Marcelo Cerqueira na Sala VIP

Genilson Coutinho,
06/09/2011 | 19h09

Marcelo Cerqueira nasceu em Salvador, em 12 de maio de 1967. É historiador, articulador e ativista pelos Direitos Humanos. É também presidente do Grupo Gay da Bahia (2007), uma das mais antigas organizações LGBT ainda em funcionamento no Brasil. Foi também um dos idealizadores da Parada Gay da Bahia, que está em sua décima edição.

A próxima Parada Gay da Bahia acontecerá no domingo, 11 de setembro. Com concentração a partir das 11h da manhã, a Parada tem previsão de começo às 15h.

Dois Terços: São 10 anos de historia e luta da Parada Gay de Salvador. Quais foram os ganhos para o movimento LGBT ao longo destes anos com a realização da Parada Gay?

Marcelo Cerqueira:  É, são dez anos! Muitos avanços sim. Na verdade, são ganhos de bens simbólicos, aqueles que interferem na mudança de pensamento das pessoas em relação aos LGBT na cidade. A cada evento, o GGB promove um tsunami de informações e conceitos na cidade com base no tema da Parada. Mudar conceitos é difícil, mas quebrou não tem mais jeito. O ganho é individual de cada gay que vai para o evento pela primeira vez e vê que não está só, que existem vários iguais a ele, o ganho é o primeiro beijo, o encontro com o outro e consigo mesmo em relação à homofobia interna.

DT: Este ano, o GGB resolveu entra na briga pelo patrocínio com as empresas privadas no que apoio para 10ª Parada Gay de Salvador . Existe alguma campanha preestabelecida contra essas empresas? 

MC – Contra não! Mas de sensibilização ao empresariado que acaba vendo esse publico apenas pelo viés do sexo. Esquece que a gente consome seu serviços e produtos. Não tem explicação a não ser o preconceito que empresas com tradição em apoio a eventos populares como Ambev, Vivo, Bradesco, GVT, OI se recusem a apoiar a causa da diversidade. Também vai o toque para Caixa Econômica, Banco do Brasil e a bilionária Petrobras, que fazem editais até para aniversario de poodle de madame, mas não fazem para promover eventos da diversidade cultural. Isso tem de mudar e não deve ser apenas uma luta nossa e sim de todos os produtores do gênero.

DT: Luiz Mott convidou a militância para a construção da Parada Gay deste ano. Como foi essa nova experiência?

  MC: Foi uma experiência, eu sabia que não ia gerar como não gerou. Mas Mott é como Moises, prega até no deserto. Tivemos a primeira reunião e a segunda não houve quorum, aí tocamos o piloto automático, porque é preciso responsabilizar e cobrar resultados de alguém sobre determinadas coisas. O que posso entender é que as pessoas estão envolvidas em suas demandas pessoais e a Parada requer tempo e determinação para que as coisas aconteçam, muito desse tempo é doado por nós da organização.

DT: Muitos gays não vão às paradas, pois acreditam que tudo virou um grande carnaval diante do crescimento do evento e das paradas em bairros da grande Salvador. Como isso tem sido trabalhado?

 MC: Quem não vai é gay chato. Melhor, essa critica é reflexo da homofobia interna. Vamos fazer uma Parada sem trio só com mega fone e chamar todos esses gays que dizem que não vão à Parada porque é carnaval. É carnaval de gente LGBT e simpatizante na rua, embalado com música de nossa cultura e símbolos de nosso meio sócio-cultural.  Esses gays homofóbicos têm medo é do espelho. Eles não sabem que parada é Bacante, festa de Baco, deus da embriaguês, divino da sexualidade. Parada é carnaval sim, porém com a lógica revertida. Isso é pensamento de gay burguês que pensa como menina moça. Mas, pensado melhor, queria nós que a Parada fosse um verdadeiro carnaval, o Brasil pára para o carnaval passar, o povo recebe a entidade do folião, tudo fica normal, a calcinha sai de calça e a cueca sai de saia, isso é glorioso.

