Como e por que foi criado um dia dedicado a celebrar a maternidade?
Aqui no Brasil, o Dia das Mães foi institucionalizado no segundo domingo de maio, a partir de um decreto assinado pelo então presidente Getúlio Vargas em 1932. A inspiração para essa data comemorativa veio dos Estados Unidos, onde Anna Jarvis, filha de uma ativista pela paz, lutou para que fosse criado um dia em homenagem às mães. Optar pela maternidade, ser mãe, é um direito natural que qualquer mulher, aonde estiver vivendo no planeta, tem.
Neste Dia das Mães, mulheres vivendo com HIV falaram sobre esse direito. “Você, que está em idade reprodutiva e tem HIV, pode planejar uma gestação ou, se não planejada, desejar essa gestação, sem medo de transmissão vertical do HIV, inclusive em parto normal.” Planejar ter filhos e viver com HIV/aids é sempre um tema presente na vida das mulheres.
Te convidamos para conhecer o que pensam algumas ativistas e o que falaram para jovens mulheres que contraíram o HIV e que pensam em vivenciar a maternidade.
Silvia Alóia
Ativista com mais de 34 anos de experiência na luta pelos direitos das mulheres vivendo com HIV/aids. Graduada em Administração em Sistemas e Serviços de Saúde pela Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS), atua como consultora de projetos sociais e é secretária nacional do Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas (MNCP). Residente em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Silvia é reconhecida por sua dedicação em promover ações que visam eliminar o estigma, preconceito e todas as formas de discriminação contra pessoas vivendo com HIV/Aids:
“A maternidade é algo muito especial e único para quem quer vivenciá-la. A minha experiência não foi boa, foi cheia de medos, incertezas e muita tristeza, devido a ter sido em 1990, com 20 anos, e saber do meu diagnóstico positivo para o HIV com 8 meses de gestação. Foi difícil, muito difícil, mas terminou dando tudo certo, e hoje a minha pequena já me deu outra pequena – e amo as duas demais! Hoje, a tua experiência pode ser massa! É um momento em que se decide algo muito importante, que será para diversas fases da tua e dessa nova vida. Esse desejo pode ser real e sem HIV. Você, que está em idade reprodutiva e tem HIV, pode planejar uma gestação ou, se não planejada, desejar essa gestação, sem medo de transmissão vertical do HIV, inclusive em parto normal. Para isso, tem que realizar um pré-natal adequado, se informar e, sobretudo, curtir esse momento que é seu, único e intransferível. Neste Dia das Mães, parabenizo a todas as mães do mundo pela coragem e desejo que nunca desistam de seus sonhos, porque vale muito a pena!”
Nair Brito
Uma das principais referências na luta pelos direitos das pessoas vivendo com HIV/aids no Brasil, Nair, que é mãe, foi diagnosticada em 1993, aos 33 anos, e transformou sua experiência pessoal em ativismo político e social. Em 1996, foi coautora da primeira ação judicial do país que obrigou o Estado a fornecer gratuitamente antirretrovirais, marco que antecedeu a criação da Lei nº 9.313/1996, que garante o acesso universal ao tratamento pelo SUS. Nair é fundadora do Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas (MNCP) e da Rede Paulista de Mulheres com HIV, além de ter participado da criação do Movimento Latino-Americano e Caribenho de Mulheres Positivas:
“Planejar ter filhos e viver com HIV/aids é sempre um tema presente na vida das mulheres. Vivo há quase 4 décadas com HIV e o preconceito e o estigma estão presentes em todas elas. Infelizmente, conseguimos avançar pouco nesta pauta.
Outra inquietação das mulheres com HIV quanto à maternidade – e creio ser a principal – é a transmissão vertical, isto é, da mãe para a criança. Embora hoje se saiba que as chances disso ocorrer são quase 0% se for feito um pré-natal dentro dos protocolos, hoje muito bem estabelecidos, e posterior acompanhamento.
E, por fim, ter filhos na atual situação econômica, social, ética etc. em todo o planeta é um caso a se pensar bem, porque as coisas, como todas nós sabemos, não estão fáceis. Eu diria que vivemos uma agenda de abandono, descaso com a vida em todas as suas nuances (afeto, direitos, valores etc).
Por fim, se ponderar essas e tantas outras coisas mais (acredite, o melhor é planejar antes de decidir) e decidir ter filhos: seja feliz, você tem esse direito.”
