“Papo Sério”: Gay só pensa em sexo?

Genilson Coutinho,
20/04/2013 | 18h04


Antes de começar a expor minhas idéias, é preciso deixar claro que o que escreverei aqui não se baseia em estudos acadêmicos ou comprovações de cunho científico, mas em minha experiência pessoal enquanto jornalista envolvido com a sexualidade, namorado, gay e amigo de algumas dezenas de outros homossexuais.
O tema do texto são as clássicas perguntas: será verdade que os gays são promíscuos e não querem nada sério? Que ninguém se interessa em namorar e manter um relacionamento estável? Que os héteros estão em melhores condições, já que, na maior parte das vezes, casam-se, formam família e têm filhos?
Questionamentos desse tipo sempre me soaram como sintomas de uma forte carência afetiva e uma acentuada baixa auto-estima, muitas vezes originadas de um preconceito internalizado.
Explico: ser gay ainda é difícil. Nossos pais, em geral, não nos criam levando em consideração que é possível, no futuro, gostarmos de alguém do mesmo sexo. A sociedade, mediante instituições como a família, a igreja e até mesmo a escola, dedica-se a desencorajar comportamentos homoeróticos em favor dos heterossexuais.
Quando o gay percebe sua verdadeira orientação sexual, faltam modelos e conceitos positivos pelos quais possa se guiar. A pessoa sempre foi educada que o “certo” é “Mariazinha ficar com Zezinho”. O que acontece quando ela percebe que o “Joãozinho” é mais atraente?
Essa conclusão, até certo ponto simples, não raramente passa despercebida pelos homossexuais. Isso porque a constatação de que se está “fora dos modelos” freqüentemente resulta em sentimento de culpa, e o gay passa a acreditar que realmente existe algo de errado consigo.

Desajustados?
A primeira reação, portanto, não será a de criticar os modelos, mas de tentar ajustar-se a eles. Quando se percebe que isso não é possível, sobrevém mais sofrimento, e a pessoa passa a desenvolver uma baixa auto-estima, acumular carências e até chegar a sérios problemas psicológicos.
Como não é possível eliminar o desejo, também fica fácil entrar em um processo negativo de sexo desenfreado, pois a baixa auto-estima não apenas faz com que a pessoa não se veja como alguém capaz de ter um envolvimento emocional com outra, mas passa a influenciar negativamente sua própria visão quanto às demais pessoas.
Nesse ponto, um relacionamento estável aparece como uma solução mágica. Encontrar alguém confiável e capaz de redimir todas as angústias com seu amor e romper o círculo do sexo sem compromisso e sem sentimento passa a ser uma meta de vida.
O problema é que o modelo de relacionamento adotado é também o que nossos pais nos ensinaram – e dirigido aos heterossexuais: uma relação monogâmica, fiel, que dure para toda a vida, etc.
Por que isso é um problema? Porque esse modelo muitas vezes não funciona sequer para os heterossexuais. Evidentemente, há pessoas que o seguem e são felizes assim, mas o número delas é bem menor do que a sociedade nos faz pensar.
Esse modelo despreza a plasticidade das relações humanas, a possível atração sexual por outras pessoas independentemente do amor e uma série de nuances que certamente entram na equação que leva muitos casais héteros ao divórcio, à manutenção de amantes ou à adoção de práticas sexuais consideradas heterodoxas, como o swing (troca de casais) ou o ménage (sexo a três).

Crítica aos modelos
Entre os gays, pessoas para as quais esse modelo não foi criado, a situação é ainda mais complicada, especialmente se enviesada pela carência e baixa auto-estima a que nos referimos há pouco.
O resultado óbvio é o de que muitos namoros “não dão certo”, e o gay passa a acreditar na velha história de que os outros gays não querem nada mais do que sexo casual e são “naturalmente” promíscuos – história, aliás, criada por homófobos (pessoas que rejeitam a homossexualidade) para manter os homossexuais à margem da sociedade. O gay passa, então, a adotar o discurso do opressor.
O ponto de partida para romper esse estado de coisas é criticar os modelos que nos foram propostos desde cedo. Ser gay não é fácil porque, até certo ponto, é “remar contra a maré”, mas também guarda um potencial de quebra de paradigmas que pode ser benéfico para toda a sociedade e não pode ser desprezado.
Por possuirmos uma orientação sexual que, em si mesma, não se ajusta ao que nos ensinaram, temos também mais “material bruto” para criticar as hipocrisias sociais que dizem respeito à sexualidade.
Trata-se, portanto, de partir da condição de homossexual e olhar as convenções sociais e seus próprios pensamentos de uma forma mais crítica, mais sincera, a fim de detectar a real origem de nossas carências, inseguranças, medos e visões deturpadas de mundo.
Uma vez feito isso, procure trabalhar sua auto-estima – e nada melhor do que contar com amigos e outros gays que já passaram por esse processo e foram vitoriosos. Estudar a homossexualidade e a história humana também ajuda, pois assim você certamente verá que não há mesmo nada de errado com você.
Resolvidas essas questões, o resultado quase sempre é uma incrível paz de espírito. Então, aí, sim, você estará preparado para relacionamentos maduros, pois terá algo a oferecer – e para trocar. Se assim for, certamente você encontrará alguém, pois, ao contrário do que se diz, há muitos gays por aí querendo, sim, construir um futuro com outra pessoa.
Pode ser também que você simplesmente opte por permanecer no sexo casual ou mesmo por manter uma relação aberta com duas ou mais pessoas. Isso tampouco é ruim, afinal, a crítica aos modelos já não foi feita? Quem prova que a felicidade está apenas no relacionamento tradicional? Há relações assim que simplesmente acabam com as vidas das pessoas.
A diferença é que, se você optar por essas outras vias, o fará por maturidade, e não por inconseqüência – e poderá, afinal, aproveitar o que de melhor a liberdade sexual tem a oferecer.
Por João marinho
Texto cedido gentilmente por João Marinho editor da revista BOYS IN THE BOX 34, da Sexsites Editorial.
Foto: Reprodução
Site: Advocaciatribst