Dois Terços na 15ª Parada Gay de São Paulo

Genilson Coutinho,
26/06/2011 | 18h06

A tradicional entrevista coletiva que abre a Parada do Orgulho LGBT de São Paulo, revelou um declaração explícita de apoio ao movimento pelos direitos humanos dessa população, em meio a tantos ataques fundamentalistas. A presença das principais personalidades das diversas instâncias governamentais e sociais mostrou um avanço significativa, no ano em que o APOGLBT se propos a promover um diálogo inter-religioso com o tema “Amai-vos uns aos outros: Basta de homofobia!”

O presidete da Associação da Parada do Orgulho LGBT de São Paulo (APOGLBT), Ideraldo Beltrame, destacou as novidades dessa Parada, como a busca de um diálogo com as religiões, por meio do tema. “Trazemos na identidade visual o simbolo do masculino e do feminino que se misturam, pois eu, como gay, fui criado por uma familia que me ensinou a ser machista e tenho que olhar para minhas companheiras, feministas, lésbicas, travestis e transexuais que ainda são mais fragilizados nessa luta”, disse, citando a luta por garantir os direitos para esse setor do movimento.

“Montamos essa mesa para colocar o compromisso que cada esfera de governo tem com nossa população. Não vamos arredar pé um só minuto em nossa luta. Nem tentem retroceder um só centímetro contra os poucos direitos que conquistamos”, ameaçou. Ele lembrou que, durante a parada, haverá coleta de assinaturas pela ABGLT para lutar pela criminalização da homofobia, por políticas públicas e por uma escola sem homofobia.

Quebrando o protocolo, a cantora Preta Gil brincou ao se apresentar como travesti e transexual operada pela natureza. Ela foi escolhida diva da Parada, por sua defesa inconteste de LGBT na mídia, contra ataques sofridos. “Sou filha do tropicalismo e da liberdade. Meu pai e minha mãe foram presos e torturados por lutar pela liberdade. Sempre fui militante desta causa e estou aqui pra me juntar e dizer que queremos respeito, comemorar o que conseguimos conquistar até hoje e continuar a lutar pela criminalizacao da homofobia. Espero poder participar da parada sempre mesmo sem ser diva”, disse Preta.

Religiosos contra a homofobia

Entre os presentes, foram simbólicas as palavras de Anivaldo Padilha, da Frente de Religiosos Contra a Homofobia. Em sua opinião, os segmentos religiosos têm grande responsabilidade pelo fortalecimento e perpetuação da homofobia no Brasil. “Temos mostrado, nos últimos anos, que a luta contra a homofobia também tem tido reflexos positivos nas igrejas”, salientou ele, lembrando que haverá um bloco de religiosos contra a homofobia nesta parada.

 

Ele enfatizou que não fala em nome de igrejas, mas de segmentos grandes de crentes episcopais, metodistas, luteranos, batistas, católicos, anglicanos, e de outros campo religiosos, especialmente de matriz afrobrasileira, unidos em torno da luta contra todas as formas de intolerância que possam surgir.

Em sua opinião, a comunidade LGBT é formada por cidadãos e cidadãs brasileiros que devem ter acesso pleno a direitos. “Precisamos demontrar solidariedade pelas agressões simbólicas ou físicas, especialmente aquelas praticadas por líderes religiosos”, disse.

Padilha declarou que vai unir esforços a outros setores da sociedade que lutam pelo fortalecimento do estado laico, expressa publicamente apoio ao PLC 122/06 relatado pela senadora Marta Suplicy. “Queremos mostrar que as igrejas estão divididas e não representam a unanimidade dos religiosos sobre o assunto. Essas lideranças homofobicas provocam divisões dentro das igrejas e dividem nossos fiéis. Nao têm o direito de demonizar nenhum segmento da sociedade e colocar o conceito de pecado a toda a sociedade e transformá-lo em lei. Na teologia cristã, o maior pecado é não amar ao próximo”, concluiu.

Abertos ao diálogo, fechados ao retrocesso

O presidente da ABGLT, Toni Reis, que representa cerca de 300 grupos militantes de todo país, ressaltou a presença pluripartidária na mesa de abertura da Parada, com politicos do PSDB, PSD, PT e PSOL, mostrando como a causa LGBT pode agregar apoios em todos os segmentos da sociedade. “Estou aqui com meu marido para comemorar o dez a zero contra a homofobia no STF. Temos respeito a todas as religiões e não queremos destruir a família de ninguém. Não queremos fazer guerra santa, mas ser felizes e construir a nossa família do nosso jeito”, disse.

