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Ato no vão do Masp marca luta contra sucateamento do SUS e por acesso a tratamento para HIV

Genilson Coutinho,
01/12/2021 | 00h12
Foto: Divulgação

Para marcar o Dia Mundial de Luta Contra Aids, ativistas se encontraram no vão do MASP, em São Paulo e protestaram contra estigma, discriminação e retrocessos na política de aids, além da diminuição do número de testagens devido à pandemia.

Os manifestantes seguraram cartazes com dizeres como “Eu grito por mais verbas no SUS”, “Eu grito pelo não invisibilidade do HIV/aids”, “Eu grito pelo direito ao emprego a  todas as pessoas com HIV/aids”, e usaram o microfone para levantar as principais pautas reivindicadas pelo movimento.

Na avaliação do presidente do Fórum de ONGs/Aids do Estado de São Paulo, Rodrigo Pinheiro, falta muita vontade política para o enfrentamento da aids no Brasil. “Mostramos neste ato que o movimento social de luta contra aids no estado continua forte. Continuamos lutando”, disse.

“Para uma mulher, receber o diagnóstico de HIV é sempre impactante. Seja no início, lá nos anos 80, seja nos dias de hoje. Nos defrontamos com dificuldades e desafios de toda ordem. Seja no âmbito pessoal, seja familiar, social ou de trabalho. Neste momento em que chegamos a 40 anos da epidemia do HIV no Brasil, estamos em alerta. Entre os anos de 2007 a 2020, somos 105 mil mulheres diagnosticadas com HIV”, disse Fabiana Oliveira do Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas.

“Essas mulheres sofrem com machismo estrutural, violência doméstica, obstétrica e de gênero. Violações dos seus direitos sexuais e reprodutivos, além da falta do acesso aos serviços de saúde”, enfatizou.

O coordenador do Movimento Paulistano de Luta contra Aids, Américo Mopaids, usou sua fala para falar que a “política brasileira de aids está na UTI. Já passou da hora da prefeitura ampliar o Serviço de Assistência Especializada, que há anos são os mesmos e estão superlotados, não respondendo às necessidades das pessoas que vivem com HIV/aids.”

“Os pacientes esperam entre 8 meses a um ano por consultas e outros processos. É necessário suporte de qualidade para os profissionais de saúde que atuam na linha de frente e estão exaustos. A Secretaria Municipal de Saúde tem o dever de dar uma resposta ao controle social no SUS e solucionar os problemas na rede municipal especializada em IST/aids”, defendeu Américo.

O deputado federal, Alexandre Padilha também esteve presente no ato. Em sua fala ele destacou que a importância da frente parlamentar na luta contras o HIV e as hepatites virais. “A vai discute hoje projetos de leis que precisam ser votados de forma urgente na Câmara. Temos que fazer pressão porque uma das votações que são urgentes reforça a proteção dos dados e das informações das pessoas que vivem com HIV, aids, hepatites virais, tuberculose e hanseníase. Esse é um projeto que a gente já votou na câmara e a expectativa é votar amanhãno Senado”, disse.

Da Aids Healthcare Foundation, Beto de Jesus trouxe dados relevantes sobre o cenário atual da prevenção e do tratamento. “Há pessoas que estão chegando com seu CD4 abaixo de 350. Em algumas unidades de São Paulo, mais de 60% das pessoas que chegam para tratamento e primeiro atendimento, estão chegando com CD4 extremamente baixo.”

“Muitas vezes a porta da testagem está fechada. A gente vai perceber isso lá na frente, quando a pessoa chegar para o tratamento. Esse é o caso que vemos, por exemplo, em Porto Alegre onde a epidemia deixou de ser concentrada para ser generalizada. Lá, entre mulheres e gestantes os números mostram 2,5% de prevalência. Isso é uma epidemia generalizada. E quando você olha, a maior unidade de saúde do Rio Grande do SUS faz 47 em um mês. Nossas clínicas fazem 50 testes em um dia. Essa é a diferença. Estamos vivendo um momento extremamente crítico”, alertou.

Do Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas, Jenice Pizão falou sobre os desafios para enfrentar a discriminação e o preconceito. “Esses são os grandes vilões para a prevenção, tratamente e para a atenção das pessoas vivendo com HIV/aids. Nós já passamos por diversos momentos de estigma e discriminação velada ou não, que nos fizeram e até fazem, muito mal, dificuldando nosso tratamento”, disse.

“Esses acontecimentos destroem nossa autostima, nos leva à depressão, ao adoecimento e o medo ronda nossos pensamentos. O estigma e a discriminação são tão grandes que muitas pessoas com HIV/aids dsistem de lutar pelos seus direitos e morrem. E qual nosso “crime”? Assim, ficamos no imaginário de que aids é coisa de outro, com o qual ninguém quer se identificar. Por favor, desconstruam pré-conceitos. Vamos viver sem hipocrisias, culpas ou dúvidas”, concluiu.

O infectologista do Hospital Emílio Ribas, Dr. Eder Gatti, foi até a manifestação para denunciar a terceirização dos serviços de saúde. Infelizmente essa realidade de terceirização e desestruturação está atingindo diretamente o Insitituto de Infectologia Emílio Ribas, que sempre foi a vanguarda na assistência aos pacientes que vivem com HIV. Até hoje tem prestado assistência de qualidade às pessoas. Infelizmente a gente vê o Emílio Ribas chegando no limite, e hoje não teremos profissionais suficientes para funcionar em sua totalidade”

“A solução dada pelo governo de São Paulo foi a terceirização e vai dar lugar para organizações sociais e empresas médicas que vão lucrar em cima disso. Estamos denunciando a situação do nosso hospital que é extremamente importante para o HIV e lembrar que defender o Emílio Ribas também é lutar contra aids.”

A diretora da Agência de Notícias da Aids, Roseli Tardelli, também esteve presente no ato e  disse que  “conseguimos viver a pandemia do HIV dentro de outra pandemia. Estamos na resistênicia. Na situação que estamos vivendo hoje e a forma como a situação do mundo inteiro está sendo colocada, é um grande feito a gente conseguir fazer barulho e dizer para as pessoas que o HIV está aí. E nós estamos todos juntos tentando trazer as especificidades que o HIV tem e que não tem sido contempladas em respostas no SUS. Por isso precisamos de muitas vidas e muito fôlego para seguir denunciando e lutando para uma melhor qualidade de vida das pessoas que vivem com HIV/aids.”

A co-vereadora Carolina Iara ressaltou o fato de ser a única parlamenta vivendo com HIV e “isso mostra o tanto de desafio que a gente tem para deter estigma, discriminação, para garantir o direito a saúde e a vida a todos. Essa é uma luta contra o machismo, por justiça social, racismo e uma luta pela saúde de todos. Nós do movimento de aids sempre estivemos nessa luta”.