“Dizer e Não Pedir Segredo” chega a Salvador nos dias 26 e 27 de maio

Genilson Coutinho,
23/05/2012 | 13h05

Montagem aborda homossexualidade sob ponto de vista histórico-social, inspirada no livro “Devassos no Paraíso”, de João Silverio Trevisan.

Sucesso em São Paulo, a montagem Dizer e Não Pedir Segredo, ganhadora do prêmio PROAC LGBT 2010 e indicada ao prêmio da Cooperativa Paulista de Teatro como uma das melhores encenações em espaços não-convencionais, chega em Salvador, através do prêmio FUNARTE Myriam Muniz para circulação de espetáculos teatrais, nos dias 26 e 27 de maio, com apresentações na Casa Preta, às 20h.

 

A peça, dirigida por Luiz Fernando Marques – integrante do premiado Grupo XIX de Teatro (SP), retrata o universo da homossexualidade no Brasil, a partir de intensa pesquisa para revelar facetas históricas importantes do amor entre iguais e também explorando a participação do público. No elenco, Ronaldo Serruya, Luiz Gustavo Jahjah e Paulo Arcuri.

 

A criação, pesquisa e dramaturgia ficou por conta de de Ivan Kraut, Luiz Fernando Marques, Luis Gustavo Jahjah, Paulo Arcuri e Ronaldo Serruya e teve forte influência do livro “Devassos no Paraíso”, de João Silverio Trevisan, que foi o ponto de partida para o Grupo.

Na obra, Trevisan conta a história da homossexualidade brasileira, com narração de várias histórias acontecidas em São Paulo, Bahia e Rio de Janeiro, entre outros lugares, desde o período colonial. Histórias e casos de amigos também foram importantes na composição da dramaturgia.

 

O espetáculo e a participação da plateia

Dedicado à memória de Ivan Kraut, o espetáculo é um mergulho no universo da homossexualidade masculina no Brasil, sob uma perspectiva histórico-social, na busca da construção de uma identidade gay em paralelo a uma identidade brasileira. O texto da peça, criado de forma colaborativa pelos atores e direção, embaralha os tempos, vai e volta cronologicamente, e constrói, numa linha evolutiva, um olhar sobre o desejo.

Os textos passam pelo olhar da criança, em um primeiro momento. O olhar que nada julga sobre o desejo, que se expressa de maneira libertária, sem amarras, por não saber ainda categorizar os valores. Ao mesmo tempo em que estes textos se contextualizam num tempo histórico onde o Brasil ainda engatinha, ainda dá os primeiros passos para construir a sua ‘ grandeza épica de povo em formação’.

 

A encenação de Dizer e Não Pedir Segredo é construída com a cumplicidade da plateia, que interage e assiste às cenas dentro do próprio espaço cênico: uma sala, que poderia ser qualquer sala, de qualquer família brasileira, lugar onde por hipocrisia ou medo nada se revela, ou melhor, tudo se apresenta velado, sob os signos reconhecíveis da norma padrão, de uma sociedade heterossexual falocêntrica que dita as regras.

 

 

Na peça, a sala, como um possível ícone desse padrão, se desvela aos olhos da platéia conforme os códigos cênicos vão sendo dados. Os espectadores decidem onde se sentar, escolhem adereços e figurinos, e  compõem com seus corpos e gostos este ambiente de estar,  transformando-se em sugestões de personagens, ações, climas e situações. Esta interatividade é feita de maneira delicada e gradativa, e faz com que a dramaturgia se renove a cada apresentação.

O olhar sobre as diferenças

“Falar sobre o gênero é falar da complexidade que envolve o desejo humano. É tarefa árdua e perigosa, e se deve evitar, a todo custo, que a moral compareça, que o bom senso impere e que o julgamento se instaure. É preciso aceitar a diferença”, diz Luiz Fernando Marques, diretor do espetáculo.

Marques explica ainda que, em um primeiro momento, o olhar da criança se expressa de maneira libertária, sem amarras, por não saber ainda categorizar os valores. “À medida que avançamos no tempo, este olhar infantil vai ficando pra trás, os valores e preconceitos são introjetados, discutidos, colocados em conflito nas relações familiares, mães e filhos, pais e filhos, nas relações de classe, nas relações de poder, tendo como moldura um País que tenta a passos trôpegos e contraditórios construir a sua ‘grandeza épica de povo em formação”, completa.

 

Sobre o encontro – Teatro Kunyn

“O teatro é casa do afeto, todo mundo sabe disso. É um lugar para afetar e ser afetado, deixar-se transpassar, sagrar-se instrumento, comungar uma reflexão, compartilhar paradigmas. No encontro encontro entre os atores Ronaldo Serruya, Paulo Arcuri, Ivan Kraut e Luiz Gustavo Jahjah e do diretor Luiz Fernando Marques, nasceu o Teatro Kunyn: pelo desejo de pesquisar e refletir sobre a questão de gênero no Brasil, de tentar entender o que seria a construção de uma identidade gay em paralelo à construção de uma identidade brasileira, e assim perceber como cada um de nós vivia a sua própria homossexualidade”, conta o ator Ronaldo Serruya.

“Queríamos responder a pergunta: o que é ser gay neste país? Não encontramos respostas, e sim mais perguntas”, diz o ator, que conta que durante mais de dois anos o grupo mergulhou em livros, filmes, artigos, teorias, documentários e depoimentos. “Colocamos na mesa de discussão e na sala de ensaio nossas próprias experiências para construir o discurso, achar o tom, o recorte, o que queríamos dizer. Foi um longo processo para poder revelar o segredo. E nunca a vida esteve tão presente, com toda a sua contraditória perversidade. Perdas, alumbramentos, separações, descobertas, reencontros. Como diria o poeta: os sentimentos vastos não tem nome”, explica Ronaldo.

 

Ficha técnica

Criação, pesquisa e dramaturgia: Ivan Kraut, Luis Gustavo Jahjah, Luiz Fernando Marques, Paulo Arcuri e Ronaldo Serruya

Supervisão dramatúrgica: Ronaldo Serruya

Direção: Luiz Fernando Marques

Elenco: Luiz Gustavo Jahjah, Paulo Arcuri e Ronaldo Serruya

Assistência de direção: Daniel Viana

Iluminação: Wagner Antônio

Figurinos e adereços: Ligia Yamaguti e Felipe Cruz