Com poesia, fonoaudióloga ensina travestis e transexuais a modular voz

Genilson Coutinho,
21/02/2013 | 14h02
O tratamento, pioneiro e ainda único no Brasil, é oferecido gratuitamente no Ambulatório para Saúde Integral de Travestis e Transexuais de São Paulo, projeto realizado no Centro de Referência e Treinamento DST/Aids, onde Denise atua desde 2001. De junho de 2009 a janeiro de 2013, o ambulatório registrou 1.322 pacientes agendados.
Declamando versos, ela ajuda esse grupo específico a deixar a voz saudável e compatível com o visual já modificado. “Esteticamente é fácil, mas e a voz? É o que denuncia. No caso das travestis, elas usam falsetes, tem uma forma de produzir um som nasal para minimizar o tom grave da voz masculina”, explica.
É dentro do consultório que Denise apresenta obras da literatura brasileira em diferentes interpretações. A especialista repete trechos de uma mesma poesia, modificando apenas a forma. A metodologia da sessão (ou aula) suaviza a relação entre a especialista e os pacientes. “São pessoas muito nervosas, tensas, machucadas. E a poesia é muito leve. Então, é um momento de paz, serenidade, recebido com prazer. Com a ‘A Rua das rimas’ (poema de Guilherme de Almeida), muitas choram.”
O trabalho demanda tempo, e disponibilidade de ambas as partes. A fonoaudióloga revela que é preciso, em média, 40 a 50 dias para que os pacientes fiquem à vontade. “Tenho que resgatar a voz natural. E isso é muito difícil para esse público.”
Para ter êxito com uma população tão carente e fragilizada, Denise desenvolve a técnica de modulação da palavra. O que ela oferece é uma espécie de maquiagem na fala.  “Começo a mostrar para o paciente que posso emitir a poesia de várias formas. A voz continua a mesma, mas auditivamente parece outra. O importante não é falar fino ou grosso, é ter um jeito feminino ou masculino de falar”, resume.
A poesia abre terreno para introduzir a prosa. A eficácia, em alguns casos, vai além da técnica. Com a ajuda de Manuel Bandeira – o queridinho da médica – e Cecília Meireles, ela também desperta nos pacientes o prazer pela leitura. “Fiquei muito contente que muitas foram às livrarias atrás dos autores que uso em consultório e descobriram inúmeros outros. Abre caminho para o conhecimento e coisas boas.”
Fonte: G1