Marcia Castro fala do seu novo CD, “De Pés no Chão”

Genilson Coutinho,
29/06/2012 | 21h06

Cantora e violonista, a baiana Marcia Castro iniciou sua carreira artística em 1995, aos 16 anos. Artista dedicada, estudou canto e violão com vários profissionais e adquiriu grande conhecimento musical para dedicar-se a Música Popular Brasileira e ingressar na Escola de Música da Universidade Federal da Bahia. Participou como violonista e cantora em diversos espetáculos teatrais, tais como: “Do Fino Véu ao Céu da Boca”, “Prelúdios Intensos para os Desmemoriados do Amor” e “Mulheres”. No campo da música, apresentou-se em diversos palcos da cidade do Salvador, abrindo shows de artistas como Elomar e Belchior, ainda no início da carreira.

No país das cantoras não é fácil conseguir separar o joio do trigo. Muita gente bem intencionada, belas vozes, mas diversas vezes apresentando um trabalho sem conjunto, sem idéia, sem verdade. Esse não é o caso de Marcia Castro que, logo no seu primeiro CD, “Pecadinho”, vem com o apoio de personalidades importantes do cenário nacional. É de Tom Zé a seguinte declaração: “Sou fã, torço por Marcia Castro e espero que, tal Midas, ela dê a tudo que cantar o banho de ouro e eloquência com que interpretou Pecadinho”. O artista refere-se à música sua e de Tuzé de Abreu, que abre o disco e deu nome ao CD.

Atualmente, ela dedica-se ao seu novo projeto, “De Pés no Chão”, assegurado por ela como uma continuação do primeiro disco.

Nesta entrevista, ela fala da sua experiência fora do país, da aceitação do público com o seu trabalho, e de questões relacionadas ao público LGBT.

 Seu ponto de partida em 2008 para São Paulo foi o ponta pé decisivo para sua a carreira fora de Salvador. O que motivou por essa escolha?
Migrei para São Paulo de modo muito espontâneo. A priori, a idéia era ficar 3 meses para fazer o lançamento do PECADINHO (meu primeiro álbum) no eixo sudeste, que sempre foi muito importante para a divulgação nacional na música popular brasileira. Nesses 3 meses, foram surgindo convites para shows, participações, programas de TV, e etc, que foram fundamentais para o crescimento do meu trabalho. Além disso, fui conhecendo músicos, artistas maravilhosos, de todos os lugares do Brasil que também estavam aqui. Ou seja, senti que poderia desenvolver a minha música e o meu público de um modo mais intenso. De todo modo, sou uma artista que carrega a Bahia, seja na arte, seja na minha constituição humana. Faço questão de afirmar o lugar de onde vim.

Você fez residência artística no Timor Leste além de uma turnê na Turquia. Como foi essa experiência fora Brasil? Quais foram os pros e contra nesse período?

A experiência no Timor foi muito difícil, pois nunca havia me deparado com a realidade de um país pós-guerra, que teve 75% de sua população (e consequentemente de sua cultura) destruídos. Tentar encontrar uma entrada artística no coração dessas pessoas tão magoadas, tão arrasadas foi um dos meus maiores desafios de vida. Até mesmo porque as diferenças culturais são imensas. Mas acredito que eu e Virginia de Medeiros (artista visual que me convidou para a empreitada) conseguimos deixar ali uma semente.
Já na Turquia fizemos 15 shows. Foi mais fácil, os turcos gostam muito da música brasileira. Foi muito bom sentir isso e conhecer uma cultura também tão diferente.

Maryana Aydar , Ana Caña, Rita Ribeiro e a baiana Manuela Rodrigues são exemplos de grandes vozes da música brasileira, que tem conquistado espaço na mídia e em grandes eventos pelo país a fora . Como você tem visto o crescimento dessas mulheres no cenário musical?

Vejo que vivemos um momento de profusão de intérpretes, de propostas musicais, quase que uma reforma na música brasileira, que aos poucos vai tomando uma dimensão nacional. Conheço muitas dessas cantoras. Embora muitas estejam ou sejam de São Paulo, sinto orgulho por ver a Bahia tão bem representada nesse cenário da música brasileira contemporânea. Vejo que podemos avançar mais nessa visibilidade. Com incentivos de projetos e do governo, vamos mostrando ao Brasil que a diversidade da música baiana existe de fato. Temos uma das produções mais ricas do país, embora a indústria do axé suplante esse cenário em termos de mercado.

Em 2007, o CD Pecadinho lhe rendeu muitos elogios da critica, grandes shows e a indicação do Prêmio TIM/2008 como “Melhor cantora de pop-rock” ao lados de grandes estrelas da musica popular brasileira . Quais influencias deste trabalho você trouxe para seu novo trabalho?

O DE PÉS NO CHÃO é uma extensão do PECADINHO, ele surgiu do palco, da evolução do repertório do PECADINHO nos shows. Um é cria do outro nesse sentido. A diferença é que o PECADINHO é um disco de estúdio. E o DE PÉS NO CHÃO é um disco de banda, com uma alma de “ao vivo”, fruto do meu encontro com músicos de diversas partes do país. Sou muito feliz com os dois trabalhos e com a repercussão que eles me renderam e ainda me rendem. É a resposta de muito trabalho.

A Natura Musical abriu recentemente um edital local para os artistas baianos com forte incentivo financeiro abrindo um leque de possibilidade para os novos talentos da musica baiana. Como tem sido essa experiência em ser patrocinada por esses do Natura Musical?

Maravilhosa. Acho que a entrada desses projetos são fundamentais para que a nossa produção independente comece a ganhar mais visibilidade, fomente e crie público, provoque os empresários da música a investirem nesse tipo de produção. É um efeito dominó. A partir do momento que podemos produzir de modo digno e profissional, ganhamos também mais visibilidade e isso traz mais investimento e público. A Bahia, em termos de política pública cultural, está muito bem estruturada.

Você vive em São Paulo com os olhos e o coração em Salvador. Qual a sua opinião sobre a greve dos professores e o posicionamento do governo baiano no que tange a educação?

Faço questão mesmo de acompanhar tudo que ocorre do meu estado. Sou ligada, estou ligada, pretendo um dia voltar. Não posso ficar alheia ao lugar que amo. A educação no país, de um modo geral, ainda é relegada a segundo plano. Na Bahia, parece que ainda é mais grave. Não posso dar uma declaração muito precisa, pois a imprensa coloca as notícias a partir de óticas muito particulares. Mas é inadmissível que o governo não consiga interromper uma greve que já chega a 80 dias. Vejo como inoperância.

Casamento gay, adoção por casais homoafetivos estão na ordem do dia. Você acredita que falta interesse dos nossos governantes nas resoluções destas questões em prol do cidadão LGBT?

Sem dúvida. Os tabus ainda são imensos. Isso gera descaso. Ao mesmo tempo, estamos muito bem representados pela corrente contrária, como o Jean Willys, que está ali lutando pela causa, no meio dos podres poderes. Vamos saber votar bem nesses nossos representantes. É uma escolha que passa por nós.