2012: direitos humanos x Frente Parlamentar Evangélica

Genilson Coutinho,
02/01/2012 | 17h01

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Apesar do aumento da violência contra LGBT, 2011 foi um ano que pode ser considerado bom. Foi como se depois de um grande hiato, parte do mundo, uma parte jovem e cheia de ideias progressistas e democráticas, tivesse finalmente acordado e descoberto que tinha poder e que tinha ferramentas para mudar tudo.

2011, como deu na capa da revista americana Times, foi o ano do manifestante. No Brasil, nós redescobrimos o sentimento republicano há muito deixado de lado por conta da herança da ditadura e de uma classe média quieta e acomodada em sua própria mediocridade. Eu costumo brincar que se a classe baixa criou o punk na Inglaterra, desiludida e sem opções, a classe média cheia de tédio criou o pós-punk no Brasil e isso diz muito sobre a nossa estrutura socioeconômica de duas décadas atrás. Fato é que a cada vinte ou trinta anos a gente acorda e lembra que tem direitos. Em 2011, fomos às ruas pedir criminalização da homofobia, não violência contra a mulher etc.

Analogamente, a tecnologia facilitou a vida de centenas de jovens adultos no mundo árabe permitindo que os povos se levantassem contra seus governos tirânicos, impopulares e anti-democráticos. Tudo começou na Tunisia, onde um comerciante de 26 anos de idade – mais jovem do que este que vos escreve -, Sidi Bouzid, cansado do abuso imposto por autoridades a mando do governo, cobriu-se de solvente de tintas e ateou fogo ao próprio corpo na frente do portão de um prédio federal (história completa aqui).

 Dizem que não importa quão longo seja o inverno, a primavera há de aparecer e assim foi a Primavera Árabe. Ditaduras caíram do lado de lá.

Do lado de cá…

 No que diz respeito aos direitos humanos e aos direitos LGBT, as Nações Unidas finalmente se manifestaram positivamente após anos e anos de intensos debates e soluções mornas. Em junho, a Assembleia declarou que direitos para os LGBTs são direitos humanos e que todos os países que contemplam ou já possuem uma cadeira nas Nações Unidas precisam obedecer a esta premissa básica.

No Brasil, o Supremo Tribunal Federal decidiu em nosso favor ao declarar a possibilidade de união estável para os casais homoafetivos. Até agora o nosso Poder Legislativo permanece silencioso no assunto bloqueado por uma doença que infecta as nossas casas legislativas: aFrenteParlamentarEvangélica.

Desde a decisão do STF, uma guerra ideológica e de relações públicas, uma disputa por imagem e por votos, começou: a bancada evangélica do Senado e da Câmara começou uma jihad contra os cidadãos LGBT através de projetos de lei e declarações ignorantes na imprensa. Tomam forma em um câncer em metástase através do nosso Poder Legislativo e esse câncer atende pelo nome de Frente Parlamentar Evangélica. São políticos que não votam por legenda ou por plataforma de campanha, mas sim de acordo com as suas respectivas inclinações religiosas. Vale dizer que o Brasil é um país laico e que essa mesma laicidade do estado serve para proteger as mesmas crenças desses indivíduos que praticam uma moral religiosa em uma arena de debates ideológicos e não metafísicos.

O intuito do Poder Legislativo deve ser melhorar a qualidade de vida de todos os cidadãos e não apenas daqueles que alguns entendem que serão salvos por este ou por aquele deus.

A nossa economia agora é a sexta do mundo mas o nosso Índice de Desenvolvimento Humano continua ocupando a 84ª casa, sinalizando a nossa falta de educação e de qualidade de vida. A mesma falta de educação que favorece o crescimento das religiões neopentecostais país afora. Onde há miséria, tem que haver salvação, não é mesmo?

2012 é o ano de educar essas pessoas e mostrá-las que direitos LGBTs são também direitos humanos, reiterando que o estado brasileiro é laico, podendo assim atender a todos os seus cidadãos com igualdade e respeito. É para onde vai o nosso esforço em 2012: a Conferência Nacional LGBT realizada em Brasília em dezembro já definiu a sua principal bandeira para este ano, a criminalização da homofobia com a primeira redação do PL122, que foi demonizada por entidades como Silas Malafaia e Jair Bolsonaro.

Em 2010, foram 260 homicídios de LGBTs. Até outubro des 2011, mais 208. Você ainda tem alguma dúvida de que ideias podem matar? Liberdade de expressão deve ser sempre secundária ao direito a vida, primeiro na Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Por João Barreto

João Barreto – Jornalista

Jornalista e mestre em Comunicação e Cultura Contemporâneas pela Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia. É analista de comunicação e cultura, especialmente de poéticas audiovisuais. Também tem interesse em desenvolvimento sustentável.

twitter: @jaobarreto / Blog – http://jaobarreto.wordpress.com/