Jaciara Pereira
Residente em Itapetinga, Bahia, ela é mãe, funcionária pública e atua no Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas desde 2007. Vivendo com HIV há mais de 20 anos, Jaciara enfrentou desafios significativos, incluindo o preconceito dentro de sua própria família. Sua maior motivação no MNCP é adquirir conhecimento para ajudar outras mulheres de sua região a buscarem seus direitos por meio da atuação em advocacy:
“O que tenho a dizer é que é importante chegar a todas as pessoas: informações adequadas. Todas as mulheres têm direito à maternidade. Antes, ainda não tínhamos ciência que nos auxiliava. Hoje está bem mais avançada na prevenção, o que nos dá, enquanto mulheres vivendo com HIV/aids, a possibilidade de termos nossas crianças sem serem infectadas.”
Silvia Almeida
Ativista do Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas, Silvia atua há quase três décadas na luta contra o estigma e o preconceito relacionados à aids. Mãe e avó, hoje integra a Equipe Nacional de Validação da Transmissão Vertical do HIV e Sífilis, em parceria com o Ministério da Saúde:
“No final de 1993, num momento em que a aids era avassaladora e começava a aumentar os casos de aids nas mulheres, meu marido ficou doente e descobrimos que também faríamos parte das estatísticas de pessoas infectadas. Em 1994, recebi meu diagnóstico positivo e, em 1996, meu marido faleceu. Entre muito medo e inseguranças, procurei uma ONG para ver o que faria da vida, como viver com HIV?… Meus filhos – uma menina de 14 anos e o bebê de menos de 4 – não haviam se infectado, mas eu sim, e não queria de forma alguma que eles perdessem a mãe, assim como haviam perdido o pai em decorrência da aids. E assim, no GIV – Grupo de Incentivo à Vida – iniciei minha luta contra a aids, aprendendo a viver com HIV e a conhecer o estigma e os preconceitos que matavam mais que a própria doença… Assim me tornei ativista.
Fiz e faço meu tratamento com responsabilidade. Nunca deixei que o olhar alheio ferisse minha integridade e autoestima. Isso foi o que de melhor aprendi no grupo de ajuda mútua que coordenei durante 15 anos, convivendo com dezenas mulheres. Sou uma Cidadã Posithiva! Integro o Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas, participo do GIV, do Barong e colaboro com diversas instituições. Hoje tenho quatro netos, passei por alguns amores e estou só por opção – e, talvez, temporariamente.
Participo de uma das Equipe Nacional de Validação da Transmissão Vertical do HIV e Sífilis – junto ao Ministério da Saúde. Ainda vejo e procuro amenizar a dor de diversas mulheres que se descobrem vivendo com HIV na gestação. Em mais de 28 anos de ativismo, posso afirmar que ainda há muito a se fazer para vencermos o estigma, preconceitos e dores. E isso só será possível com muito trabalho de informação, prevenção e projetos de educação sexual.
Saúdo a cada mãe, com HIV ou não! Para as que vivem com HIV, desejo conhecimento e coragem. Para as que não vivem com HIV, peço: se protejam, conheçam o HIV, sejam solidárias e empáticas umas com as outras! Todas somos uma! Feliz nisso dia.”
Jenice Pizão
Professora de História aposentada, Jenice é mestre em Educação pela PUC-Campinas e doutora pela Unicamp. Diagnosticada com HIV em 1990, tornou-se ativista em 1996 e, hoje faz parte do Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas (MNCP), onde atua como secretária política. É mãe e avó e sua trajetória destaca-se pela defesa dos direitos das mulheres vivendo com HIV/aids e pelo combate ao estigma e à discriminação:
“Olá, quero falar com você, mulher que vive com HIV/aids, assim como eu, pensa em ser mãe e fica em dúvida sobre essa possibilidade. Não fique, querida. Vá em frente, se este é o seu sonho. Quem está dizendo não é apenas uma mulher diagnosticada com HIV há quase 35 anos, mãe, avó e ativista da nossa causa. São os avanços científicos e o SUS que disponibiliza sua estrutura para nos dar essa possibilidade de vida.
Hoje, se quiser ser mãe, deve seguir seu tratamento com exames periódicos, isto é, fazer uso dos ARV de forma correta para manter sua carga viral indetectável e conversar com seu infectologista para decidirem qual o melhor momento para iniciar sua gestação. Daí, como toda gestante, deve realizar seu pré-natal, com exames e consultas mensais, seguindo as orientações de seu médico.
Ainda a ciência não definiu se podemos amamentar ou não, porém, pensando bem, o importante é que terá a fórmula láctea para alimentar sua criança, disponibilizada também pelo SUS, e ela crescerá linda com todo amor que dará para essa criança.
Ah, não esqueça de me convidar para o 1º aniversário de seu bebê.”
Redação da Agência de Notícias da Aids
Assista a websérie HIV 40 Anos: Aids e Suas Histórias – Transmissão Vertical: Um Assunto Proibido, da Agência Aids
Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas
Site: www.mncp.org.br