Matheus.

É uma mistura de time e família, onde eles podem conversar abertamente, sem medo de discriminação, sempre aberto à participação de novos membros. Mesmo aqueles que ainda dão os primeiros toques na bola encontram espaço. O T Mosqueteiros é sobre união e aprendizado, mas também é sobre vitórias. O time que toda semana se reúne em uma quadra do centro de São Paulo já começa a ganhar títulos. No ano passado, eles venceram a primeira edição dos Jogos LGBTQIAP+, promovidos pela Prefeitura de São Paulo.

– Eu estava com a certeza de que a gente iria ganhar. Como estava o movimento do time, a união, os meninos querendo… Primeiro campeonato, a gente vai enfrentar um time que é visto como melhor. Ele entrou com dois times, a gente só tinha um. A gente bateu os dois times. A final foi 3 a 0. Eles não fizeram nenhum gol na gente. E foi muito emocionante – contou Matheus.

Uma emoção que só o esporte traz e que ninguém deveria ser privado de sentir.

– É uma peça fundamental a gente estar aqui, resistir todos os domingos, de a gente cuidar um do outro e mostrar que a gente não precisa perder ninguém para o suicídio, a gente não precisa perder ninguém para as agressões, a gente não precisa perder ninguém para a violência que hoje, infelizmente, as pessoas trans vivem. Mas também para mostrar essa alegria que a galera traz aqui todo domingo. Eu acredito que é uma sementinha. Eu espero que daqui a alguns anos isso seja muito maior – disse Tatto.

Do GE