DT: Diversas ações estão na programação do dia 11 de setembro nos trios e no palco principal. No decorrer da semana, haverá alguma programação?

 

 MC: A Parada faz gerar a cena gay de Salvador, sem dúvida. Diversos eventos paralelos estão sendo divulgados. As duas principais boates de Salvador, San Sebatian e OFF Club têm dois eventos poderosos e também a Tropical trouxe de São Paulo Silvetti Montyla, que também promete barbarizar. Nós pensamos em algo público e de graça, queimamos pestanas para fazer uma semana inteira de festival de artes, teatro, música e dança no Passeio Público. O projeto ficou em R$ 55.000,00. Como não conseguimos patrocinadores, tivemos de abortar e focar na Parada em si. Mas, no próximo ano, essa semana vai ter que gerar, sem dúvida. Também fazer a Parada e a Semana Cultural é muita coisa. Só o evento já consome uma energia enorme. Nessa segunda, vamos promover um dia de vacinação para hepatites virais na sede do GGB. Quem tem vida sexualmente ativa deve se vacinar e não relaxar a camisinha.

DT: A campanha da 10ª ganhou as ruas, redes sociais e a TV, porém algumas lideranças não concordam com o modelo branco na campanha. Essas questões já foram resolvidas?

MC: Não temos nada para resolver em relação a isso. A crítica é porque gerou o impacto. Eu acho que os críticos dessa ação deveriam ser mais atuantes dentro do movimento negro para diminuir o homofobia dos negões “além de preto viado!” O nosso movimento não é racialista, mesmo que pese estarmos em Salvador. No nosso recorte, entra a denuncia do racismo sim, mas não focamos somente nisso. Se você me perguntar se eu sofro preconceito por ser negro ou gay, eu respondo que por ser gay. Para homossexuais, a homofobia é tão violenta que a cor é um detalhe. Mesmo que simbolicamente ambas possam ser comunicantes. Mostrar um branco com um soco na cara tem mais apelo que mostrar um negro nas mesmas condições, o foco para o branco é maior. Isso é publicidade, quem faz a critica não entendeu nada do que a gente disse. Então, mon chou! Que não pesquisou, não tem direito a falar, como diz minha amiga Monalisa, mi dispiace!

DT: Salvador recebe todos os anos muita gente do interior e de vários  estados do Brasil. Como estão as questões de segurança este ano?

MC: A pessoa que vai para eventos populares deve ter clareza do que levar nessas ocasiões. Deve cuidar de si e dos amigos porque ninguém está imune de sofrer algum tipo de violência que pode ser furto ou mesmo agressão. Então é prudente não levar carteira com cartões de credito, e equipamentos. E, se levar, redobrar a atenção ou usar bolsas com segurança para poder ficar tranquilo e aproveitar a festa. Vamos ter um efetivo policial de mais de mil homens no circuito, nos terminais de transbordo, nas transversais do circuito, iluminação especifica e três carros presídios da Policia Civil para prender vagabundos que forem atazanar a vida da gente no dia da festa.

DT: O governo Jaques Wagner tem feito muito pouco pela comunidade LGBT na Bahia. Você não acha isso estranho para um governo que se diz de todos nós?

MC: A Parada tem apoio do Governo da Bahia, essa foi a nossa luta para que as empresas entrassem nesse momento, isso para dar mais autonomia ao evento e credibilidade junto à sociedade. Apoio do governo é quase que obrigatório, mas também eles dão se quiser. O Governo Jacques Wagner é um governo de participação, a gente tem brigado para a instituição de nossas agendas, que são: a instituição do Conselho LGBT do Estado, a instituição de uma estrutura dentro do governo com recursos para combater a homofobia. Agora, o Governo já deflagrou a instituição da segunda conferência estadual LGBT e diverssa territoriais estão já com datas programadas. Não temos muitas conquistas ainda, mas temos canal aberto com o galego e vários secretários para o debate e o apoio. Acredito que dias melhores virão, vamos reencantar o governador e ajudar fazer essa Bahia de todos nós sem homofobia.