Sala VIP

“Se me escondo, como muitos artistas fazem, eu não estou promovendo a diversidade”, diz Bernardo Langlott sobre bissexualidade

Carlos Leal,
19/10/2023 | 22h10
Fotos: Vinicius Vieira – Divulgação

“Vivemos  uma luta diária contra o preconceito. Toda vez que um casal LGBTQIAPN+ deixa de andar e mãos dadas ou dar um selinho em seu parceiro ou parceira em público, deixa de contribuir positivamente para a causa”, diz Bernardo Langlott.

Psicólogo, ator, apresentador, empresário e modelo, Bernardo Langlott é um artista que tem conquistado mais espaço na mídia a cada dia, especialmente a partir do momento que se declarou gay. Aos 40 anos, esse carioca de 1,90m não se prende a rótulos nem tampouco tem medo de dizer o que pensa ou de assumir seus relacionamentos. Muitos ainda insistem em rotulá-lo como o ex-de Glória Maria, o que não o incomoda, mas ele conta que começou a trabalhar como ator aos 15 anos e de lá para cá, tem feito trabalhos diversos e não são rótulos que irão apagar sua história. Recentemente capa da Dyo Magazine, onde fez um ensaio sexy, o artista aumentou sua visibilidade e passou a receber propostas até para fazer programa. Nesse bate papo com o Dois Terços, Langlott fala um pouco de sua trajetória e os impactos que foi ter assumido ser gay. Confiram.

DOIS TERÇOS: Bernardo, você é uma pessoa que não tem medo de se expor, fazer e dizer o que pensa principalmente das redes sociais onde em uma delas você tem mais de cem mil seguidores. Nesse sentido, como consegue conviver com ao haters e homofóbicos?

BERNARDO LANGLOTT: Carlos, isso é muito relativo. Às vezes leio comentários que me causam impacto, depende muito de como estou naquele dia. As redes sociais são muito importantes para o artista  mas,  em contrapartida, as pessoas estão atrás de uma tela e acham que podem falar o que querem. Isso é muito perigoso e afeta a saúde mental de muita gente. Não nos damos conta, mas pessoas adoecem, entram em depressão e até morrem por causa disso. Então, Carlos, hoje em dia já não respondo a esse tipo de comentários em redes sociais. O que eu faço? Se acho que o comentário me ofende, bloqueio a pessoa imediatamente.

DT: É a questão de querer opinar sobre o que acontece com a vida alheia…

BL: Pois é, cada um que cuide de sua vida e se aquela pessoa vai de encontro ao seu pensamento, porque segui-la? Só para ter o prazer de ofender destilando ódio? Importante lembrar que na maioria das vezes, comentários de haters não são opiniões, são ataques, são pílulas de ódio, logo, totalmente inválidos.

Fotos: Vinicius Vieira – Divulgação

DT: Bernardo, apesar de você já ter uma trajetória que começou aos 15 anos como modelo, as pessoas ainda ligam sua imagem ao namoro com a jornalista Glória Maria, que já tem um bom tempo. Já li comentários, inclusive, muito ruins a esse respeito. Essa história, você acredita que mais te atrapalha ou ajuda na questão de engajamento, de ser conhecido ou de estar na mídia?

BL: Essa questão não me incomoda, foi a própria mídia quem criou esse rótulo, tem jornalista que vive disso. Creio que comecei a aparecer mais, ter mais espaço na mídia quando me assumi gay, isso virou notícia nacional. Foi quando assumi minha realidade. Aí já mudou: passei ser “o ex da Glória Maria que se assumiu gay”. Eu não tive esse intuito, mas o fato me tornou uma pessoa polêmica. O que eu queria era somente resolver essa questão comigo mesmo… vejo que isso tem mudado, o público hoje procura saber mais o que o Bernardo Langlott está fazendo: uma capa de revista, um comercial, uma entrevista. Óbvio, esse assunto ainda é recorrente, mas não me incomoda.

DT: Mas existe a acusação de você ter usado o nome da jornalista para se promover.

BL: Isso sim, me incomoda pois não é uma realidade. Importante lembrar que eu não tenho o poder de escrever o que vai sair na mídia,  de pautar as matérias para a TV e nem como a mídia vai me classificar. Quando leio uma matéria sobre mim e vejo que o nome dela não foi explorado, pois, você como jornalista, sabe que isso é uma jogada para dar audiência, eu já fico aliviado, mas sei que faz parte. Se puxarmos pela memória, Adriane Galisteu passou por isso, quando foi “a ex de Airton Senna” a Xuxa, quando foi “a ex do Pelé”, a Luciana Gimenez quando se relacionou com o Mick Jagger… Jesus Luz passa por isso até hoje por ter se relacionado com a Madonna, né? Eu não serei o primeiro e nem o último, mas as coisas estão mudando.

DT: Recentemente você fez um ensaio sensual para a revista  Dyo Magazine, que repercutiu muito. Seu objetivo foi exatamente esse, de aparecer e ter notoriedade?

