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Cantora de pagode é vítima de transfobia na Avenida ACM em Salvador

Genilson Coutinho,
18/10/2021 | 17h10
Foto: Reprodução/ Instagram

Por Jones Araújo

Ir e vir do trabalho pode parecer simples para qualquer pessoa, mas para a cantora de pagode Nathalya Araújo quase virou uma tragédia. Na sexta-feira (16), ela foi vítima de transfobia no ponto em que pega ônibus diariamente. Três rapazes tentaram espancar e apedrejar a jovem, às 13h30, horário de grande movimento na Avenida ACM.  

A artista esperava um coletivo ao lado do restaurante MC Donalds quando outro parou próximo ao local em que ela estava. Os rapazes, passageiros do veículo, então decidiram gritar frases pornográficas para ofender e provocar Nathalya.

A jovem relata que o constrangimento foi grande. Ela então pediu gentilmente respeito, mesmo após ser agredida verbalmente. “É o quê, que você quer, sua travesti?! Ela é uma desgraça!”, gritou um dos agressores de dentro do ônibus.

Não satisfeitos, eles pediram para descer do veículo com o intuito de agredir a moça. Nathalya, ao perceber a movimentação entrou em outro ônibus que havia parado no ponto, mas não foi o suficiente. O coletivo estava parado e os três agressores tentaram entrar no veículo para apedrejar a artista.

“Foi uma cena de horror. Me senti impotente, uma formiguinha, desesperada. Imaginei: é agora que eles vão me matar aqui dentro do ônibus”, disse Nathalya fortemente abalada.

Sororidade

O Brasil é considerado um dos países que mais discrimina e mata pessoas LGBTs no mundo. De acordo com dados do Grupo Gay da Bahia (GGB), a cada 19 horas, uma pessoa LGBTQ+ é morta no país. Segundo a Rede Trans Brasil, a cada 26 horas, aproximadamente, uma pessoa trans é assassinada no país. A expectativa de vida dessas pessoas é de 35 anos.

Na Bahia, o que iria acontecer com Nathalya, caso os agressores conseguissem entrar no ônibus se chamaria de “covardia”. Uma triste ironia, três homens armados, contra uma mulher indefesa. Retrato de um país que mais mata pessoas trans, mas também o que mais consome pornografia de travestis.

Nathalya diz que foi salva “pelas orações que ela fazia em silêncio, enquanto estava agachada no ônibus, ouvindo o barulho das pedradas”. Ela contou também com a ajuda das mulheres do coletivo, que fizeram uma barreira na frente da artista e deram apoio até o ônibus dar partida.

Denúncia e constrangimento

A jovem foi orientada pela empresa em que trabalha a fazer um Boletim de Ocorrência. Ela foi até a Delegacia da Mulher (DEAM), mas apesar da assistência não conseguiu fazer o registro. A DEAM esclareceu que só atenderia o caso se o agressor tivesse algum vínculo com ela, como namorado, pai, marido, alguém da família.

Nathalya então teve que prestar a queixa na delegacia mais próxima ao local do ocorrido, a da Pituba. Lá, ela foi atendida por um policial que pediu para a cantora relatar o ocorrido primeiramente na porta da Delegacia, em pé. Abalada, a cantora passou pelo constrangimento de contar toda a história e só após isso teve acesso ao local.

A artista, que havia explicado que está em processo de retificação do nome e que desejava ser chamada como  Nathalya, disse ao Portal M! que seu desejo foi respeitado pelo policial, no entanto, recebeu o documento ora, tratada no masculino e ora tratada no feminino, tendo o seu nome social identificado no texto do Boletim, como “nome fantasia”.

A equipe do Portal M! entrou em contato com a Polícia Civil, para entender o preparo que os polícias recebem para atender mulheres trans e travestis. Até o fechamento dessa matéria não tivemos resposta. Seguiremos cobrando.

As imagens da câmeras do local também foram solicitadas pela família para ajudar a identificar os agressores.