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Museu Nacional da Cultura Afro-Brasileira oficializa inédita gestão feminina

Genilson Coutinho,
17/08/2022 | 22h08
Foto: Divulgação

Museu Nacional da Cultura Afro-Brasileira, localizado em Salvador, oficializa inédita gestão coletiva comandada por mulheres. A direção institucional fica a cargo da produtora cultural Cintia Maria, enquanto a gestão artística tem o comando da diretora audiovisual Jamile Coelho. Deixa a presidência da instituição, o seu fundador José Carlos Capinam, o aclamado poeta da Tropicália, compositor de sucessos do Gilberto Gil (“Soy loco por ti America” e “Vira Mundo”), Caetano Veloso (“Clarice”) e João Bosco (“Papel Machê”).

Na última década, o Muncab se consolidou como um espaço de memória dedicado a valorizar os aspectos da cultura afro-brasileira, por meio da valorização dos artefatos e dos registros diaspóricos. Atualmente, a nova direção planeja uma reestruturação para a reabertura gradativa do espaço para o público, além de investir em acervo, pesquisa, educação, programas de residências e no relacionamento com a comunidade museológica. O novo logotipo da organização também foi lançado, com referências dos símbolos adinkras.

“Como dizia a educadora baiana Makota Valdina, é preciso ser sujeito da história e não objeto. Sendo assim, vejo esse novo desafio como uma missão de honrar a trajetória dos nossos ancestrais. As matrizes africanas têm um papel fundamental na construção da identidade brasileira”, defende Cintia. Ela completa: “O museu é um espaço de memória, mas também de reconhecimento e de reconexão, como diz Capinam, “aqui nós trabalhamos com o tempo, com o que foi, o que é, e o que será”.

Natural de Salvador, Cintia Maria é empresária e gestora cultural. Desenvolve e gerencia projetos inovadores, criativos e de impacto social na área cultural com foco nas populações invisibilizadas e culturas identitárias. Cineclubista e fundadora do Cineclube Antônio Pitanga, sócia da Editora Emoriô, é cofundadora do projeto de formação audiovisual Núcleo Baiano de Animação em Stop Motion (NUBAS) e idealizadora do Cine Janela.

A cineasta soteropolitana Jamile Coelho iniciou sua carreira na gestão cultural como Conselheira de Cultura em Camaçari, região metropolitana de Salvador. Bacharel em Artes pela Universidade Federal da Bahia, foi responsável pelo projeto de implantação do Museu Virtual Roque Araújo. Acumula mais de 30 prêmios durante a sua trajetória como curtametragista de animação. Contribui para a descentralização do audiovisual através da realização de oficinas em quilombos, terreiros, universidades e escolas.

Espaço e acervo

Inaugurado em 2011 por Capinam, o Muncab tem um acervo com mais de 400 peças, que transitam pela arte contemporânea, erudita, popular e sacra. São pinturas, esculturas, móveis e documentos, entre outros objetos. O museu abriga trabalhos de notáveis artistas visuais pretos, entre eles esculturas do Mestre Didi (Salvador, 1917-2013), descendente da tradicional família Asipa, originária de Ketu, importante cidade do império Iorubá. Pinturas da gravurista mundialmente conhecida Yêdamaria (Salvador, 1932-2016) e outros nomes.

“Os ancestrais foram submetidos ao ritual do esquecimento de suas origens antes de embarcarem em navios. Mas essa crueldade só impulsionou o nosso ‘lembramento’. Como dizia Mãe Stella de Oxóssi, ‘o que não se registra, o tempo e o vento levam’. Como o símbolo adinkra do sankofa prega, caminharemos para frente, sem nunca perder a referência de quem veio antes”, reflete Jamile sobre a valorização do Muncab.

Tropicalista

Aos 81 anos de idade, Capinam se aposenta das atividades, tornando-se “Presidente de Honra” do museu que idealizou e esteve à frente desde 2011. “O Muncab opera com descobertas do que ainda não é o suficiente e do que significou a importância do negro na cultura brasileira. É dentro dessa perspectiva que o museu pode oferecer sabedorias e revelando as contribuições africanas, mesmo que limitadas pela opressão, elastecendo a cultura brasileira”, avalia o artista.

José Carlos Capinan tem passagens pela comunicação, gestão pública, pelo cinema e pelas artes, além da música. É imortal da Academia de Letras da Bahia e formado em teatro, medicina, pedagogia e direito. O artista tem na trajetória roteiros, letras e textos para a Sinfonia da Cidade de Salvador, produções de shows de Gal Costa, Macalé, Luiz Gonzaga, além de parcerias e composições com Tom Zé, Caetano Veloso, Moraes Moreira, Paulinho da Viola e Fagner, entre outros nomes.