Artigo: Um homem seguro de sua orientação sexual não precisa agredir o homossexual

Genilson Coutinho,
15/11/2013 | 11h11

 

Temos presenciado um crescimento considerável de agressões e mortes de homossexuais em São Paulo. A cidade vem se destacando negativamente como a capital que lidera em denúncias desse tipo inaceitável de agressões, segundo os dados da Secretaria de Direitos Humanos (SDH). Os atos criminosos envolvem desde estourar lâmpada fluorescente no rosto da vítima em plena Avenida Paulista, perseguições e vandalismo na região da Rua Augusta e, até mesmo, um caso de um pai que, ao abraçar o filho, teve a orelha decepada por violentos golpes porque ambos foram confundidos com um casal gay, evento ocorrido em São João da Boa Vista, interior paulista.

Casos dessa natureza não são eventos novos. São antigos e que acompanham a história da humanidade. São verdadeiros “Concílio de Nablus” que, em 1120, estabelecia que os adultos sodomitas, classificação à homossexualidade na época, seriam queimados. Esses atos selvagens denunciam mentalidade deturpada e retrógrada, preconceitos e discriminações doentias, sustentadas por um sistema patriarcal, que define o que é masculinidade e feminilidade e que, ainda hoje, considera a homossexualidade como uma perversão, um desvio sexual e uma anomalia, distorções ainda mais acentuadas por alguns grupos religiosos.

Anômalos são, sem sombra de dúvidas, esses crimes bárbaros, motivados por uma ignorância radical. A homofobia é um termo que designa aversão à homossexualidade, mas suas implicações são muito mais complexas. Não existe por lei crime de homofobia, mas existindo, deveriam ser classificados como crimes de ódio. Não existem assassinatos a heterossexuais por causa de sua orientação sexual, mas matam homossexuais por esse motivo, simplesmente por assumirem tal condição sexual. O crime de ódio não é contra uma pessoa, mas contra todo um grupo de pessoas, da mesma forma que quando se chama um negro de “preto”, a ofensa é direcionada à etnia. Diga-se de passagem, o racismo é crime, ocasionando detenção, e concordo que a violência homofóbica também deva ser compreendida dessa maneira.

Em seu livro “A cama na varanda”, a psicanalista Regina Navarro Lins ressalta alguns alicerces do preconceito à homossexualidade. Para algumas pessoas, a homossexualidade estaria em ascensão e deve ser interrompida para não comprometer a unidade familiar e a estrutura da sociedade e assim, diminuiria a definição do papel do homem na sociedade. A razão que considero mais significativa da hostilidade heterossexual são os próprios desejos homossexuais suscitados na pessoa, o que gera muito temor para alguns, pois acreditam que podem ser “contaminados”.

O patriarcado criou uma mentalidade tirana que padroniza os gêneros, bem como enfatiza que essas diferenças, masculino e feminino, devem ser segregadas a todo momento, movimento que vem perdendo força, pois existe uma reconfiguração entre os gêneros, o que implica diretamente uma mudança de postura e comportamentos entre homens e mulheres. O homem e a mulher autônomos não vivem mais atrelados aos conceitos ortodoxos, ou seja, a mulher é feminina, singela, delicada, sensual e que carrega em si todos os atributos ligados ao gênero. A autonomia faz com que ela se aproprie também dos conceitos ligados ao masculino, demonstrando também ser forte, provedora, sustentadora dentre outras qualidades adquiridas. O mesmo acontece com os homens. Estão mais sensíveis, mantêm contato com seus sentimentos, estão mais frágeis, são pais participativos na vida de seus filhos, estão se cuidando mais, mantendo as características masculinas.

Autonomia é não precisar viver escravo das concepções tradicionais e limitadoras dos gêneros. As mulheres estão se transformando, mas principalmente os homens estão sofrendo uma metamorfose por causa de dois fatores: o primeiro é que eles estão cansados de sustentarem as imposições do masculino e que a própria áurea feminina autorizou os homens a reconhecerem outra maneira de ser. Esta mudança interna é preponderante para sustentar a homossexualidade.

Nunca se discutiu tanto sobre o assunto e tantas pessoas estão reconhecendo sua orientação sexual como nos dias de hoje. É lógico que não quer dizer que homens e mulheres autônomos são homossexuais, mas ter contato com esta autonomia faz com que as pessoas se reposicionem diante da heteronormatividade.

A homofobia é o preconceito e aversão à homossexualidade, mas considero que seja o medo à autonomia. Um homem que não vive atrelado ao ideal masculino e é seguro de sua orientação sexual não precisa agredir o homossexual e ponto. Além destas questões apresentadas neste artigo, os preceitos fundamentalistas que servem de referência para o preconceito, de fundamental não possuem nada, pois são retrógrados e arcaicos. Métodos e discursos medievais que destoam dos ideais contemporâneos e deste novo momento da humanidade.

Vivemos um momento no país — cujo Censo de 2010 contabilizou mais de 60 mil casais homossexuais e em que o Supremo Tribunal Federal aprovou recentemente a união estável entre pessoas do mesmo sexo, institucionalizando a unidade familiar para os homossexuais, lhes atribuindo direitos —, mudar toda uma educação e mentalidade sobre o assunto, derrubando preconceitos e sustentando o respeito ao próximo. É preciso criar leis que criminalizem atos homofóbicos como o presenciado ultimamente e que só evidenciam a degeneração de uma sociedade.

*Breno Rosostolato é psicólogo e terapeuta sexual

Artigo publicado originalmente no site do Mixbrasil