A nossa entrevistada é a Senadora Marta Suplicy

Márcia Santos,
13/01/2011 | 00h01

A Senadora Marta Suplicy falou ao Dois Terços sobre sua intenção de desarquivar a PLC 122 que criminaliza a homofobia no Brasil e das  expectativas em relação ao  governo da presidenta Dilma Rousseff. Falou também da  onda de violência que vem crescendo contra os lGBT´s nos últimos meses .

DT Os números da violência contra os homossexuais no Brasil têm crescido nos últimos dias a exemplo dos ataques em São Paulo. Como a senhora pretende contribuir no seu mandato para punição e redução destes índices?

Marta: Tenho a intenção de assumir a relatoria e colher assinaturas necessárias para evitar o arquivamento do PLC 122, que criminaliza a homofobia. Será uma árdua batalha aprovar este projeto que define a homofobia como crime passível de penas – numa gradação que vai da multa à detenção. Mas será um marco contra a discriminação por orientação de sexo e identidade de gênero. Aprovado o projeto e sancionada a lei, o Estado terá como combater a intolerância sexual, assim como já pune racismo e agressões à mulher. Mas, além disso, temos de continuar agindo em políticas sociais, de educação e cultura para romper com o círculo vicioso do preconceito. Temos de buscar mudanças de comportamento. Temos de trabalhar a questão do respeito à diversidade.

DT Muitos gays não acreditam nos seus representantes atuais, pois segundo eles as lideranças LGBT’s estão preocupadas apenas em receber as verbas do governo para realização das paradas gays. Como a senhora vê a militância LGBT no Brasil?

Marta: Discordo. A militância e importantes lideranças da comunidade LGBT, ao longo dos anos, têm se mostrado muito combativos, guerreiros mesmo. Não avançamos nada no Legislativo. Mas, desde que propus o projeto da parceria civil, no meu mandato de deputada federal (em 1995, ou seja, há 15 anos!), vejo como a militância batalhou a meu lado pela aprovação da proposta. E como a discussão por essa aprovação aprofundou o debate na sociedade. As paradas gays surgiram para dar visibilidade a toda luta dos homossexuais. Com o tempo cresceram. Não conseguimos com elas aprovar leis, mas vimos em todo o processo o Judiciário se sensibilizar, e avançar em muitos campos: reconhecendo parcerias, permitindo adoções, também fazendo justiça em casos de herança. O Estado brasileiro hoje reconhece até para a declaração do Imposto de Renda as declarações de casais homossexuais e também o INSS, para fins previdenciários. Os fóruns criados e o recente ‘Conselho Nacional de Combate à Discriminação e Promoção dos Direitos LGBT’, assinado pelo Presidente Lula, surgiram dessa luta incansável. Temos de aplaudir o suor, as lágrimas e o “sangue” que as lideranças LGBT têm dado ao longo dos anos por esses propósitos. E temos de avançar no Legislativo.

DT A comunidade gay argentina vive a realidade da união civil, desejo da senhora para os gays brasileiros há 15 anos atrás. Existe alguma explicação plausível para esse retrocesso no Brasil?

Marta: O avanço para a população LGBT no Brasil se consolidou no Judiciário e em atos do Executivo. Mas você tem razão quando diz “retrocesso”, referindo-se à aprovação de leis. Estamos no passado, quando pensamos nas previsões da lei. E olha que muita coisa aconteceu, desde o tempo em que era deputada, mas nada fez com que as propostas ‘avançassem’ no Congresso. Esse era e é o desafio. Vamos começar uma nova Legislatura e temos de ver quem são os aliados e como poderemos retomar os debates.

DT União civil, adoção por casais homossexuais foram temas bastante falados ao longo da campanha presidencial, despertando o debate na sociedade. A senhora pretende levar essas questões para o Senado?

Marta: Minhas bandeiras históricas são conhecidas e têm ligação com avanços para a população LGBT. Pretendo seguir com muita lealdade as propostas para o meu mandato. Vamos começar uma nova Legislatura e teremos de ver quem são os aliados e qual a melhor forma e hora de encaminhar a discussão. Algumas das estratégias de oposição já estão se delineando.

