GGB elabora CÓDIGO DE ÉTICA DAS TRAVESTIS PROFISSIONAIS DO SEXO

Genilson Coutinho,
11/02/2011 | 04h02

As travestis estão sempre repetindo: “As inocentes pagam pelas culpadas!” Esta  é a verdade: quando uma mona  apronta na pista, todas suas colegas ficam ameaçadas, pois a polícia e os clientes descontam nas inocentes. E ninguém é otário de pagar pelo que não deve! Quantas travestis já apanharam, levaram tiro, foram presas, foram assassinadas, simplesmente porque eram parecidas com a verdadeira culpada!

Travesti não é sinônimo de marginalidade. Embora a grande maioria das travestis e transexuais vivam como profissionais do sexo, travestismo também não é sinônimo de prostituição. Cada um exerce a profissão que quer, e vender o próprio corpo não é crime. Crime é explorar a prostituição (cafetinagem), ficar nua ou manter relações sexuais em locais públicos, transar com menores de 18 anos, traficar drogas. Crime é crime, e nós, cidadãos e cidadãs travestis e transexuais homossexuais não podemos apoiar delinqüentes que prejudicam nossa imagem já tão discriminada.

Portanto, para que as transexuais e travestis do bem e todos os demais homossexuais  não sejam inculpados nem paguem pelo mau comportamento das transgêneros baixo astral, é indispensável que exista um CÓDIGO DE ÉTICA que seja divulgado e seguido no Brasil inteiro, pois assim todos saímos ganhando: as transexuais, travestis,  gays e lésbicas de bem, não serão  rotulados e tratados como marginais;  as próprias transgêneros que costumavam “aprontar”,  deixarão de ser alvo de perseguição policial e vingança dos clientes, tornando-se verdadeiras profissionais do sexo e não marginais disfarçados de mulher; os moradores e transeuntes das ruas deixarão de ser molestados pela presença inconveniente das baderneiras. “Ética”  significa “boa maneira de agir”, “conduta correta” e este código de ética oferece  “dicas de como se comportar”, aplicando-se a qualquer profissional do sexo: travesti, transexual, prostituta, michê, rapaz de programa, etc, etc. Compete às próprias travestis e transexuais, aos grupos organizados de translesbigays e à comunidade homossexual em geral discutir, zelar e fazer cumprir este CÓDIGO DE ÉTICA pois não é justo e não aceitamos mais que “as inocentes paguem pelas culpadas!” [Esta é uma versão experimental, à espera de críticas construtivas e sugestões. Favor enviar seus comentários e acréscimos para luizmott@ufba.br

1.                  RESPEITE O AMBIENTE. Do mesmo modo como qualquer pessoa tem o direito de ir e vir livremente e exercer qualquer profissão sem ser molestado,  assim também ninguém pode ter a calçada e jardins de sua casa invadidos, sua tranqüilidade ameaçada por profissionais do sexo barulhentas, que fazem suas necessidades fisiológicas na frente de residências. Defecar, urinar, jogar camisinha usada, sujar calçadas e  jardins de casas residenciais ou de prédios, gritar, fazer baderna em bairros residenciais, é grave desrespeito à tranqüilidade pública, devendo ser rigorosamente evitado. Do mesmo modo como queremos respeito, assim também, devemos dar respeito.

2.                  NÃO USE ARMA. O uso de armas de fogo é ilegal, dá cadeia.  Felizmente é raríssimo o uso de revólver pelas travestis. Pelo contrário: muitas são assassinadas com tiros, isto sim,  crime grave que precisa ser rigorosamente punido. Não leve pra pista  gilete, estilete, faca: se você for encontrada com estes objetos perfuro-cortantes, a polícia pode acusá-la de estar armada, e a situação fica ainda mais complicada. Não agrida  os clientes, as colegas ou os transeuntes com pedaços de pau, pedras, fivelas, cacos de vidro, etc. Isto é crime de lesão corporal.  (Código Penal, Art.262)

3.                  USAR DROGA É CRIME. Muitas profissionais do sexo só conseguem enfrentar  a barra do  “pistão” estando “colocadas”. Uma dose de bebida alcoólica provoca alegria, desinibição, mas se ultrapassar os limites, a profissional do sexo bêbada  ou drogada fica muito mais vulnerável, faz coisas que se estivesse sóbria não arriscaria fazer. Pior ainda quem consome maconha, cocaína, craque e demais drogas ilícitas, pois esquece de praticar sexo seguro, pode ficar agressiva ou lesada demais e se meter em confusão. Nunca ultrapasse o seu limite quando estiver “colocada”. Usar droga na rua ou traficar entorpecentes são crimes graves: não caia neste esparro!  (Código Penal, Art. 281/284)

