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Refugiados gays fogem de perseguições, mas temem ser “caçados” na Europa

Genilson Coutinho,
17/10/2016 | 15h10

Os refugiados não fogem só da guerra. Para mulheres e homens da África ou do Oriente Médio, trata-se também de escapar das perseguições por causa da homossexualidade. Mas estas não terminam quando eles chegam à Europa.

Adeyinka é uma “nigeriana orgulhosa”. Ela acha importante dizer isso, apesar de que, como para os outros refugiados entrevistados, modificamos seu nome para não colocá-la em perigo. Em casa não lhe faltava nada. Seu pai tinha muito dinheiro. Ela estudou em escolas excelentes. E ama sua religião, o islamismo. Aos 33, abrigada em um lar para migrantes lésbicas, na periferia de Viena, na Áustria, ela sobrevive agora com algumas dezenas de euros que recebe toda semana de uma entidade beneficente cristã.

“Sou bonita, e isso me causou muitos problemas. Eu estaria morta se não tivesse escapado”, afirma em tom determinado, em um bar onde se sente em confiança por estar acompanhada de uma responsável da associação cristã austríaca Queer Base. É uma das poucas na Europa que dão, graças a verbas municipais, um apoio específico aos solicitantes de asilo gays, transexuais e lésbicas.

O trajeto de Adeyinka é parecido com o de milhares de homossexuais que chegaram à Europa entre os sírios, iraquianos e afegãos que fugiram dos conflitos, no momento da onda histórica de migrantes em 2015. Ele é salpicado pela violência particular reservada às minorias sexuais, mas também iluminado por uma solidariedade que parece específica dessa comunidade.

Muitos migrantes pegam a estrada por motivos íntimos. É um fato pouco conhecido pelas sociedades ocidentais, assim como pelos poderes públicos. E com razão: na maioria das vezes, os interesses principais escondem os motivos reais de seu exílio forçado, o que complica o acesso ao asilo.

É difícil fazer contato com eles, ainda mais conquistar sua confiança. Eles têm medo da traição e da morte, pois muitas vezes sua cabeça é posta a prêmio por um clã, uma tribo, um chefe de família ou uma autoridade religiosa.

É o caso de Adeyinka, nossa “bela nigeriana”, que ousa pela primeira vez contar a litania de agressões que constituem sua vida. Ela foi casada à força com um empresário “feio e velho”. “Ele dizia ser muito religioso, mas isso não o impediu de me violentar e me engravidar várias vezes, enquanto via o nojo que me inspirava o menor de nossos contatos. Seus filhos, os meus filhos, eu os detestei.”

Um dia, ela foi surpreendida fazendo amor com sua professora e levou uma surra de cinto. Seu marido a jogou no carro de dois homens. “Eles me trancaram em uma casa onde fui torturada sexualmente durante dias. Consegui fugir, recuperei o dinheiro que eu economizava havia anos em segredo e parti.”

Níger, Líbia –a jovem conhecia bem o caminho da Europa e tinha preparado sua fuga. Para atravessar o Mediterrâneo, como centenas de milhares de anônimos, ela pagou aos traficantes temerosos que fazem o destino oscilar. “Para nós, mulheres negras, a cor da pele é uma maldição. Aos olhos dos traficantes, valemos mais que ouro! Eles me venderam à máfia nigeriana na Itália. Eu tinha deixado um inferno para encontrar outro, sem dúvida ainda mais sombrio.”

Adeyinka teve de servir a uma rede de prostituição forçada. Mas a rota dos migrantes homossexuais às vezes é semeada de anjos da guarda. Pois vários deles devem sua sobrevivência aos gays e lésbicas que os ajudaram em seu périplo. “Um gay italiano imediatamente compreendeu que eu não era como as outras garotas. Eu me senti em segurança e lhe disse que eu era lésbica. Ele me comprou uma passagem de trem e me disse para ir à Áustria. Se eu ficasse na Itália, os nigerianos teriam me matado. Aqui, sempre que cruzo com uma mulher negra, olho para o outro lado. Sei que a máfia me procura. Na rua, não falo com ninguém. Os homens me assediam sem parar: ‘Quanto? Quanto?’ Eles ainda querem me possuir.”

Do Uol