BL: Obvio que nós artistas precisamos de mídia, mas meu intuito não foi simplesmente aparecer e ter notoriedade. Olha, Carlos, eu encarei como mais um trabalho, não foi a primeira capa que eu fiz, anteriormente fiz a capa da Mais Junior além de muitos trabalhos fotográficos como modelo. Fazer essa capa foi um presente,  me deixou lisonjeado pois eles só publicam   fotos de homens bonitos, sexys e gostosos. Obvio que deu muita repercussão na mídia e te garanto: tudo é fruto de muito trabalho. Eu trabalho muito, inclusive, tenho minha empresa que faz minha própria assessoria de imprensa, faço minha própria gestão de carreira…  nada é por acaso, o que o público vê é fruto de muita dedicação.

DT: A bissexualidade ainda é um tabu para muita gente e você assumiu isso publicamente em algumas entrevistas. Qual foi a reação do seu público com relação a esse tema?

BL: Com relação a bissexualidade, eu já tinha me relacionado com a Glória, como já falamos anteriormente, também com outras mulheres  famosas, a exemplo da Quitéria Chagas, me relacionei com homens famosos, uns tornaram-se públicos, outros que foram mais reservados…depois fiquei com a Vivi Fernandes. Sou um artista contra a hipocrisia e o preconceito. Acredito que eu, enquanto figura pública, posso ajudar a construir um mundo melhor. Se me escondo, como muitos artistas fazem, eu não estou promovendo a diversidade. Nosso papel é promover a luta contra a homofobia, contra o preconceito, seja ele qual for.

DT: E com relação à bissexualidade?

BL: Com relação a esse tema a partir do momento que eu digo abertamente que eu fico com mulher, que eu fico com homem ou mulher trans, isso serve de exemplo para outras pessoas. Elas passam a ver essa questão como uma coisa normal. E é normal.  A  partir daí, vamos construindo um mundo melhor, mais justo, com menos ódio, com menos preconceito onde as pessoas possam ser quem elas são sem medo. Se você for pesquisar minha trajetória, eu não falo da vida íntima de ninguém, apenas promovo meu trabalho.

DT: Mas, para além dos haters, recentemente um famoso apresentador de TV também te atacou publicamente, não vamos citar o nome para não dar ibope. Nesse caso, ele questionava seu suposto namorado dizendo “Onde é que você está com a cabeça?”. Isso te magoou? Você chegou a falar com esse apresentador?

Fotos: Vinicius Vieira – Divulgação

BL: Foi em um podcast com  o Erick Ricarte, que é uma pessoa que eu gosto muito. Esse apresentador o entrevistou e mesmo também sendo homossexual foi extremamente preconceituoso comigo me criticando de uma maneira muito desnecessária e infeliz. Ele colocou o Erick numa sai justa, foi uma situação muito chata. Quando eu assisti ao vídeo, realmente não acreditei, demorei para digerir aquilo. Mas, Carlos, ninguém ataca alguém que é irrelevante então pode crer que encarei até como algo positivo para mim.

DT: Você também ganhou os holofotes ao ser flagrado com outras celebridades, como a atriz Vivi Fernandez, a influencer trans Suellen  Carey e com um apresentador casado, dentre tantos romances, virando alvo dos paparazzi. Isso te incomoda ou incomodou?

BL: Pois é, os próprios paparazzi me alçaram ao nível de celebridade. Entendo que grande parte do meu glamour e tudo que envolve meu nome, devo a eles. Todas as pessoas já citadas aqui, são pessoas com quem mantenho contato, são amigos. Eu amo agregar.

DT: Agora você tem seu escritório de Assessoria de Imprensa, tem feito trabalhos com outros artistas. Acha que chegou a hora de ficar mais quieto, no seu canto ou tudo será levado paralelamente?

BL: Isso, temos a Agência Bernardo Langlott, que é um escritório de Assessoria e Imprensa só que com um diferencial: eu não vendo pacotes de assessorias, eu faço parcerias, todas envolvendo o meu nome. Daí faço parcerias com outras assessorias, editorias, empresários, veículos de comunicação, enfim, faço minha própria assessoria, mas de uma forma diferente.

DT: Em 2022 você e seu então namorado Betoh Cascardo   foram atacados nas redes sociais e sofreram inclusive ameaça de morte. Naquele momento, você ficou amedrontado?

BL: Olha Carlos, é terrível, a gente fica com medo. E tem outro detalhe agravante: sua família, que muitas vezes não é do meio, fica preocupada e  também com medo. Eu não mudei muito minha rotina, pois já levo uma vida muito segura, ando com cuidado. Vivemos, infelizmente, nesse mundo cruel, homofóbico, transfóbico … é um mundo onde diariamente são assassinados membros da comunidade LGBTQIAPN+. Vivemos uma luta diária de todos nós contra o preconceito. Toda vez que um casal LGBTQIAPN+ deixa de andar de mãos dadas, ele deixa de contribuir com a causa. Registramos Boletim de Ocorrência, na época, e seguimos em frente.

