“Atestado de incompetência” por Luiz Mott*

Genilson Coutinho,
14/08/2012 | 08h08


Com 10 anos de atraso, ao divulgar o Relatório da Violência Homofóbica no Brasil (2011), finalmente, o governo federal cumpre parcialmente o Plano Nacional de Direitos Humanos II, que previa “a coleta e a divulgação de informações estatísticas sobre situações de violência e discriminação praticadas em razão de orientação sexual (2002, Art.240). Não deixa de ser alvissareira tal iniciativa, embora criticável pela demora de sua concretização e algumas dúvidas sobre seu conteúdo. Falamos como experts no tema já que há três décadas, ininterruptamente, o Grupo Gay da Bahia, sob minha coordenação, divulga o Relatório Anual de Assassinatos de Homossexuais, cujos números são todos os anos reproduzidos pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos no relatório internacional sobre direitos humanos.
Em maio, divulgamos o assassinato de 266 LGBT no Brasil em 2011. Dois meses depois, o governo diz que foram 278 mortes. Ficamos decepcionados com tais números, pois, dispondo de ilimitados recursos para pagar os melhores serviços de clippagem, tendo divulgado com estardalhaço a assinatura de convênio com as secretarias d e segurança Pública para enfrentamento da homofobia, é frustrante que o governo tenha localizado tão somente 12 assassinatos a mais do que o Grupo Gay da Bahia, façanha heroica realizada sem recursos públicos e com divulgação de seus resultados com dois meses de antecedência.
Questionamos: segundo as estimativas do GGB, reconhecidamente subnotificadas, entre as vítimas predominaram os gays, 60%, seguidos com 37% de “trans” e 3% de lésbicas. Para o governo, as travestis foram as mais vitimizadas — 49%. Que explique como apenas 12 homicídios a mais divulgados pela Secretaria de DH tenham elevado em 12% o total de “trans” assassinadas.
Mais grave é a letargia governamental em não acionar as estatísticas criminais coletadas pelas secretarias de Segurança Pública, Justiça e Direitos Humanos e, sobretudo, pelas delegacias dos 5.565 municípios do Brasil. O governo federal basear o relatório de assassinatos de LGBT apenas em notícia de jornal (hemeroteca) é atestado de incompetência estatística de seu banco de dados criminais.
*Luiz Mott é Doutor em Antropologia pela UFBa, fundador do Grupo Gay da Bahia