4.                  ROUBAR CLIENTE É CRIME GRAVÍSSIMO. Muitas travestis foram espancadas, presas, assassinadas por engano, pagando inocentemente pelo roubo de monas assaltantes. Roubar a carteira, jóias, relógio, celular, talão de cheque, cartão de crédito, etc do cliente ou de motoristas nos cruzamentos das ruas, é crime gravíssimo, dá cadeia. Entrar a força dentro do carro de desconhecidos, arrancar a chave do veículo, jogar pedra no vidro do carro dos clientes é tão grave quanto o crime dos boyzinhos que jogam pedra, foguetes e agridem travestis na pista. Lugar de bicha ladrona é na cadeia. Não adianta inventar que o cliente não quis pagar… esse golpe já é manjado! (Art.204, Código Penal).

5. ACERTAR ANTES TODOS OS DETALHES. Antes de comprar ou consumir uma mercadoria a gente pergunta o preço. Antes de contratar um serviço, combinam-se todos os detalhes. Muita confusão pode ser evitada, se a profissional do sexo acertar todos os detalhes antes da transa: o que faz e o que não faz, o tempo disponível, o preço de cada serviço prestado. Acertado o preço, caso o cliente queira ir além do combinado, a melhor solução é dizer claramente: “isso está fora do combinado: custa tanto a mais!”. Se ele concordar em pagar o novo preço, ok; se não, limite-se ao que foi combinado. A melhor maneira de ganhar o cliente é com jeitinho, com delicadeza. Acertando antes todos os detalhes, evita-se confusão.

6.                  NÃO BRIGUE COM AS COLEGAS. Há casos de travesti que agrediu violentamente a outra simplesmente porque a novata ficou dando close ou porque jogou o cabelão  na cara da mona despeitada. Há travestis que fazem máfia, extorquindo pedágio, cobrando multa das novatas no pedaço. A rua é pública e não seja otária de pagar para compartilhar o mesmo espaço com outras profissionais do sexo. Se alguém quiser cobrar pedágio ou multa, tente conversar, se una  às outras monas para acabar com essa exploração. Procure ser companheira e solidária com as demais  colegas pois a união faz a força! Evite  briga, fofoca, tirania, pois unidas somos mais fortes para enfrentar nossos verdadeiros inimigos. Nas cidades e estados onde já existe Associação de Travestis e Transexuais, participe das reuniões deste grupo. Se ainda não  existe onde você vive, escreva ou telefone para a ANTRA (Articulação Nacional de Transgêneros) para tentar fundar um grupo em sua cidade. antrabrasil@hotmail.com Unidas somos mais fortes!

7.                  ULTRAJE PUBLICO AO PUDOR. Andar nua em lugares públicos ou praticar atos obcenos na rua é crime  (Art.233 do Código Penal). Mostrar os peitos, a neca, o bumbum vai contra os chamados “bons costumes” (apesar de se tolerar  cenas de nudez na televisão e no carnaval!). Muitas travestis dizem que os clientes querem ver a “mercadoria” antes de acertar o negócio. Neste caso, seja discreta, tome cuidado para não escandalizar aquelas velhinhas ou donzelas de família das redondezas, pois podem denunciar aos policiais ou na delegacia que as monas estão fazendo orgia sexual na sua calçada. O melhor lugar para transar é em motéis, pensões, hotéis ou “privê”. Não corra o risco de ir para terrenos baldios, casas em ruína ou em  construções, atrás de árvores, nos becos escuros, mesmo dentro do carro, pois assaltantes ou policiais podem infernizar a vida dos incautos. Se for ameaçada ou presa por estar transando dentro de um carro num lugar escuro, tente justificar para o policial que se não houve denúncia de terceiros, e se estava em local escuro, sem movimento de gente, a lei não considera crime.