DT Nas últimas eleições muitos candidatos gays disputaram e ganharam vagas nos três poderes, a exemplo da transexual Leo Kret, uma das vereadoras mais votadas em Salvador. Como a senhora analisa a participação deles nas lutas em prol da comunidade LGBT?

Marta: Pegando o exemplo que você dá, da Leo Kret, que concorreu na chapa do ACM Neto, vimos em sua campanha e em entrevistas a explicação de que não foi eleita apenas por si ou pelos shows ou ainda por sua irreverência. Ela teve uma comunidade que a escolheu, incentivou e votou, enfim elegeu. Houve um processo democrático e a escolha numa eleição é sempre legítima. A plataforma eleitoral dela vi que se fez em questões que são bandeiras da comunidade LGBT: como aprovar lei que proíbe a discriminação contra os homossexuais, garantir que homossexuais trabalhem em órgãos públicos e que o nome de transexuais e travestis possa ser aceitos no registro civil, também direito previdenciário para quem tem parceiro (a) homossexual. Uma participação na política, com essas bases, me parece positiva. Agora, uma vez eleito, o parlamentar sempre é avaliado por seu desempenho.

DT O Governador Jaques Wagner entra no seu segundo mandato à frente do governo do Estado sem grandes projetos para o povo da Bahia. A senhora atribuiria a reeleição dele e de outros candidatos ao apoio do ex-Presidente Lula?

Marta: Discordo. Quando Jaques Wagner tomou posse agora, no segundo mandato, fez um balanço que mostra dados bem positivos em diversos programas, destacou, por exemplo, Água Para Todos e Casa da Gente. Agora, é claro que a parceria com o governo Lula foi muito importante para a Bahia. Fez a Bahia avançar. Para o segundo mandato, Jaques Wagner tem por meta zerar o analfabetismo. É uma proposta e tanto!. E mais que isso, uma proposta que conta com a aprovação dos baianos, que o reelegeram.

DT Os brasileiros sempre sonharam em ter uma mulher no comando do Brasil. Como a senhora tem visto a eleição da presidenta Dilma Rousseff, para comandar o rumo do país nos próximos quatro anos?

Marta: Dilma tem muito conhecimento do que é o Brasil. Foi braço direito do Presidente Lula e seu governo pode avançar a partir de uma “herança bendita”, sobretudo de projetos sociais. Dilma já apontou sua principal meta: erradicar a pobreza absoluta. Quero, no Senado, apoiar os projetos que ela apresentar como fundamentais para este objetivo e a partir do meu mandato defender projetos que assegurem mais educação e direitos de cidadania. Do ponto de vista que você assinala, a eleição de uma mulher, Dilma simboliza que as mulheres podem tudo, até chegar à Presidência do país. Isso é muito positivo e terá grande impacto para as meninas e adolescentes de hoje. Elas terão o exemplo de uma mulher competente, que foi eleita superando barreiras e preconceitos.

DT A importância do presidente Lula foi fundamental para eleição de Dilma Rousseff. Quais são suas expectativas com relação ao encerramento de um círculo de oito anos entre o Presidente Lula e a Presidenta?

Marta: Dilma vai manter e avançar nas conquistas do Presidente Lula. Ele, realmente, apoiou e foi o grande articulador e cabo eleitoral para a vitória de Dilma. Ele sempre dizia a ela que, como peão que foi, ao governar, não podia errar porque, senão, nenhum outro peão poderia aspirar a Presidência. Sabia que o desafio para Dilma também é grande. Ela será muito cobrada. E, como mulher, ela mesma pontuou, terá de fazer como Lula: trabalhar muito e mostrar do que a mulher é capaz. Tenho certeza que fará um grande governo. É competente, séria e já tem demonstrado muita sensibilidade, como vimos nestes dias de tragédias das enchentes, sobretudo no Rio de Janeiro.