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PM é um dos suspeitos de tentar matar homem por causa de beijo gay

Genilson Coutinho,
24/10/2019 | 23h10

Foto: Reprodução

Um policial militar é um dos três suspeitos de participação na tentativa de homicídio contra Marcelo Macêdo, 33 anos, ocorrida em Camaçari, no domingo (20). A polícia investiga se ele é o autor dos disparos contra a vítima, que segue internada no Hospital Geral de Camaçari (HGC) e sem previsão de alta médica. O PM e outros dois homens se apresentaram na 18ª Delegacia (Camaçari), foram ouvidos e liberados.

Na quarta-feira (23), a delegada Thaís Siqueira, titular da 18ª Delegacia, disse ao CORREIO que câmeras do estabelecimento identificaram os suspeitos – as imagens estavam bem nítidas a ponto de mostrarem o momento em que Marcelo foi agredido e baleado.

Já nesta quinta-feira (24), a delegada tem se pronunciado através da assessoria de comunicação da Polícia Civil. Diante das evidências, o CORREIO perguntou se é o PM quem aparece atirando em Marcelo e até agora não obteve resposta.

Marcelo saiu de casa para encontrar com o namorado, mas o passeio terminou com ele sendo baleado quatro vezes e socorrido às pressas para o HGC. O motivo para tanta violência, segundo testemunhas, foi porque Marcelo beijou o namorado em um bar, o que deixou os três homens descontrolados.

De acordo com informações preliminares, o PM e os outros dois homens estavam dentro do bar onde Marcelo beijou o namorado. O local é frequentado habitualmente por policiais militares, uma vez que o estabelecimento fica a poucos metros do 12º Batalhão da PM (Camaçari).

A Polícia Civil informou que equipes da 18ª Delegacia seguem com as investigações. Em nota, a PC disse que “maiores informações sobre o avanço das apurações serão divulgadas ao término da investigação, para que a mesma não seja prejudicada”.

Pelo fato de haver um PM envolvido na tentativa de homicídio contra Marcelo, o CORREIO cobrou um posicionamento da Polícia Militar. Até agora não houve retorno.

Uma noite comum

O crime aconteceu por volta das 23h, em um bar no bairro Inocop, em Camaçari, na Região Metropolitana de Salvador. Segundo os amigos da vítima, Marcelo vai ao local com frequência e, por isso, era para ser mais uma noite comum.

“Ele e o rapaz estão se conhecendo, ainda não são namorados. Eles marcaram de se encontrar no bar e estavam trocando carícias quando os homens que estavam em outra mesa ficaram incomodados”, contou uma amiga da vítima que pediu para não ser identificada.

O ápice do incômodo foi quando Marcelo e o outro rapaz trocaram um beijo. Segundo as testemunhas, os três homens foram até a mesa em que o casal estava e agrediram eles, no começo, verbalmente. Marcelo argumentou que não estava fazendo nada de errado e que tinha direito de estar ali, o que enfureceu ainda mais os bandidos. Os criminosos agrediram os dois com socos e chutes, até que um deles sacou uma arma e baleou a vítima quatro vezes.

“Eu fui injustiçado. Nunca tinha me sentido intimidado, nem agredido fisicamente. Sinto muitas dores, estou todo machucado, mas a dor psicológica é pior do que a física”, contou Marcelo em entrevista ao CORREIO. Apesar da experiência traumática, ele disse que já conversou com o parceiro por telefone, após o ataque. “Não abalou a gente não”.

Os projéteis acertaram o braço e o abdômen de Marcelo, que foi socorrido às pressas para o HGC, onde permanece internado. Ele passou por cirurgia e o quadro de saúde é considerado estável.

O caso de homofobia é acompanhando pela Comissão de Diversidade Sexual e Enfrentamento à Homofobia, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-BA), pela Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social da Bahia (SJDHDS), e pelo Grupo Gay da Bahia (GGB). Na terça-feira (22), o governador Rui Costa também condenou o ataque, durante o programa Papo Correria. Ele disse que esse não é o Brasil que os brasileiros merecem e afirmou que o caso será investigado com rigor.

“Esse episódio compõe esse tecido que se construiu no Brasil nos últimos anos, de pregar ódio e intolerância nas pessoas. E querer hegemonizar a sociedade na base da força, da violência, do medo e da truculência. Isso merece o nosso total repúdio, e todas as autoridades competentes, policiais, vão agir para entregar, com todos os detalhes, os responsáveis à Justiça. Da nossa parte, temos que continuar repudiando e dizendo que não aceitamos. Esse não é o Brasil que nós merecemos”, afirmou.

Desde junho de 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF) tornou a homofobia crime. Os ministros determinaram que a conduta passe a ser punida pela Lei de Racismo (7716/89), que hoje prevê crimes de discriminação ou preconceito.

De acordo com a decisão da corte, “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito” em razão da orientação sexual da pessoa poderá ser considerado crime com pena de um a três anos, além de multa. Mas, no caso de Marcelo, soma-se também a tentativa de homicídio.

O Grupo Gay da Bahia (GGB) está acompanhando o caso. O presidente da entidade, Marcelo Cerqueira, também acredita em homofobia e cobrou punição para o crime. A instituição contabilizou 23 homicídios de LGBTs no estado este ano, mas disse que esse número é maior porque nem todos os casos chegam até o GGB.

“Espaço público é espaço de todo mundo, e um beijo não é crime. Isso não deve incomodar porque não é proibido, nem para gays nem para héteros. Um beijo não é motivo para indignação a ponto de alguém fazer isso [atirar 4 vezes] com outra pessoa. O que permitiu essa violência foi a má índole dos agressores e a vulnerabilidade social em que a comunidade vive, com essa sensação de impunidade para crimes desse tipo”, afirmou.

*As informações são do Correio24horas.