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O cinema LGBT, o estereotipo do “Sapatão” de primeira viagem e do seu marido Zé ruela

Genilson Coutinho,
01/10/2018 | 09h10

Filipe Harpo

Taís, uma policial dedicada, coloca um dos grandes criminosos da cidade atrás das grades. Mas um grande esquema é armado pelos comparsas do bandido para solta-lo e logo liberto, ele vai atrás da família da Tenente Taís e a sequestra como vingança. Agora, Taís precisa comandar uma grande operação em combate ao crime, e além disso, terá a missão de resgatar sua esposa e filhas das mãos da máfia que controla seu país… Isso poderia ser a sinopse de um dos inúmeros filmes de ação puro clichê jogados ano após ano nos cinemas, ou direto para serviços de streaming. Todos sabem, esse tipo de filme, não será realizado tão cedo, justamente por seu papel destaque ser de uma LGBT, que não necessariamente precisa ser evidenciada na trama por conta da sua sexualidade.

É muito mais fácil/comum você assistir um filme onde a temática lésbica é mostrada sob o ponto de vista de uma mulher “heterossexual” com um marido violento, ou zé mané, ou insensível, que depois de conhecer uma outra mulher é seduzida e levada para o caminho do “lesbianismo”. Ou também, a jovem que não gosta de meninos, mas experimenta e entra no embate – durante toda metragem da produção – de será que sou/será que não sou/ tá gostoso/ saio correndo? Como se o embate real de toda lésbica fosse escapar de homens ruins/frustrados e descobrir o grandioso prazer de uma mulher depois de inúmeras decepções masculinas.

Em grande parte, filmes onde mulheres lésbicas são personagens principais são configurados pelo ponto de vista heterossexual. O que se nota é uma mulher lésbica para o olhar masculino hétero da plateia. A figura do marido é algo forte no circuito de personagens secundários. Ele é frustrado, estupido, rígido, frígido, violento, bonzinho demais… Ele é o masculino disfuncional. Por algum defeito DELE ela torna-se lésbica. Não é um estereotipo, para nós homens acredito, fácil de ser visto. Profissionalmente eles são homens de sucesso. Gangsters, advogados, grandes empresários… Mas é no íntimo onde sua masculinidade pode ser testada, não aprovada e dá espaço então para uma outra mulher substitui-lo…

Quando essa outra mulher adentra no lar tradicional, é justamete para “mudar” a sexualidade da esposa. Repare… ela sempre é um pouco mais masculina que a personagem encubada, o ridículo é posto quando as vezes ela é até mais masculinizada que o homem abandonado. Fica mais parecendo o confronto entre “dois pseudo machos” que um homem e uma mulher.

Uma arca cheia de bichas pretas por Filipe Harpo

Assisto filmes de temática lésbica como se fosse mais um recado para o homem hétero. Tipo, “TOME CUIDADO”, “NÃO FAÇA O QUE ELE FEZ”, “DÊ NO CORO DIREITO RAPAZ”. São filmes sobre mulheres, flertando com a bissexualidade ou se descobrindo perante uma “nova” sexualidade. Deveria ser um filme para elas. Tipo, o masculino desaparece com 5 min de trama, se realmente fosse aparecer. Mas as vezes, mesmo com pouco tempo em cena, o macho domina a tela – importância esta dada pelos realizadores da produção – que as duas protagonistas soam apagadas.

Ai, elas escolhem FINALMENTE um novo caminho. A garota deixa a heterossexualidade pra lá e conhecendo seu novo ser se permite a novas vontades. E o mar de depressão – sofrimento – violência começa! Poucos são os filmes de final feliz. Poucos são os filmes onde elas não choram. As relações são de um desequilíbrio ímpar, onde elas se envolvem de forma doentia, mais parece um festival de personalidades borderline de alto nível que qualquer outra coisa.

Vejo algumas amigas lésbicas reclamando desse filmes feitos para o “grande público” onde mulheres LGBT são protagonistas. Na tentativa de se enxergar de forma mais tranquila, peneram muito até encontrar um água com açúcar de qualidade ou um drama focado não tanto no sofrimento do ser feminino. Perante meu olhar masculino, sempre me incomodou a figura desse macho desequilibrado e o comportamento dele que desencadeia na frustração da mulher para deixar portas abertas para uma outra mulher entrar e mostrar aquilo que ele nunca foi capaz de dar. Ser lésbica não poderia ser apenas ser lesbica? Não tem nada a ver com a gente! Uma mulher gostar da outra e pronto? Não pode? Sem rolas, homens, noivos, maridos, namorados, só mulheres…

Filipe Harpo é diretor da SOUDESSA Cia de Teatro, historiador pela UNEB, realizador audiovisual pelo Projeto Cine Arts – UNEB – PROEX e apaixonado por cinema.