8.                  ESCRAVIDÃO JÁ ERA! Não seja idiota de se submeter a tirania de machão, bofe, marido ou amante violentos. Ter  um companheiro pode trazer segurança, apoio emocional, sexo gostoso dentro de casa. Mas não se sinta obrigada a entregar pra ninguém o “aqué” que custou tanto você ganhar. Seja sempre a dona da situação, faça o bofe comer na sua mão, não aceite jamais ser humilhada,  espancada, nem roubada por ninguém. Muitas morreram assassinadas por seus amantes violentos. Mas também não humilhe ou discrimine seu parceiro pois mesmo que ele não assuma, todos que transamos com o mesmo sexo somos homossexuais, e esta história de que seu macho é “homem de verdade” é pura balela, pois se existe tanta mulher no mundo e ele fica de tesão por você, é que também gosta do babado.

9.                  SE AFASTE DOS MARGINAIS. “Quem com porcos se mistura, farelos come”, costumam repetir as monas da Bahia. Minha avó dizia: “diga-me com quem andas, que direi que és!” Certíssimo. Ser travesti, fazer prostituição, não é crime. É legal ser homossexual. Crime é roubar, matar, traficar droga, praticar agressão física, extorquir, explorar a prostituição alheia. Ladrões, assassinos  e traficantes são criminosos perigosos pois você pode ser a próxima vítima, e se tem amizade com essa marginália, algum dia seu nome vai chegar no ouvido dos policiais e você estará em maus lençóis. Portanto, evite se marginalizar pois estará  evitando  ser perseguida e presa, sendo inocente.

10.            NÃO DESPREZE OS CLIENTES. Do mesmo modo como você não gosta de ser chamada de traveco, homem de saia, rapaz de peito, também os gays, seus clientes, não querem ser chamados de  maricona nem de tia velha. Estes são termos que humilham. Se o cliente te humilhou, esnobou, seja inteligente e superior: demonstre que todos devem ser respeitados, que também ele é desprezado pela sociedade, que temos de ser solidários e respeitar uns aos outros. Não use termos racistas  para se referir aos negros, deficientes físicos, idosos, pois tais insultos podem ser punidos  com a prisão. Racismo é crime inafiançável! (Artigo 140 do Código Penal)

11.            CAFETINAGEM, TÔ FORA! Explorar a prostituição, sobretudo de menores de 18 anos, é crimes gravíssimo (Art.231 Código Penal). Manter casa de prostituição e explorar profissionais do sexo, dá cadeia. Não seja otária vivendo como se fosse escrava da cafetina ou da dona da pensão.  Se ao chegar numa cidade nova for ameaçada pela mona que se diz dona do pedaço, exigindo pagamento,  procure conversar educadamente, argumentando que não tem condição de pagar, que o sol nasceu prá todos  e precisa integralmente  do dinheiro que ganha para se sustentar. Se a cafetina impor como condição alugar vaga na  casa dela para ficar livre do pedágio, e se você prefere morar em outro lugar, então procure a associação de travestis de sua cidade ou estado para que ajudem você a resolver essa opressão. Todo cuidado é pouco nessas situações, pois há casos de cafetinas violentas que mandam espancar as monas que não se curvam a seus caprichos e tiranias. Estas diabas devem ser denunciadas e erradicadas no nosso meio.

12.            SILICONE PODE MATAR! Quantas monas você conhece que ficaram deformadas e se arrependeram terrivelmente de ter botado silicone? Quantas você conheceu que morreram devido a zebra na aplicação do silicone? Você decide se quer se submeter a esta roleta russa: em vez de ficar linda, pode dar azar e sofrer lesões horríveis e até morrer. Há várias cartilhas que ensinam a diminuir esses riscos: “Silicone: Redução de danos para travestis”. (GGB/ATRÁS) Muitas e muitas travestis e transexuais  se arrependem amargamente de ter exagerado na dose. E cada vez mais os clientes estão gostando de mulheres menos exageradas, com corpos menores. Se for aplicar silicone, garanta toda a segurança para que você não seja a próxima vítima.

13.            SEXO SEGURO. Ninguém é idiota de comprar mercadoria estragada. Cada vez mais o mundo moderno exige especialização, limpeza, asseio. A boa profissional do sexo tem sempre em mãos, várias camisinhas disponíveis, gel lubrificante, lenço de papel para se limpar depois da transa. A Aids não brinca em serviço, e qualquer ato sexual com troca de esperma ou secreções sexuais, tem de ser protegido pelo preservativo. Pesquisas revelam que na maioria das vezes, é a mona quem toma a iniciativa e exige o uso da camisinha. Ótimo, ponto a mais para os homossexuais e transgêneros! Não caia na tentação de fazer sexo com risco mesmo se o cliente oferece pagar o dobro. Use camisinha também com seu marido ou no “vicio”, pois a paixão não basta para evitar Aids e demais doenças sexualmente transmissíveis.

