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Dia das Mães: A luta pelo direito à vida marcou a história de mães ativistas

Genilson Coutinho,
09/05/2021 | 20h05

Neste Dia das Mães, comemorado neste domingo (9), a Agência de Notícias da Aids decidiu homenagear mulheres que lutam incansavelmente contra a aids e ainda dão conta da maternidade. São pessoas que compartilham com o mundo o amor incondicional. Por meio delas, homenageamos todas as mães pela coragem com que declaram seu amor à vida, tecendo redes de afeto e solidariedade ao redor do mundo, de sua comunidade, de suas famílias. Relembre a seguir as histórias das ativistas Evalcilene Santos, Heliana Moura e Anny Jackeline Santos.

Evalcilene Costa dos Santos

Evalcilene Costa dos Santos atua no Movimento Nacional das Cidadãs Positivas no Amazonas. É mãe, professora e luta pela garantia dos direitos humanos desde 2004, quando chegou ao movimento de aids. É presidente da Associação de Redução de Danos em álcool e outras Drogas, no Amazonas, e coordenadora do Fórum de Organizações da Sociedade Civil em IST/HIV/Aids e Hepatites Virais e Tuberculose. Entre muitas funções, também é Conselheira Nacional de Saúde, representando o Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas entre 2019 e 2021.

Ela tinha 20 anos de idade, uma família e um emprego de professora quando ouviu que tinha só mais três meses de vida. O diagnóstico de que estava infectada com o HIV veio acompanhado de preconceito e desconhecimento sobre a aids. Tinha acabado de dar à luz ao segundo filho. O desconhecimento fez com que ela amamentasse a própria filha durante três meses, mesmo já sabendo do diagnóstico.

O estigma chegou à escola onde ela lecionava para crianças da educação infantil. “Tiraram os alunos da sala de aula porque acreditavam que eu ia infectar a todos. Eu fiquei sem nada”, diz.

Quando Evalcilene foi diagnosticada com HIV, o Amazonas não tinha o tratamento descentralizado para os municípios do interior. Como o médico tinha dado pouco mais de três meses de vida, a professora desistiu de buscar os medicamentos.

“Pra que tomar os medicamentos se morreria em meses? Tranquei as portas da minha casa e fui ficando cada vez mais doente”, relembra. A reviravolta foi movida pela informação. “Eu deixei de lado aquela Val coitadinha e disse: se não morri até agora, vou batalhar para viver e para que isso não ocorra com outras pessoas.” Deixou Maués para trás e mudou-se para Manaus, onde buscou grupos de apoio e iniciou o tratamento contra o vírus. “Não foi o vírus que me destruiu, que me apresentou o preconceito. Foram as pessoas.”

A nova Evalcilene estudou, pesquisou e virou uma especialista em HIV. Queria evitar que outras pessoas soropositivas que vivem no interior do Amazonas fossem humilhadas como ela.  Neste ano, ela venceu a covid-19.

Heliana Moura

Era o ano de 1997 quando Heliana de Moura decidiu fazer o teste de HIV. “Ouvi boatos na minha cidade [Belo Horizonte, capital de Minas Gerais] de que o meu namorado tinha aids. Pensei: ‘se ele tem, eu também tenho’. E não é que eu estava certa? Quando soube do diagnóstico, decidi até mudar para Brasília. Ficou impossível viver em BH, o povo comentava sobre tudo e já estavam espalhando que eu era soropositiva também.”

Na época, Heliana já tinha uma filha. “Foi um desespero saber que eu era positiva. Era o mesmo que receber uma sentença de morte. Fiquei com muito medo, mas o que mais me assustou foi a forma como o médico me tratou. Lembro perfeitamente que ele escreveu em meu pedido de teste de HIV que o motivo era promiscuidade.”

Quase dois anos depois de ter recebido o diagnóstico, Heliana foi retomando a vida aos poucos e engravidou pela segunda vez. Sempre bem humorada e com espírito jovial, decidiu se cuidar mais ainda para que o filho nascesse livre da aids. “Tenho dois filhos, ambos soronegativos. Meu caçula está com 17 anos e a mais velha, com 26. Eles sempre foram a minha maior riqueza. Contar para eles que eu sou soropositiva talvez tenha sido a tarefa mais difícil da minha vida. Me sentia insegura, mas no final tudo deu certo, eles supercompreenderam.”

Diferente de muitas mulheres com HIV que buscam no movimento social apoio para superarem sua nova condição sorológica, a mineira Heliana de Moura , ao chegar no ativismo, seis anos mais tarde, já se sentia fortalecida. Foi em 2003, quando participou, no Rio de Janeiro, de um encontro regional do MNCP (Movimento Nacional das Cidadãs Positihivas). “Cheguei lá com muita vontade de aprender. Eu já havia superado a fase mais difícil e conseguido aceitar que era soropositiva, graças ao apoio da minha família, de psicólogos e da ONG de BH”, ela conta. Hoje, ela trabalha com o acolhimento de pessoas recém-diagnisticadas.

Anny Jackeline Santos

Anny Jackeline Alves dos Santos adorava trabalhar com a fala. Sua paixão era ser locutora de bingo no anos 90. Outra paixão era ouvir Cazuza. Amava cantarolar “ideologia”, sua música preferida. Em 97, também por paixão, entrou em um “relacionamento fixo de minha parte”, como ela mesma define.

Ela morava na cidade de Quixadá, no Ceará. “Comecei a percorrer a 168km até Fortaleza para ver ele. Fui ficando… ficando, até que passamos a morar juntos. Ele é gringo e chegamos a tirar foto, passaporte e visto pra ir embora pra Europa, mas depois da aprovação de meus pais, ele começou a ficar diferente. Um dia veio até mim e disse: ‘a partir de hoje, mulher minha não usa camisinha’. Ele começou a cortar meus cigarros e a escolher as roupas que eu usava. Eu me sentia amada, querida, apaixonada. Hoje vejo que estava iludida e acabei cedendo aos caprichos.”

Anny também se preocupava com o filho de 5 anos de idade, fruto de um relacionamento anterior. Ela conta que suportou essa realidade por três meses, quando decidiu se separar e conseguiu trabalhar novamente com sua paixão, o bingo. Assim o fez até o ano de 2000. Um acidente vascular cerebral (AVC) lhe prejudicou a fala. “Fiquei preocupada com meu filho, ele viu uma das quatro convulsões que tive.” Depois, entrou para o Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas.

Hoje, quase 20 anos após o diagnóstico, Anny tem o filho como melhor amigo e está em um “relacionamento saudável”, como ela mesma gosta de colocar, há mais de 13 anos, com um parceiro soropositivo. “E assim vou vivendo um dia após o outro. Não sofri preconceito de ninguém na minha casa. Conheci pessoas incríveis nesse meio, descobri que minha família me ama, mesmo com todas as dificuldades. Os amigos fiéis ficaram todos. Por isso, o HIV foi o mal que me fez bem.”. Anny encontrou sua ideologia para viver.

da Agência de Notícias da Aids