Tortura nunca mais? Por Tufvesson

Genilson Coutinho,
17/05/2012 | 10h05

Hoje celebramos o Dia Internacional de Combate à Homofobia. Nesta data, em 1990,  a Assembleia Geral da Organização Mundial de Saúde retirou de maneira técnica e científica, a Homossexualidade do Código Internacional de Doenças, impossibilitando qualquer interpretação de cunho moral e preconceituoso, e vedando a qualquer profissional, seja de área saúde ou afins, o tratamento (vulga “cura”) ou correção da orientação sexual.
Há 17 anos luto pelo respeito aos direitos humanos e civis de qualquer cidadão, independente de sua raça, credo, gênero ou orientação sexual. Comecei minha atuação na área de prevenção de HIV/AIDS e outras DSTs, aprofundando, em seguida, a questão do combate ao preconceito, que impeça a cada um de nós exercer de forma plena nossa cidadania.
No entanto, o dia de hoje – além de ser um marco para toda a comunidade LGBT – deve ser também de profunda reflexão. Digo isso, pois fico alarmado com o requinte de violência nos crimes de ódio cometidos contra cidadãos LGBT em nosso país. Se antes esses atos vinham disfarçados de assaltos – como na época do “Boa Noite Cinderela” – hoje vemos corpos carbonizados, olhos e membros arrancados, e sinais de tortura física e psicológica.
Se traçarmos um gráfico entre o aumento desses crimes com a crescente manifestação de incitação ao ódio por parte de parlamentares e pessoas públicas, veremos que isso não é apenas uma coincidência.
Não sei o que faz um ser humano sair de casa e que, ao invés de levar a namorada ao cinema, prefere “bater nos viados”. Ou uma pessoa se sentir incomodada diante da demonstração de afeto entre duas pessoas do mesmo sexo que se amam! Não posso achar que isso não tenha um processo de deformação mental chamado também de homofobia. Mas o respeito que garante a liberdade do outro é o mesmo que nos garante o exercício de nossos direitos civis. Não peço a aceitação, mas sim respeito. Afinal, nosso código penal e civil nos garante isso.
Quando em 2011 criamos na Coordenadoria Especial da Diversidade Sexual (CEDS) o programa RIO SEM PRECONCEITO, demos um enorme passo na direção do diálogo: uma política pública de combate a todo e qualquer tipo de preconceito, pois nos igualamos na dor dos que sofrem e já sofreram por serem apenas “diferentes” na raça, na religião, na altura, tipo físico do padrão estabelecido como “normal” por essa sociedade.
O Brasil passou de sétima para sexta economia mundial. Evoluiu em índices sociais e hoje, dialoga, em pé de igualdade com grandes potências. Pois nesse mesmo Brasil, onde nossa presidente foi torturada nos porões da ditadura e centenas de jovens morreram em busca da democracia, cidadãos continuam sendo barbaramente torturados por terem uma orientação sexual diferente do considerado padrão. E esses crimes não são declarados como o que realmente são: crimes hediondos!
Quando nos tornamos indiferentes a uma cena como a do garoto levando um golpe de lâmpada no rosto em plena Avenida Paulista, ou a do menino de 14 anos, morador de São Gonçalo, mantido em cárcere privado e cujo corpo foi abandonado numa vala, por achar que esse problema “não é nosso”, me questiono que tipo de sociedade entregaremos às próximas gerações.
Até cidadãos não homossexuais sofrem por crime de homofobia como foi o caso do pai, no interior de São Paulo, que teve sua orelha decepada por estar abraçado com o filho. A “justificativa”: “acharam que eles eram namorados”.
Vivemos um período onde a instrumentalização da informação incita a segregação contra minorias. No caso a bola da vez são os homossexuais. Nada de novo, pois métodos semelhantes foram utilizados por populistas como Hitler, Mussolini, os Talibãs, os Xiitas etc. E agora como antes é tudo apenas parte de um projeto de poder, não importa qual massa tenha de ser manipulada.
Mas se o mundo muda, o Poder Público tem o dever de acompanhá-lo. É preciso discutir de forma técnica, aos olhos da Lei e não de acordo com as regras de uma ou outra religião, pois essas são de opção de cada cidadão, temas pertinentes aos dias de hoje. Por mais que se negue, homossexuais são mortos apenas por serem homossexuais.
Quando o sentimento se torna maior, temos de nos questionar. Que tipo de representação queremos? Que sociedade construímos? Mais do que nunca, hoje é um dia para o cidadão LGBT lembrar que ele é cidadão desse país e que seu direito só será exercido através da denúncia, da cobrança e, principalmente, do conhecimento dos direitos que já possui no código civil ou penal, ainda que estes não sejam plenos e igualitários aos conferidos aos heterossexuais e as demais minorias.

Carlos Tufvesson é estilista