Manifesto da 16ª Parada do Orgulho LGBT de São Paulo

Genilson Coutinho,
24/05/2012 | 10h05

O Brasil está doente. Todas e todos nós, que nascemos e vivemos neste solo, estamos vulneráveis. A homofobia é um vício social que atinge e corrompe a cidadania. Ninguém está imune.

A nossa luta não é nova. Os números da discriminação estão estampados em jornais por todo o território nacional e já não há dúvida sobre a histórica condição de opressão a que lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais estão submetidos.

266 LGBT assassinados em 2011, uma morte a cada 33 horas, um novo recorde para o país. Esses dados subnotificados não são a novidade.

A mensagem que trazemos hoje é que, apesar do ódio se respaldar na diferença, a homofobia é um mal que atinge a todos, sem distinção.

No último dia 15 de julho, pai e filho que se abraçavam durante um evento na cidade de São João da Boa Vista, interior de São Paulo, foram barbaramente agredidos. O pai, de 48 anos, teve metade de sua orelha decepada. Antes do ato de violência, os agressores perguntaram: “Vocês são gays?”, sem que a resposta fizesse diferença.

Será esse o respeito pela família do qual os fundamentalistas tanto falam?

Em 02 de novembro, um ilustrador francês, que estava a negócios em São Paulo, teve um osso da face fraturado ao ser espancando com um soco-inglês, enquanto simplesmente andava pela Rua Augusta. O turista, heterossexual, naquele momento sofria o azar de ter sido confundido com um homossexual.

Esta é a igualdade na qual estamos amparados pelo artigo 5º da nossa Constituição Federal e que ainda nos garante a inviolabilidade do direito à liberdade e segurança?

Os exemplos nos alertam para uma realidade alarmante. Em pouco tempo, vivenciaremos a instauração de uma ordem em que toda a afetividade será castigada. Cada um será responsável por monitorar o seu próximo e, na dúvida, execute a repressão com suas próprias mãos.

Meus amigos, eu vos pergunto: essa é sociedade que queremos?

O movimento LGBT brasileiro é unânime ao pedir prioridade na aprovação do Projeto de Lei da Câmara 122 em sua totalidade, para que a homofobia seja combatida no momento de sua ação, tipificando o crime e identificando os que a praticam. Não aceitamos negociar a atenuação da pena, pois estamos cansados de contar aqueles que perdemos a cada ano. Assim, queremos o PLC 122 abrangente aprovado!

Mas neste ano, ampliamos a reivindicação. Recentemente, de forma leviana, parlamentares conservadores e lideranças religiosas propagaram mentiras sobre o Projeto Escola Sem Homofobia, também chamado, ao bel-prazer da mídia, ora de “kit gay”, ora de “kit anti-homofobia”.

Assistimos a esses senhores, que se auto intitulam “servos do Senhor” ou “defensores da moral”, enganarem a população descaradamente, fazendo com que profissionais da imprensa e, até mesmo, membros do poder executivo, fossem usados como massa de manobra.

Disseram e continuam a reiterar que o material seria entregue para crianças do ensino fundamental a fim de induzir a homossexualidade, o que é um grande absurdo. Alguém aqui teve ou conhece alguém que tenha a formação de sua orientação sexual induzida?

Fazemos questão de esclarecer que o os kits servem exclusivamente para a capacitação de professores do ensino médio, com o objetivo de prepará-los para lidar com a diversidade e promover o respeito entre os alunos.

A escola vem sendo omissa quanto ao seu principal papel, que é a formação da cidadania e senso de justiça. O ambiente escolar deve ser um espaço inclusivo, de vanguarda, que quebre paradigmas e seja ponto de reflexão sobre novas concepções morais.

O momento é de escolha. E a nossa é pela formação de novas gerações que acolham as diferenças e vivam sob a ótica da equidade. Queremos uma escola sem homofobia, já!

Convocamos a toda a população para ocupar conosco o nosso já tradicional espaço de grito, símbolo do progresso e cosmopolitismo dessa cidade: a Avenida Paulista.

Não abriremos mão de celebrar o Orgulho que nos move, de exercer livremente nossas identidades, de não mascarar nossos afetos e de, principalmente, resistir à opressão diária daqueles que insistem em amputar nossa dignidade em vão.

Festejamos porque nós, brasileiras e brasileiros LGBT, não temos motivos para nos envergonhar. Aqueles que discriminam, esses sim, carregam consigo o peso em seus travesseiros.

O preconceito fere a vítima, mas, acima de tudo, excluiu do agressor sua principal virtude: a humanidade. A homofobia tem cura, é a educação e a criminalização!

O documento foi lido pelo presidente da APOGLBT, Fernando Quaresma, durante a entrevista coletiva de apresentação do 16º Mês do Orgulho LGBT de São Paulo, no dia 22 de maio de 2012.