Quatro jovens gays falam sobre Salvador

Genilson Coutinho,
29/03/2012 | 11h03

Salvador completa hoje 463 anos de história e de formação social. O site Dois Terços conversou com quatros jovens gays Soteropolitanos para saber o que eles pensam sobre a política, a militância e as oportunidades numa das cidades mais diversas do Brasil. Os entrevistados foram o jornalista Lucival França, 31, o publicitário George Araújo, 26, o administrador Ítalo Costa, 23, e o controller de RH Erik Portela, 25.

Dois terços – Nesta quinta-feira (29), Salvador completa 463 anos sem grandes motivos para comemorar em diversos seguimentos. Você acredita que falta oportunidade para o jovem gay em Salvador?

Lucival França – Há falta de oportunidades para o jovem negro, da periferia, seja ele gay ou não. Falta, também para o jovem branco da periferia. Faltam investimentos nas áreas de educação e lazer, dentre muitas outras carências. Não quero fazer discurso político, mas, politizado que sou, sei que muitos problemas da cidade têm origem social e econômica, muito mais que de comportamento sexual.

George Araújo – Não acredito que falta oportunidade. Acredito que ainda haja preconceito em contratar gays por parte de uma minoria das empresas.

Ítalo Costa – É uma certeza que faltam oportunidades e informação a toda juventude gay. Nem só de “drinks” vive o homossexual.

Erik Portela – Sim, com certeza. Não existem cursos profissionalizantes que ajudem esses jovens por aqui. Nenhuma ONG, nenhum órgão competente. O jovem gay nesta cidade fica a mercê da própria sorte, ou compaixão de algum empregador que lhes dê uma chance no mercado de trabalho.

DT – A comunidade gay da cidade se sente muito carente de uma cena mais agitada para o público de lésbicas, gays, bissexuais e transexuais (LGBT). Você está satisfeitos com as opções existentes na cidade voltada para publico LGBT ?

LF – Não sou a favor dos guetos, isso e coisa ultrapassada. Porém, uma vez que temos uma sociedade arcaica, que se bestifica ao ver dois homens ou duas mulheres de mãos dadas ou se acariciando, não nos resta outra saída a não ser nos fecharmos em grupos e locais específicos. A cidade oferece poucas opções sim, embora existam empresários talentosos trabalhando para oferecer boas opções de lazer e entretenimento. A saída, muitas vezes, é viajar para outras cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Florianópolis e Recife, que também são carentes de entretenimento, mas estão à frente da capital baiana nesse aspecto.

GA – Acredito que pode e deve melhorar muito, pois existe público para isso.

ÍC – Sabemos que o público gay é muito visado por empresários inteligentes. A cena gay em Salvador está muito monopolizada. Devido aos “pré-conceitos”, poucos empresários investem, e quem paga somos nós, pois o custo é alto. Se quisermos diversão temos que pagar o preço, pois não temos opções, a não ser fazer nossa ryca reunião com amigos na lage (risos).

EP – Não. Infelizmente Salvador é pobre nesse aspecto, não temos mais nenhuma diversão por aqui. O Beco? Marginalizado e decadente. Aruba? Quem? Quando? Onde? Nem existe mais. Só restou os lugares ‘elitizados’ que infelizmente não alcançam todo o tipo de público.

DT – A militância LGBT baiana trava uma luta diária para conquistar espaço e da visibilidade as necessidades da comunidade gay ao longo dos últimos anos. Você percebe essa movimentação? Você se sente representado por essas lideranças?

LF – O movimento gay baiano é um dos mais operantes na atualidade. Mas, infelizmente, isso não faz com que crimes contra os LGBT’s não sejam cometidos. Presenciamos ataques homofóbicos quase que diariamente em Salvador e que ganham repercussão a ponto de afastar turistas e visitantes estrangeiros gays a uma cidade que já foi sinônimo de “alegria e respeito às diversidades”. E aí perdemos também numa dimensão econômica, embora nossos governantes façam vistas grossas para essa questão. Segundo o Grupo Gay da Bahia, o estado é um dos mais perigosos para a comunidade LGBT. Sobre ser representado por essas lideranças eu confesso que não me sinto. Acho que faltam iniciativas mais assertivas por parte dos militantes.

GA – Sinto que fazem o possível, mas sei que cada um também deve fazer a sua parte e não ficar esperando por tal ou tal organização. Por isso, vários outros grupos estão sendo criados, inclusive em cidades da Região Metropolitana e no interior do estado.

ÍC – Hoje está bem exposto a ações dos militantes LGBTT’s. Eu apoio e vou à luta junto quando o assunto é a melhoria de algo para um bem comum. Não concordo quando tal movimento se filia a um determinado partido, pois a causa muda.

EP – Gostaria muito de responder que sim, mas sinceramente não percebo mudanças. Estou sempre me informando de algo que envolva isso, mas acho que ainda não veio alguém competente pra ‘empurrar este carro’ pra frente. Travestis marginalizadas, sem direito. Homofobia. Assassinatos. Infelizmente a parte triste pra mim ainda é a mais visível.

DT – Qual presente de aniversario você pediria aos governantes dessa cidade para os gays soteropolitanos?

LF – De uma forma geral que os governantes tomassem para si a responsabilidade de tornar a cidade mais inclusiva. Eles têm essa obrigação. Mas cada um de nos também detemos esse poder transformador. Se cada um de nos tratasse o outro como gostaríamos que tratassem a nos mesmos o mundo seria muito melhor.

GA – Respeito.

ÍC – Um presente digno aos gays soteropolitanos seria a apuração com mais rigor de todas as mortes e agressões ocorridas nos últimos tempos. Assim como campanhas publicitárias de conscientização.

EP – Cursos profissionalizantes para gays, cursos de diversas formas de arte (porque acho que gay não tem que ser só maquiador e cabeleireiro). Espaços LGBT diversos na cidade. Direitos iguais para todos, como adoção, casamento. Essas coisas…