Fotos: Vinicius Vieira – Divulgação

DT: Constantemente saem notícias que você iria para algum reality show. São apenas fofocas ou você já chegou a ser convidado? Existe ainda essa possibilidade de vermos Bernardo ali na TV disputando um grande prêmio?

BL: Verdade, tenho participado de seletivas de realities para TV aberta e também em canais fechados,  mas as negociações não evoluíram. De dois anos para cá, sempre que tem um reality para acontecer, pipocam notícias de que eu estaria escalado. Até me sinto lisonjeado, pois vejo que o público e a própria mídia tem esse desejo. Ainda não aconteceu, mas creio que em algum momento isso vai rolar. Minha vontade é real, acho que apenas não ainda não chegou o momento.

DT: E nos directs das suas redes sociais, após seu ensaio para a Dyo Magazine, qual a reação dos seus seguidores?

BL: Pois é, após o ensaio da Dyo eu recebi muitas propostas indecentes e de pessoas também querendo saber se eu tinha Onlyfans, que queriam me contratar como garoto de programa, essas coisas… óbvio que gostamos de receber elogios. O que me incomoda é quando as pessoas acham que sou garoto de programa simplesmente por ter feito  a capa de uma revista com fotos sensuais. Mas também entendo que isso está no imaginário do ser humano, o julgamento, o preconceito. Aviso logo que não tenho Onlyfans, o que nem considero trabalho artístico. Não julgo quem faz, mas ali, de artístico não tem nada e eu sou um artista. Também não tenho nada contra quem trabalha como garoto de programa. Recebo também propostas para venda de conteúdo adulto, mas digo a você: não estou a venda. Para isso, tem vários profissionais no mercado.

DT: Quais são seus projetos a partir de agora e para 2024? Algo que possa nos contar?

BL: Tenho, mas procuro não falar para não estragar. O que posso dizer é que vou continuar sobre os holofotes pois trabalho de maneira continua e com responsabilidade. Creio que o segredo do sucesso é a evolução, a continuidade e a periodicidade. E eu faço um trabalho de formiguinha, faço um pouco a cada dia. Me aguardem que chegarei a lugares onde ainda não consegui chegar.

DT: O Brasil é um dos países que mais mata LGBTQIAPN+ no mundo, isso é grave. Você tem essa preocupação,  ou seja, você é engajado na causa? Acha importante a realização das paradas LGBts?

BL: É uma realidade chocante, absurda o que me gera muita  tristeza. Nós gays somos vítimas da sociedade desde que nascemos, depois, quando criança, sofremos bulling na escola e depois quando assumimos isso para a família  somos discriminados por muitos. Nós já crescemos vítimas da sociedade por sermos gays, somos massacrados… é uma realidade muito triste. Sempre me coloco à disposição para companhas contra o preconceito a comunidade LGBTQIAPN+. Mas o mais importante, volto a dizer: é vivermos nossas vidas, nossos amores sem vergonha de dizer quem somos. É você postar uma foto e escrever na legenda que ele é seu namorado. É você não ter vergonha de andar de mãos dadas com seu namorado ou no caso das meninas, com sua namorada. Não adianta você ir às ruas, às paradas e no dia seguinte dizer a seus pais que seu namorado é seu amigo. É você ter o direito de dar um selinho no seu namorado assim como o casal hétero faz no shopping ou onde quer que seja.

DT: O seu processo de assumir publicamente a sexualidade, foi demorado?

BL: Sim, eu tinha muita vergonha. Hoje eu tenho 40 anos e fui me assumir gay publicamente aos 37. Meu processo de aceitação e coragem foi muito tardio, eu não tinha preparo emocional.

DT: Como ator, quais seus principais trabalhos?

BL: Participei de alguns clipes, comerciais de TV, fiz recentemente, inclusive o clipe do Dani Castro, que está no Youtube e foi muito especial.

DT: A Comissão da Câmara aprovou projeto de lei que proíbe casamento homoafetivo. Como você, Bernardo Langlott vê essa questão?

BL: Vejo essa questão como um grande retrocesso, é como se nós estivéssemos enquanto sociedade, regredindo, dando um passo para trás. É uma questão que agride não somente a comunidade LGBTQIAPN+, mas a sociedade. São direitos adquiridos e eles não podem tirá-los assim. Se continuarmos nesse caminho, onde vamos parar? Já não basta todo dia lutar contra a homofobia, mostrar que existimos e a conviver com atitudes homofóbicas? A homofobia muitas vezes é muito subterrânea, rasteira e às vezes quase invisível, mas está ali, ela existe. Quando uma proposta de projeto dessas é aprovado, ele dá um aval a essa sociedade homofóbica, transfóbica, essa sociedade que mata todos os dias membros da comunidade LGBTQIAPN+. Não é somente sobre a comunidade LGBTQIAPN+, é sobre pessoas que fazem parte da sua vida. É algo que agride a nossa existência.