HIV em pauta

Saúde

Avanço de remédios contra o HIV destrói resistência do vírus ao tratamento

Genilson Coutinho,
29/09/2021 | 09h09

Ao longo de mais de três décadas de pesquisas na área farmacêutica, a resistência aos remédios usados para o tratamento do HIV apresenta queda. Mais que uma boa notícia, novas drogas possibilitam uma melhor qualidade de vida de quem tem o vírus, como a redução no número de remédios ao longo do tempo e dos efeitos colaterais.

Segundo o relatório de Monitoramento Clínico do HIV 2020, do Ministério da Saúde, o perfil de resistência adquirida do HIV aos inibidores da protease (IP) e da transcriptase reversa (ITRN e ITRNN) caíram entre 2009 e 2020. Já os inibidores da integrase (IN) vêm caindo desde 2015 (quando começaram a ser usados).

“Esses são mecanismos diferentes em que o HIV entra na célula da gente, e aí eles atuam em diferentes locais. Por exemplo: a transcriptase reversa atua antes do vírus entrar dentro do núcleo; já o inibidor de protease atua depois; e por aí vai”, explica Lourdes Pinheiro Borzacov, infectologista do Centro de Pesquisa em Medicina Tropical, em Porto Velho.

Na prática, com menos resistência, o vírus encontra cada vez mais dificuldade em causar problemas ao corpo de seu hospedeiro. Tanto que hoje, o tratamento é capaz de tornar a carga viral indetectável —o que impede, por exemplo, que ele transmita o HIV.

Melhora no tratamento é notória

Borzacov conta que o avanço na qualidade dos medicamentos oferta hoje uma melhor qualidade de vida aos pacientes. “Nos anos 1980, o tratamento de HIV era feito com o AZT. Era uma dose alta, tóxica e com baixa barreira genética”, explica.

Hoje, com mais medicamentos disponíveis, se um paciente não tiver o efeito desejado com um remédio, o próprio protocolo já traz uma outra opção terapêutica.

“Antigamente, com o AZT, o vírus se mutava e fazia com que o tratamento não tivesse o efeito desejado. Com o tempo foram surgindo outras drogas, e com isso o organismo começou a combater o vírus para que ele não ficasse com mutação”, pontua.

Os remédios que surgiram atuam em várias classes. “Essas drogas atuam em diferentes locais da célula. Quando o vírus entra no organismo, as diferentes medicações vão atuando em diferentes locais dela”, relata.

Outro ponto positivo é que o avanço da medicação fez com que ela tivesse menos efeito colateral. “Mas isso não tem nada a ver com redução da resistência: efeito colateral é o que o remédio pode causar, como dor no estômago, náusea, diarreia; isso depende de cada medicação. A resistência é a falha terapêutica, isso aí se dá, às vezes, por não tomar o remédio corretamente, tomar irregularmente, e o vírus acaba —diante disso— tendo resistência às medicações”, explica.

Melhora veio com mais remédios

O avanço no tratamento veio após pelo menos três décadas de pesquisas na área. “A gente evoluiu muito na formulação dos medicamentos, e também os estudos que temos de acompanhamento de pacientes possibilitou que fosse voltando a melhor opção terapêutica”, afirma Dennis Armando Bertolini, professor da UEM (Universidade Estadual de Maringá) e doutor na área de microbiologia.

Ele explica que existem quatro classes de medicamentos usados contra o HIV. “Três atuam em cima do mecanismo que o vírus utiliza no processo de replicação; o outro impede a entrada de vírus na célula, age do lado da célula, bloqueando receptores”, diz.

O principal avanço em termos de melhora nos medicamentos veio com a redução de mutações do HIV dentro do corpo do paciente.

“É claro que o vírus ainda fará mutações, mas vai demorar mais tempo. Os remédios atuais são considerados de alta barreira genética e impedem que o vírus tenha mutações de resistência a eles. A evolução mostra que a resistência foi diminuindo porque, quando você trata de forma mais correta, há menos vírus com mutações circulando”, explica.

Bertolini assegura ainda que, com o passar dos tempos, os efeitos colaterais foram também sendo reduzidos, assim como o número de remédios diários para o tratamento.

“Ao compasso que vamos vendo qual é a melhor composição, com medicamentos novos e menos efeitos colaterais, temos uma melhor eficácia e reduzimos efeitos adversos. Não é que as reações colaterais deixam de existir, mas elas reduziram muito”, diz.

A mutação dentro de um organismo, por sinal, é um problema não só para o paciente, mas complica a cadeia de transmissão.

“Antes, o indivíduo estava em tratamento, e com o vírus mutando, o problema era repassado para outro indivíduo, que tinha um vírus com resistência. Isso tornava difícil tratá-lo”, diz.

Para Lourdes Borzacov, com o avanço da ciência, o tratamento de um pessoa hoje contra o HIV, além de gratuito, é seguro e capaz de fazer os pacientes terem uma vida praticamente normal. “O que mata hoje não é mais a doença, mas o preconceito”, sintetiza.

*As informações são do Viva Bem (UOL).