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Instituições lgbti nacionais repudiam omissão do Brasil em assinatura do plano de ação lgbti+ no Mercosul

Genilson Coutinho,
23/10/2020 | 23h10
Foto: reprodução

As instituições que assinam coletivamente essa nota vem a público chamar atenção da população LGBTI+ brasileira, assim como pesquisadores/ras, aliados/das, legisladores/ras e membros do judiciário, executivo e demais áreas de defesa dos direitos humanos que o BRASIL RECUSOU O USO DOS TERMOS IDENTIDADE DE GENERO, EXPRESSÃO DE GÊNERO E CRIMES DE ÓDIO contra a população LGBTI+ no plano de trabalho discutido em reunião na Comissão Permanente de Pessoas LGBTI com as mais altas autoridades em direitos humanos do MERCOSUL divergindo de países como Argentina, Uruguai e Paraguai sobre o tema.

É estarrecedor que no mesmo ano em que houve um aumento próximo de 70% nos casos de assassinatos de travestis e mulheres trans entre os meses de janeiro e agosto de 2020, em relação ao mesmo período do ano passado, o Brasil tome tal decisão ignorando que o Transfeminicídio é o assassinato sistemático da população trans motivado pelo ódio e repulsa à identidade e expressão de gênero. As pessoas trans são mortas por expressarem uma identidade de gênero divergente daquela que lhe foi imposta no nascimento e por fazerem isso publicamente. ,O Brasil segue triste liderança dos assassinatos contra pessoas trans no mundo nos últimos dez anos, sem que o estado brasileiro tenha tomado qualquer iniciativa para combater essa violência.

Na mais recente versão do Atlas da Violência, publicado pelo Fórum Brasileiro da Segurança Publica, fica nítido o descaso dos estados brasileiros com relação a vida das pessoas trans, quando percebe-se que 15 deles não fazem sequer levantamento de dados sobre violência lgbtifóbica e nenhum dos 26 estados mais o Distrito Federal trouxeram dados sobre assassinato das pessoas LGBTI+. Demonstrando, portanto, que a subnotificação e a negligência com a violência LGBTIfóbica segue presente no modo de atuação do governo.

O atual governo brasileiro não reconhece a cidadania da população de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, mulheres transexuais, homens trans e intersexos (LGBTI), pois além de não destinar recursos, ações e projetos em defesa da população LGBTI+, tem trabalhado incansavelmente para negar o seu acesso a direitos básicos, promovendo retrocessos nas conquistas de políticas pró-LGBTI.

Esse retrocesso e negação de direitos se vê especialmente o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, que em sua gestão não promove políticas de enfrentamento a violências LGBTfóbicas e/ou de gênero – que vêm aumentando desde o inicio de sua gestão -; deslegitimando as evidências de vulnerabilidade desta população, além de extinguir as políticas públicas e canais de participação social que buscavam assegurar e reconhecer sua cidadania plena.

Entendemos que a gestão em vigor contraria os princípios consolidados no Estado democrático de direito e fere o artigo 5º da Constituição. Além disso está em desacordo com diversos tratados internacionais dos quais os Brasil é signatário, como os princípios de Yogyakarta, os princípios da Corte Interamericana de Direitos Humanos na Opinião Consultiva Nº 24, que tratam dos temas de identidade de gênero e a não discriminação de casais do mesmo sexo (CIDH, 2017), bem como as recomendações da própria ONU na defesa da população LGBTI.

Compreendemos que a omissão diante dos temas propostos na reunião da Comissão Permanente LGBTI+ na reunião do Mercosul estão relacionadas às inúmeras declarações LGBTIfóbicas, machistas e/ou racistas do Presidente e agentes do seu governo, bem como da própria Ministra Damares Alves, que disseminam, legitimam e autorizam diversas formas de violência contra a população LGBTI+. Identificamos correlações entre as declarações de ódio por parte do governo e o aumento dos casos de violências LGBTIfóbicas, assim como o uso do sintagma “ideologia de gênero” buscando fomentar pânico, medo e estigmas em relação à população de travestis e transexuais.

Vale ressaltar que a cada 48 horas uma pessoa transexual é barbaramente assassinada no Brasil e que nesse ano já temos mais casos que no ano de 2019 inteiro, ultrapassando 140 assassinatos. Ainda, segundo as mais recentes estimativas, acumulamos 82% de exclusão escolar de travestis e transexuais, panorama que aumenta a vulnerabilidade dessa população e favorece os altos índices de violência que estamos expostas no trânsito do dia-a-dia exatamente pelo ódio a nossa identidade de gênero. Não há como discutir um enfrentamento eficaz da violência especifica que essa população sofre sem nomeá-la ou instrumentalizar agentes do estado para termos dados sobre como a violência tem vitimado a população trans brasileira.

Fica nosso repudio público as inações e omissão do Ministério da Mulher, Família e Direitos humanos, que tem usado seus funcionários para se opor aos avanços das conquistas de direitos da população LGBTI+ e aqui repudiamos explicitamente aqueles que estiveram representando o Brasil na referida reunião assumindo o lado contrário da defesa dos direitos humanos da população trans, sendo eles: Marina Reidel – Diretora de Promoção de Direitos LGBT, Vitor Marcelo Almeida – Assessoria Especial de Assuntos Internacionais, Douglas Rodrigues – Coordenador de Assuntos Internacionais, do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, e Daniel Leão da Divisão de Direitos Humanos do Ministério das Relações Exteriores.

Enquanto o sangue das Travestis, mulheres Transexuais, Homens trans e demais pessoas trans está nas mãos de vocês, seguiremos resistindo a vocês e a eles!

Brasil, 22 de outubro de 2020.

Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA)

Associação Brasileira LGBTI (ABGLT)

Fórum Brasileiro de Travestis e Transexuais Negras e Negros (FONATRANS)

Rede Nacional de Operadores de Segurança LGBTI+ (RENOSP-LGBTI)

Instituto Brasileiro de TransMasculinidades (IBRAT)

Conselho Nacional Popular LGBTI+

Liga Brasileira de Lésbicas (LBL)

Articulação Brasileira de Lésbicas (ABL)

Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação (CNTE)

Rede LésBi Brasil

Articulação Nacional de Psicólogas e Psicólogos LGBTI – ANP LGBTI

Central Única dos Trabalhadores (CUT)

Rede Nacional de Lesbica, Trans e mulheres Bissexuais na Promoção a Saúde e Controle social para Políticas Públicas (Rede Sapatà)

Diretoria LGBT da UNE

Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil CFOAB

GT 23 da ANPEd

Articulação Brasileira de Gays (ARTGAY)

Movimento sem Terra

Rede Afro LGBT

Associação Brasileira de Intersexos (ABRAI)