LGBT por insegurança ou instabilidade ainda não debatem sobre partilha

Genilson Coutinho,
19/04/2012 | 00h04

Partilha de bens por dissolução de união ou partilha através de inventário quando um dos parceiros falece são temas ainda delicados aos casais LGBT que de acordo as ocorrências que chegam ao Grupo Gay da Bahia (GGB) eles evitam abordagem dos temas e toda aquela jura de amor termina em ameaças, espancamentos, ocorrência policial e finalmente nos tribunais, geralmente a pessoa mais fragilizada economicamente é quem mais sofre, mesmo sendo ela aquela que durante anos garantiu conforto emocional e ambiente de harmonia ao parceiro.

Empresária do ramo de restaurante R.S.B 49 anos relata que viveu com uma outra mulher por mais de quinze anos, segundo ela, vendeu o seu restaurante e com o dinheiro investiu todo no negócio da parceira. Ambas constituíram diversos imóveis no centro de Salvador e na cidade baixa, onde R.S.B vive atualmente na eminência de ser despejada pela ex-companheira que segundo ela é violenta e lhe espancou por diversas vezes. Ela reconhece que não fez nenhum arranjo jurídico que pudesse garantir direitos. Como passo inicial a ex-empresária procurou a Delegacia de Policia do Bairro e informou a sua insegurança a autoridade policial e agora a briga vai para na Justiça que deverá decidir em relação à partilha dos bens constituídos pelas duas mulheres.

Ativista gay Ricardo Santana, 32 anos, mestre em História pela Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS) tem opinião formada sobre o assunto. Ele acredita que a questão do patrimônio não é discutida entre os casais porque ambos entendem que seus bens podem ser legados a suas famílias biológicas e não ao parceiro. Em sua analise Santana identifica que uma possível instabilidade da relação dificulta essa ação de proteção das partes. “Preferem manter a garantia do patrimônio caso haja alguma separação abrupta da relação” avalia.

A professora Daniela Auad da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) foca que a ausência do debate por vezes ocorre tanto por instabilidade e insegurança. A professora relaciona esse assunto com a homofobia interna e externa de forma que torna o debate um tabu. “Percebo em dois ângulos em relação à situação que ainda vivemos como homossexuais e nossos direitos quanto por mesquinharia” avalia a professora condenando a falta de generosidade de alguns casais e a negação legal do casamento. “Para a mesquinharia, há, por exemplo, a psicanálise e o budismo como curas” segue a professora “Para a instabilidade e insegurança quanto aos direitos, precisamos ter cada vez mais Direito ao Casamento” conclui.

O advogado Enézio de Deus autor do livro Possibilidade Jurídica de Adoção por Casais Homossexuais, lançado pela Juruá Editora em 2011 relata que esses assuntos mesmo que pese a importância é negligenciado por todos. “No geral, os casais só se preocupam com os direitos decorrentes da relação quando essa termina” afirmou o advogado.

Drama parecido com o da empresária, porém mais complexo vive o comerciário I.S.M, 53 anos que teve trinta e cinco anos de sua vida dedicados ao seu parceiro que faleceu no final do ano passado em decorrência de uma cirurgia para implantação de uma válvula no coração. O comerciário relata que logo após o sepultamento do parceiro foi surpreendido pelo filho adotivo do falecido, que ele chama de homofobico,   determinando sua desocupação imediata do imóvel onde morava com o falecido e uma velha empregada. O calvário do comerciário baiano estava apenas começando para ele ter acesso a sua parte na herança, primeiro tem de instaurar um processo judicial de reconhecimento da união entre os dois, segundo abertura do inventário e ter os seus direitos de companheiro reconhecidos. De acordo com o comerciário com base na inexistência de outros familiares a destinação do patrimônio entre os dois deverá de acordo com a Lei se processar da seguinte forma, cabendo ao filho 66,67% do patrimônio e 33,33% reservado ao parceiro. Situação essa que teria sido resolvida se o casal tivesse assinado o termo de união estável, de acordo com o comerciário por seu parceiro ser pessoa do Judiciário da Bahia não se sentia confortável em fazer o procedimento.

O Supremo Tribunal Federal (STF) por unanimidade reconheceu a união estável entre casais do mesmo sexo como entidade familiar. A decisão os ministros entenderam que a união estável entre casais do mesmo sexo deve ser reconhecida como entidade familiar. Com isso, homossexuais podem ter os mesmos direitos previstos na lei 9.278/1996, a lei de união estável, que considera como entidade familiar “a convivência duradoura, pública e contínua”. Com base na decisão, os casais homossexuais podem ir ao cartório para solicitar o casamento civil em todo o Brasil.

por MARCELO CERQUEIRA