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Jornalista da CNN Brasil distorce pesquisa sobre gays e HIV

Genilson Coutinho,
09/07/2020 | 16h07

Nesta quarta-feira (8), o programa Live CNN levou ao ar uma matéria que destacava que a Anvisa liberou, após decisão do STF, a doação de sangue por homossexuais. Durante a discussão da pauta, Leandro Narloch decidiu fazer alguns comentários sobre o assunto e acabou cometendo diversos equívocos de informações.

Narloch começou a fala chamando orientação sexual de ‘opção’ e disparou com discurso preconceituoso: “A mudança, na verdade, é pequena. Ela vai restringir mais a conduta, e não o tipo de pessoa, a opção sexual [sic] do indivíduo”, disse.

Depois apontou dados falsos sobre a contaminação pelo vírus: “Toda essa polêmica começou porque, não há dúvida disso, os gays, os homens gays, eles têm uma chance muito maior de ter Aids, né? Em 2018, uma pesquisa mostrou que 25% dos gays de São Paulo eram portadores de HIV”.

No entanto, de acordo com o estudo realizado a pedido do Ministério da Saúde, de 2018, após testes de HIV terem sido realizados em 3.958 homens de 12 capitais, o vírus foi detectado em 18,4% dos exames. No total, 75% dos entrevistados afirmaram fazer sexo apenas com homens.

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NOTA DE REPÚDIO A SOMOS – Comunicação, Saúde e Sexualidade, uma das mais antigas organizações de luta por direitos das pessoas LGBTI+ e vivendo com HIV/aids do Brasil, repudia a declaração do jornalista #LeandroNarloch na @cnnbrasil na tarde desta quarta-feira (8) Em maio, o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou inconstitucional as restrições impostas a homens gays e bissexuais na doação de sangue. A mudança na norma foi publicada nesta quarta-feira (8) no Diário Oficial da União e tem validade imediata. Durante transmissão ao vivo na CNN Brasil, o jornalista Leandro Narloch mostrou despreparo e ignorância sobre o assunto ao comentar o fato. Leandro inicia seu comentário usando o termo “opção sexual”, forma ultrapassada para se referir a “orientação sexual”. Na sequência é dito que “(…) não há dúvida disso, os homens gays têm uma chance muito maior de ter AIDS” e Narloch recorre a uma fala higienista que divide a população gay entre promíscuos e monogâmicos. Os dados científicos disponíveis embasam o conceito de comportamento de risco, em detrimento da ideia de grupos de risco. Qualquer pessoa que tenha relações sexuais está suscetível a se infectar. Gays, bissexuais, pessoas trans, profissionais do sexo, usuárias de álcool e outras drogas e pessoas privadas de liberdade possuem maior risco de infecção em decorrência da vulnerabilização social a qual são expostos. Portanto, a pesquisa citada e seus dados, usados fora de contexto, reforçam estereótipos e nos afastam da verdadeira discussão: a necessidade de políticas públicas, acesso a serviços de saúde e educação para evitarmos o vírus e a desinformação. É papel da Comunicação colaborar no combate à discriminação que torna o Brasil um dos países mais violentos à população lgbti+ do mundo. Declarações como essa não caminham na direção do respeito à diversidade. #bastadehomofobia #doistercos

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O comentarista ainda deixou de lado um importante alerta sobre a própria pesquisa citada por ele: o contágio na população mais idosa heterossexual e de mulheres vem crescendo. Entre idosas, por exemplo, houve aumento de 21,2%, segundo dados do Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde.

Depois, o comentarista continuou: “Mesmo que esse número seja exagerado, e de fato ele parece mesmo exagerado, o fato é que é dezenas de vezes maior, maior a chance do que na população geral. A questão é que outros critérios para exclusão já restringem os gays que têm comportamento promíscuo, né?”, disparou.

Nas redes sociais, o discurso de Leandro Narloch acabou sendo duramente criticado: “Já está ficando bem habitual a CNN Brasil pegar celebridades da direta que saíram da Jovem Pan e colocar como comentarista de telejornais. Jornalismo lixo!”, “Nada novo né… CNN Brasil é de empresário amigo de Bolsonaro… Muito provável que usem esses discursos e desinformação”, “CNN Brasil e Record podem dar as mãos, pois são exatamente iguais. Comentaristas péssimos e fontes horríveis… Começou bem… mal!”, foram alguns comentários.