Apesar da celebração, Toni disse que está triste por toda a homofobia envolvendo 260 homossexuais barbaramente assassinados, como mostrou a novela do horário nobre na noite anterior. Ele fez questão de mandar um recado “à nossa querida presidenta Dilma”, que num erro de assessoria, em sua opinião, disse que o kit anti-homofobia do Ministério da Educação fazia propaganda de “opção sexual” (sic). “Não queremos fazer propaganda, mas queremos políticas públicas, como o kit respeito e  antidiscriminação de uma pessoa que sofreu na pele o preconceito, a discriminação, e a tortura”, enfatizou. Ele enfatizou que o movimento é de paz e está nesse diálogo para avançar. “Com o perdão da palavra, estamos de saco cheio de esperar pela criminalização da homofobia. Por isso, senadora Marta, coloque esse projeto para votação o mais rápido possível, porque não teremos consenso. Se o Congresso se omitir, vamos fazer uma Adin e ADPF e vamos ao Supremo, porque o país já provou que tem Justiça”, anunciou Toni.

A senadora Marta Suplicy, lembrada pelo presidente da APOGLBT como a pessoa que pagou a primeira bandeira do arco-iris em 1997, relembrou aqueles momentos. Ela ressaltou como o movimento cresceu e aglutinou apoios, como demonstrou a formação da mesa. Ela disse que chegou a haver uma discussão de que a Parada deveria ser de luto, ensanguentada e amordaçada, devido a 15 anos de poucos resultados. Mas então veio a decisão histórica do Supremo Tribunal Federal. “A conquista no STF não veio à toa, porque aquele projeto, lá atrás, abriu o debate”, disse.

˜Mas o Congresso Nacional, nesses 16 anos, desde que apresentamos o primeiro projeto de lei, se apequenou e se acovadou e nao fez nada para a população LGBT”, disse ela. Mas ela acredita que tem uma maioria de parlamentares simpatizantes que não se manifestam por receio da reação de seus eleitores e que podem ser parte do apoio às demandas LGBT no parlamento. Para ela, uma pequeno minoria se tornou claramente homofóbica com o tempo. “Hoje, vemos crianças pequeninhas que têm horror a homosexual e nem sabem o que é”, lamentou a senadora.

Ela lembrou que, enquanto o Brasil não avança, a Argentina que era considerada muito mais conservadora, agora tem casamento e adoção por parceiros de mesmo sexo. “Enquanto isso, nós temos espancamento na Avenida Paulista, essa é a dura realidade brasileira”, disse. Ela citou os vários avanços nos executivos municipais, estaduais e federal para dizer que os únicos que não ouvem estão no Congresso.

Marta explicou que está lutando para abrir um consenso pela aprovação do projeto contra a homofobia. Ela revelou que os deputados religiosos se empenharam tanto em demonizar o projeto, que agora que chegaram a um acordo têm vergonha de defendê-lo. “O que fazer agora para dizer que o demônio nao é um demônio?” Marta não descartou a hipótese apresentada pela ABGLT de apelar para o Supremo, caso não haja jeito. “Será mais uma vergonha para o Congresso”, disse ela.

O deputado federal assumidamente homossexual Jean Willys considera que o tema da para aponta para a descontrução da homofobia institucional e social por meio do lema do amor, aponta para a discriminação juridica, que apesar da decisão do STF não é um direito conquistado na Constituição e aponta para a necessidade de reinterpretação do texto bíblico. “É importante que esse movimento cresça, porque antes de vermos os assassinatos de tantos homossexuais, vimos a preparação para isso, pois somos alvos de campanhas difamatórias e somos atacados cotidianamente por setores religiosos e politicos”, disse Jean.

Poder público e privado

As autoridades e aliados presentes, como o governador Geraldo Alckmin e o prefeito Gilberto Kassab, assim como os representantes do Governo Federal, saudaram a Parada de São Paulo e a importância dela para a luta por direitos humanos de LGBT. Todos fizeram balanço de suas ações em favor dessa população.

A Secretaria de Justiça e Cidadania do Estado foi representada por Heloisa Arruda, que enfatizou a importância da visibilidade da causa LGBT. “Haverá o dia em que a parada sera apenas um momento festivo, mas hoje ainda não é assim. Essa população precisa ser vista para não ser desrespeitada, como temos visto nesse palco que é hoje da parada, mas testemunhou muitos atos de violência”, disse Heloisa citando os 300 processos de homofobia que atende e que são resultado da visibilidade.

 

Sergio Mamberti e Gustavo Bernardes, representantes do Ministério da Cultura e da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência, respectivamente, mencionaram as inúmeras ações que têm feito para contribuir para luta de LGBT.

 

Ana Telma Sobreira do Monte falou em nome do patrocínio da Caixa Econômica Federal e Vania Santana, compareceu pela quinta vez, representando a Subcomissão da Diversidade da Petrobras, que mais uma vez patrocinou o Mês do Orgulho LGBT. Ambas falaram das políticas internas de valorização de colaboradores LGBT.