Orgulho LGBT e o (re-)nascimento do sentimento republicano brasileiro

Genilson Coutinho,
20/06/2011 | 10h06

Em 1983, a sociedade foi às ruas exigindo do governo militar a realização de eleições diretas em um movimento que ficou conhecido como Diretas . Envolvia políticos, sociedade organizada, artistas e intelectuais. Em 1992, o movimento estudantil brasileiro, com amplo apoio da sociedade, foi às ruas com o rosto pintado com as cores da bandeira brasileira pedir a saída do então presidente Fernando Collor de Mello, denunciado por corrupção. O movimento ficou conhecido como Caras Pintadas. Em 18 de junho 2011, diversos segmentos da sociedade foram às ruas, em uma iniciativa inédita e republicana por definição, na Marcha da Liberdade, pedir liberdade de manifestar ideias, direitos civis & respeito aos direitos humanos. A marcha nacional, despida de vinculação partidária, reuniu mais de 2,5 mil pessoas em São Paulo e aconteceu também em Salvador e em Vitória da Conquista na Bahia.

A cada vinte anos mais ou menos, nós, o povo, nos levantamos para por ordem na casa.

A nossa república é jovem em comparação com as repúblicas iluministas europeias e esteve a maior parte de seu tempo nas mãos de militares. Não podemos esquecer que quem proclamou a república foram os militares na figura daquele marechal sobre quem se ouve falar no ensino médio, o da perna fina… Um dia, éramos mornaquia. No dia seguinte, éramos república, mas quem fez isso não foi o povo ou seus representantes e sim as Forças Armadas. O nosso senso republicano, de modo tangível, nasceu nas Diretas Já e ainda carece de força. É possível que tenhamos acabado de entrar na infância desse sentimento/ideia, redescobrindo que o país é nosso & o governo é nosso.

A onda de levantes no Oriente Médio (a Primavera Árabe), potencializada pela facilidade de se comunicar e de se organizar nos propiciou o momento ideal, evidenciando a praticidade de organizar uma manifestação pacífica por intemédio da rede. O Supremo Tribunal Federal, ao reconhecer a união estável entre pessoas de qualquer sexo e gênero foi o nosso porta-voz e legislou no lugar de um Senado gordo, ávido por aumentos salariais e preguiçoso. Se o nosso modelo democrático dividido em três poderes dá sinal de que não está funcionando corretamente, é chegado novamente o momento de que nós, o povo, de onde emanam a sociedade, a democracia e o governo, precisa agir novamente. Tolerar a desigualdade não é mais uma opção e junho é o nosso mês no planeta Terra.

Estamos no mês revolucionário para os movimentos LGBT ao redor do globo. Nós nascemos em junho, no bar Stonewall Inn, em Nova Iorque, Estados Unidos. Mais precisamente, nascemos no dia 28 de junho de 1969. Naquela madrugada, um grupo resolveu resistir às batidas policiais constantes no bar, através das quais muitos eram agredidos e presos, simplesmente por não serem heterossexuais. A perseguição era muito pior do que é hoje, visto que era autorizada pelo governo e pela força policial.

Na batida da madrugada do dia 28, nós resistimos.

Após o ataque da polícia de Nova Iorque, houve protestos e grupos de ativistas começaram a organizar locais onde os LGBT poderiam manifestar as suas respectivas orientações sexuais sem serem molestados. Descobriu-se naquele ano que visibilidade é poder político. Em 1970, aconteceu a primeira Parada do Orgulho Gay, em Nova Iorque.

Infelizmente, na sociedade brasileira, a violência contra homossexuais ainda não foi criminalizada e é estimulada dentro de muitas igrejas e templos. É também tolerada entre os nossos legisladores, visto que o PLC 122, que criminaliza a homofobia tornou-se tabu no Congresso e está sendo fortemente prejudicado por uma bancada evangélica medieval em um Estado que é constitucionalmente laico.

E você, o que pode fazer? O estado é seu, você vota, seus pais e amigos votam. Os senadores e deputados não são donos do governo. Nem o é a Frente Parlamentar Evangélica, um câncer dentro do nosso Poder Legislativo. Saia do armário, faça o que os fundadores do movimento LGBT fizeram, dê visibilidade à sua causa – à nossa causa – pois os direitos que eles nos negam são nossos por definição. Direitos dos LGBT são direitos humanos como a própria Organização das Nações Unidas reconheceu. Pressione os congressistas que você elegeu por email, por telefone; investigue sua vida política no site da ONG Transparência Brasil e no Portal da Transparência e nas ferramentas que o próprio governo brasileiro disponibiliza, como a TV Senado, e os perfis institucionais nas redes sociais; assine a petição no site da ABLGBT pela aprovação do PLC 122. Crie um blog, se expresse, respeite a diferença e ajuda a educar que ainda é homofóbico/ignorante.

Faça o que você pode, só não fique em casa, de braços cruzados, reclamando que o mundo é um lugar ruim. O mundo não é um lugar ruim e nós avançamos, mas a estrada é longa.

A única opção que nos é dada é mostrar que nós somos minoria apenas politicamente, mas que estamos por toda parte, em todos os lugares, até – e talvez, principalmente – dentro das igrejas e templos. E, se contribuimos com a sociedade e com o governo pagando os nossos impostos em dia, queremos educação de qualidade (com kit anti-homofobia), queremos segurança pública e queremos ampla proteção do Estado laico brasileiro.

Acima de tudo, querido leitor LGBT, tenha orgulho de ser quem você é.

Fotos: Reprodução/Genilson Coutinho

João Barreto – Jornalista
Jornalista e mestre em Comunicação e Cultura Contemporâneas pela Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia. É analista de comunicação e cultura, especialmente de poéticas audiovisuais. Também tem interesse em desenvolvimento sustentável.