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Cientistas criam sementes “especiais” de arroz e soja para combater o HIV

Genilson Coutinho,
17/04/2015 | 10h04

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Segundo a UNAIDS (organismo da ONU para a sida) 35 milhões de pessoas no mundo estavam infetadas com o HIV até ao fim de 2013. Por isso, as investigações para combater a doença continuam. Para impedir que o vírus se propague, é importante usar preservativos, mas uma equipa de cientistas aposta agora numa solução que passa pela soja e o arroz.

Investigadores espalhados por vários países criaram sementes transgénicas com proteínas que neutralizam o vírus da sida. Num estudo, conseguiram produzir o anticorpo 2G12 em sementes de arroz. Este prende-se ao HIV, deixando-o vulnerável para que seja combatido pelo nosso sistema imunológico.

Para modificar o ADN do arroz, os cientistas usam um método chamado biobalística: células e tecidos da planta são bombardeados com microprojécteis de ouro ou tungsténio a 1.500 km/h. Estes levam os genes para transformar o arroz, que então é cultivado em estufas. Assim, a planta passa a ter um ADN modificado, e produz anticorpos contra o HIV.

Esses anticorpos ficam dentro de cada semente. Para extraí-los, é preciso usar um pouco de ciência (o nome técnico é cromatografia de imunoafinidade). A ideia é oferecê-los na forma de um gel que neutraliza o HIV, a ser usado antes de cada relação sexual.

O anticorpo 2G12 é normalmente produzido em células de mamíferos, que são cultivadas em tanques de fermentação. Só que nesse método, a produção é baixa e os custos são altos: não se encontra um tanque de fermentação industrial em todos os países – especialmente não nos mais pobres, que mais sofrem com o HIV.

Ao usar plantas, o custo pode cair em até 95%, e o anticorpo pode ser produzido em massa. O arroz seria cultivado inicialmente em estufas. Estudos anteriores já conseguiram gerar anticorpos do HIV no milho e tabaco, porém em quantidades bem menores.
O estudo teve a participação dos brasileiros Elíbio Rech e André Murad, ambos da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia. Rech é conhecido por criar no país um dos maiores laboratórios-estufa do mundo para pesquisas de transgénicos com fins medicinais; e também por desenvolver as primeiras plantas transgénicas de soja e feijão.

Rech e Murad foram co-autores de outro estudo, também publicado este ano, que usou a soja para produzir uma proteína que neutraliza o HIV. Esta chama-se cianovirina, e é capaz de desativar o HIV, impedindo que este se conete às células do corpo. A proteína é eficaz até mesmo contra o SIV, que causa a sida em macacos.

Para modificar o ADN da soja, os cientistas também usam a biobalística, descrita acima. E para retirar a proteína da semente, é preciso desidratá-la, transformá-la em pó, e depois usar “uma combinação de extracção aquosa, precipitação com etanol e cromatografia”.

Depois deste procedimento, a produção é grande: se a soja transgénica for plantada numa estufa tão grande quanto um campo de futebol, pode gerar cianovirina o bastante para proteger do HIV uma pessoa durante 65 anos, 365 dias por ano.

Os investigadores prometem que a soja também pode ser usada para fabricar óleo, que não contém a proteína anti-HIV. No entanto, Rech diz em comunicado que as sementes transgénicas precisam de ser plantadas em condições controladas de uma estufa, não no campo.
Aqui, a ideia também é criar um gel com a cianovirina, para ser usado antes de relações sexuais. Esse gel já foi usado em macacos, prevenindo a transmissão do vírus da sida.

Rech explicou que o gel é pensado para mulheres, “porque muitas africanas não têm opção da utilização de preservativos pelos parceiros”. Segundo a Embrapa, países em desenvolvimento com elevados índices de sida – especialmente em África – não terão que pagar “royalties” se produzirem a cianovirina dessa forma.

Ambas as pesquisas apostam no conceito de biofábricas ou fábricas biológicas.