Universo LGBT inspira teatro baiano

Genilson Coutinho,
25/04/2013 | 16h04


“O teatro é uma lente de aumento”. A frase, creditada ao russo Vladimir Maiakóvski (1893 – 1930), dramaturgo, teórico e um dos maiores poetas do século 20, sinaliza que esta arte milenar joga seu foco sobre questões humanas para uma observação mais detalhada de suas particularidades.
A lente atual, pelo menos no que se refere à cena teatral local, vem se debruçando sobre o universo LGBTT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais). Há um boom de produções locais sobre o universo, demonstrando que os artistas baianos querem aprofundar a discussão da diversidade sexual.
Não que o assunto seja novo no teatro. Basta lembrar, só citando a dramaturgia brasileira, de autores como Nelson Rodrigues e Plínio Marcos, as obras O Beijo no Asfalto e Navalha na Carne. E a contracultura, na década de 60, pregou aos quatro ventos o amor livre.
Na cena local, pode-se recordar o espetáculo A Terceira Margem, dirigido por Paulo Dourado em 1980, que mostrava a relação difícil de um filho com um pai que se travestia (o texto era Hablemos a Calzon Quitado, do argentino Guillermo Gentile). E em 1989, o diretor Deolindo Checcucci dirigiu Boca do Inferno, no estacionamento São Raimundo, com cenas de relacionamentos homoafetivos.
Estreias – A diferença é que a cena teatral, nos últimos dois anos, vem produzindo, em bloco (não isoladamente), espetáculos que discutem o universo LGBTT, gerando produções de estéticas variadas e contribuindo para o debate e defesa das diferenças.
Este ano, já em maio, no mês da diversidade cultural, duas estreias tratam deste assunto, de maneira distinta: Solo Almodóvar e Diário de Genet, ambas dirigidas por Djalma Thürler.
Solo Almodóvar, que estreia no próximo dia 3, levará ao palco do Teatro Martim Gonçalves a travesti Dolores, interpretada pela atriz Simone Brault. A personagem da peça é um retrato de inúmeras travestis estigmatizadas e marginalizadas pela sociedade.
Já O Diário de Genet, que estreia no dia 4 de maio, na Sala do Coro do TCA, mergulha no pensamento político do dramaturgo francês Jean Genet. No elenco, Duda Woyda e Rafael Medrado. Os dois projetos, de acordo com Djalma, “se sustentam no binômio entre arte e política que denomino de encenação anfíbia”, frisa.
Em agosto, nova estreia aborda o tema da diversidade sexual: o espetáculo Joelma, que foca a vida da transexual homônima, com o ator Fábio Vidal, que trabalhou no curta homônimo de Edson Bastos.
Produções – Recentemente, outras peças abordaram a questão da diveridade sexual na cena local: Entre elas, Entre Nós – Uma Comédia da Diversidade (texto e direção de João Sanchez), que recebeu o Prêmio Braskem 2012 nas categorias espetáculo, texto e ator (Igor Epifânio).
Também Casulo…. uma intervenção trans (concepção e direção de Ângelo Flávio), movimentou a Estação da Lapa e deu voz aos transexuais. Antes, o diretor Fernando Guerreiro montou Pólvora e Poesia, que mostrou a paixão de dois poetas: Arthur Rimbaud e Paul Verlaine. Levou o Prêmio Braskem de Teatro de 2011 de melhor espetáculo e direção.
Reflexo social – “Existem movimentos e fluxos de discussões e inquietações que se refletem no teatro: questão de gênero, raça, classe social, etc.”, afirma o dramaturgo João Sanches (Entre Nós..). “Vejo um avanço na discussão da classe sobre o tema, na medida que estamos nos posicionando. Mas não gosto de lidar com o tema da diversidade com a ótica da vitimização, marginalização”, diz.

Djalma Thürler, que montou O Melhor do Homem, que discutiu a heteronormatividade, diz que “não há dúvidas que há uma produção mais significativa e menos caricatural sobre personagens não heterossexuais”. “São produções sérias que mostram o empoderamento de novos sujeitos”, salienta o encenador.
Por
Eduarda Uzêda
Matéria Pulicada originalmente no Caderno 2 nesta quarta feira 25 de abril.