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População LGBT no centro do debate da 9ª. Mostra Cinema e Direitos Humanos no Hemisfério Sul em Salvador

Genilson Coutinho,
19/11/2014 | 10h11

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Uma cultura de respeito e valorização das diferenças. A 9ª Mostra Cinema e Direitos Humanos no Hemisfério Sul aposta no audiovisual como uma janela sem fronteiras capaz de ampliar e cruzar as diversas visões de mundo, celebrando a beleza de nossas diferenças e semelhanças. Nesse vasto e delicado campo do sensível, a diversidade sexual é questão central, colocando em xeque comportamentos, preconceitos, normas e poderes vigentes. “Nesta edição, dois filmes brasileiros, em particular, lançam luz sobre a temática LGBT e o desejo coletivo de que os direitos de homens e mulheres sejam para todos e qualquer um”, como frisa o curador da Mostra Competitiva e professor de cinema da Universidade Federal Fluminense (UFF), Cézar Migliorin: Hoje Eu Quero Voltar Sozinho (2014, 95’), de Daniel Ribeiro; e Jessy (2013, 15’), de Paula Lice, Rodrigo Luna e Ronei Jorge.

Um dos indicados brasileiros a concorrer ao Oscar na categoria de filme estrangeiro, Hoje Eu Quero Voltar Sozinho, narra a vida de Leonardo, um adolescente cego, que tenta lidar com a mãe superprotetora ao mesmo tempo em que busca sua independência. Quando Gabriel, um novo amigo de colégio, chega à cidade, sentimentos diversos começam a surgir em Leonardo, fazendo com que ele descubra mais sobre si mesmo e sua sexualidade. “Apesar de ver claramente uma mudança positiva na visão da sociedade em relação à homossexualidade comparada com a época em que eu era adolescente, é evidente que ainda temos muito o que evoluir. O meu objetivo com o filme, no entanto, não era criar um filme realista, que refletisse a sociedade atual. A ideia era retratar um mundo possível, um mundo no qual a homossexualidade não precisa ser um grande obstáculo a ser superado por quem está se descobrindo gay. Acredito que é assim que o mundo deveria ser”, sublinha o diretor.

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Para Daniel Ribeiro, o cinema brasileiro contemporâneo reflete a enorme diversidade quanto ao retrato das personagens gays, o que lhe parece extremamente positivo. “Hoje é mais difícil encontrarmos uma personagem gay caricatural, no qual a homossexualidade seja objeto de humor. Talvez este personagem ainda seja mais comum na televisão, porque há menos tempo para a reflexão neste tipo de produto audiovisual. Sinto que, hoje em dia, quando um diretor resolve retratar um personagem gay no cinema, isto é feito com muito cuidado e com um olhar atencioso”, comemora.

A linha invisível que separa feminino e masculino costura a trama de Jessy, versão curta do documentário Jéssica Cristopherry, cujo nome batizava todas as personagens imaginárias da infância de Paula Lice, diretora e protagonista da trama. Atriz, dramaturga e mulher, Paula conta com o apoio das drag queens para resgatar Jéssica e realizar o desejo de ser transformista. Assim, o filme documenta a construção de Jéssica e homenageia carinhosamente a cena transformista soteropolitana. “O nome era usado por mim toda vez que eu queria brincar de ser outra pessoa, ainda na infância. Uma drag queen é uma materialização de uma figura feminina, em caráter de performance. Dar vida a mulheres gigantes, maiores que a vida, é um desejo que me liga desde muito cedo a esses homens que veem em figuras femininas diversas a inspiração de seus projetos de palco”, comenta a diretora.

Segundo ela, o filme se localiza em um terreno delicado e de muitas camadas, onde o transformismo das drag queens é, a rigor, um espaço de empoderamento da mulher, através dos homens. “Isso não isenta nem homens, nem mulheres que se relacionam com eles do machismo. Por muitas vezes os femininos buscados pelas drag queens não contribuem em nada para os debates contemporâneos sobre os engessamentos dos modelos e padrões de beleza, por exemplo, com os quais mulheres e mulheres trans feministas estão em constante trabalho de luta e ressignificação. Há muitas drags apostando em diferentes modelos de mulher, o que só colore e diversifica as possibilidades de livre expressão do humano. O filme propõe o cruzamento de cinco tipos, bastante diversas entre si, com uma mulher que precisa criar um sétimo corpo, um corpo coletivo, uma mulher que materialize o cruzamento dessas ideias todas, sobre feminino e sobre mulher”, enfatiza.

Mostra Cinema e Direitos Humanos começa nesta terça-feira (18), na sala Walter da Silveira em Salvador

Com entrada franca, a 9ª Mostra exibe ao todo 41 filmes, todos com sistema closed caption e sessões que incluem audiodescrição, voltadas para pessoas com deficiência visual. A realização é da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR), em parceria com o Ministério da Cultura (MinC) e a Universidade Federal Fluminense (UFF), com o apoio da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) e Fundação Euclides da Cunha, além do patrocínio da Petrobras e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Confira a galeria da abertura da mostra em Salvador na última terça-feira (18)