ONU: Travestis e transexuais participaram de consulta sobre agenda pós-2015

Genilson Coutinho,
08/04/2013 | 11h04

Representantes das associações LGBT em evento na Casa da ONU em Brasília. Foto: PNUD Brasil/Katherine Judd


Como parte das atividades da Consulta Pública Pós-2015, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) organizou em março, na Casa da ONU, em Brasília, uma audiência com representantes de associações brasileiras de travestis e transexuais.
A eliminação de todas as formas de preconceito e discriminação foi selecionada como prioridade para a agenda pós-2015. No Brasil, travestis e transexuais sempre foram estigmatizadas. Sofrem vários tipos de violências e são assassinadas com requintes de crueldade todos os dias, sem registro oficial. A ONU também alertou que elas são excluídas do acesso a educação, trabalho e previdência social em razão da discriminação.
As prioridades apontadas pelo grupo incluem a eliminação de todas as formas de preconceito e discriminação, o acesso à educação e estrutura para permanência das travestis e transexuais nas escolas e no trabalho. Todas essas revindicações passam pela questão da identidade de gênero, apontou a agência da ONU. “Este conceito diz respeito à vivência interna e individual do gênero tal como cada pessoa o sente, a qual pode corresponder ou não com o sexo atribuído após o nascimento, incluindo a vivência pessoal do corpo.”
No Brasil, um Projeto de Lei de Identidade de Gênero foi apresentado ao Congresso em fevereiro de 2013.
“As pessoas devem poder definir sua própria identidade, dizer quem elas são”, afirmou a Deputada Érika Kokay, autora do projeto de lei juntamente com o Deputado Jean Wyllys.
Para o movimento social de travestis e transexuais, a proposta é de extrema relevância e pode ajudar a erradicar a transfobia — a aversão à presença de travestis e transexuais. “É a aversão à existência, que não é permitida nem tolerada”, destaca Marcelo Caetano, da Associação de Homens Trans.
Os oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), compromisso firmado entre 189 líderes mundiais no ano 2000, têm seu prazo final em 31 de dezembro de 2015. Após esta data, os desafios continuam com uma nova agenda de desenvolvimento, que já vem sendo formulada.
A base para esta formulação é a Consulta Pública Pós-2015 (www.onu.org.br/meumundo), feita em mais de 50 países — entre eles o Brasil –, a fim de mapear as demandas prioritárias dos mais variados segmentos da sociedade.
Violências institucionais limitam direitos das pessoas trans

A questão do não reconhecimento da identidade de gênero dessa população leva a uma série de violências institucionais, que limitam suas oportunidades. Por exemplo, durante sua vida escolar, as travestis sofrem com o preconceito dos colegas e a falta de preparo dos professores, o que provoca sua evasão escolar precoce.
“Para nós, (a educação) não é uma realidade. O ir à escola é muito complicado”, diz Cris Stefanny, Presidenta da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA). O tema educação foi a segunda prioridade apontada pelas participantes. Sem estudo, essa população sofre restrições no mercado de trabalho. Entretanto, mesmo quando possuem estudo, travestis e transexuais são vítimas de preconceito por não poder exercer sua identidade social.
Para Leonardo Tenório, Presidente da Associação Nacional de Homens Trans, “ter escolaridade não é suficiente porque depois (travestis e transexuais) não têm acesso ao trabalho. Homens trans se assumem mais tarde, estudam mais e, quando chegam ao mercado de trabalho, ninguém quer dar emprego”.
Houve avanços na área da saúde, com a aprovação da Portaria 1.707 do SUS, que traz orientações sobre o processo transexualizador pelos serviços públicos de saúde, além das agendas afirmativas dos Planos de Enfrentamento à Epidemia de Aids.
Entretanto, o estigma causa a invisibilidade dessas populações nas outras áreas de politicas públicas. “Na prática, eu acabo não existindo”, diz Liza Minelly, Presidenta da Rede de Pessoas Trans (REDTRANS).
Por outro lado, “na hora da ‘limpeza social’, para ‘limpar’a cidade e deixá-la bonita para a Copa, as travestis são reconhecidas”, destaca Fernanda Benvenutti, presidente-fundadora da Associação dos Travestis da Paraíba (ASTRAPA) e Secretária de Relações Institucionais da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Travestis e Transexuais (ABGLT).