14.            NÃO PROVOCAR POLICIAIS. Muitos PMs são agressivos contra gays e travestis porque no fundo têm desejos  homoeróticos mal resolvidos, ou são evangélicos ignorantes e despeitados. A Lei não permite ao policial humilhar, espancar ou prender as profissionais do sexo ou travestis simplesmente por estarem fazendo pista ou vestidas de forma sexy. Embora também a Lei não obrigue ninguém a andar com a carteira de identidade, é melhor estar sempre com algum documento para evitar confusão. Há muita travesti que gosta de enfrentar policiais, xingando, dizendo que são mariconas incubadas, insultando os afro-descendentes com termos racistas. Evite provocar os policiais pois obviamente que nestes confrontos eles sempre são mais poderosos, seja pelo uso de armas, algemas, camburão, etc. Memorize ou anote o nome dos policiais violentos e o número das viaturas que praticarem qualquer discriminação ou travestifobia. Se foi espancada, humilhada ou roubada, vá o mais cedo possível à Delegacia fazer corpo de delito e registrar Boletim de Ocorrência. Denuncie junto aos grupos GLTB de sua cidade!

15.             NÃO TRANSAR COM  MENOR DE IDADE. Cada vez mais o Estatuto da Criança e Adolescente protege os menores de 18 anos, considerando “abuso sexual” transar até com  rapazes  de 17 anos. Manter relação sexual com menores de 18 anos também é considerado crime grave, e o adulto além de ser preso, corre o risco de ser linchado na delegacia ou cadeia. Travestis com menos de 18 anos na pista podem ser levados para a Delegacia de Menores e ficar detidos até completar a maioridade. Explorar a prostituição de travestis adolescentes é crime grave. Portanto, cuidado com os “erês”. É covardia agredir travestis novinhas por despeita de serem preferidas pelos clientes:  se conhecer ou encontrar alguma bicha mirim, ensine a se defender, a fazer sexo sem risco, a ser uma pessoa de bem.

CONCLUSÃO: se você acha que o mundo se divide em dois tipos de pessoas, as espertas e os otários, e se considera ser “a rainha da cocada branca ou preta”, doutora em da malandragem, saiba que está redondamente enganada, pois cada vez mais todo mundo está se cuidando, correndo atrás de seus direitos, exigindo respeito. As travestis, transexuais, michês, prostitutas, gays e lésbicas também estão cada vez mais organizados,  exigindo cidadania plena como os demais cidadãos. Se queremos respeito, temos de dar respeito e respeitar todo mundo. Esse CÓDIGO DE ÉTICA  pode parecer duro, mas o que aqui está descrito é a pura realidade, não adianta querer esconder o sol com a peneira e esconder o lixo debaixo do tapete. Procure discutir com suas colegas essas sugestões e adotar comportamentos que não comprometam sua pessoa nem  nossa categoria, pois não é justo que  as inocentes paguem pelas culpadas.

CÓDIGO DE ÉTICA DAS PROFISSIONAIS DO SEXO SEGURO

Fonte:  adaptação a partir da Cartilha da Associação Goiana de Gays, Lésbicas e Travestis

1.     Não trabalhar colocada pois estando bêbada ou drogada, fica fora de controle, muito mais frágil  para enfrentar agressões e para evitar sexo com risco

2.     Ter sempre diversas camisinhas e gel lubrificante na bolsa.

3.     Não sair com menores de 18 anos

4.     Não andar com drogas e com armas (gilete, estilete, revólver)

5.     Não ficar nua na rua, com a bunda, a neca ou os peitos de fora

6.     Negociar sempre antes com o cliente: o preço, o tempo e o que vai fazer no programa.

7.     Denunciar junto ao grupo homossexual local ou na polícia toda  violência, discriminação e  preconceito.

8.     Não insultar com desprezo, falar mal, maltratar ou roubar os clientes

9.     Nunca dar a Elza, nem nos  clientes nem as colegas. Seja honesta sempre.

10. Evite depender de cafetina ou ser cafetina. Não seja dominada por marido ou bofe algum.

11. Não puxe a chave do carro do cliente pois é crime de extorsão.

12. Denuncie as colegas que estão roubando. Elas prejudicam a sua profissão e atraem a policia.

Fonte: GGB

Foto: reprodução